Alegações finais por memoriais em apropriação indébita (Modelo 2)

AutorJosé Gilmar Bertolo
Páginas1179-1197

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EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ...ª VARA FEDERAL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE ....................../...

Processo nº ..................

Objeto: Alegações Finais

Beneficium juris nemini denegandum: A ninguém deve ser negado o benefício do direito.

Absolvere debet judex potius in dubio quam condemnare: Na dúvida, deve o juiz antes absolver do que condenar.

.............................. e .............................., já qualificados nos autos da ação penal, que lhe move o Ministério Público Federal por intermédio do Procurador da República do Estado do ....................., vêm, por sua Defensora subfirmada, com acatamento e respeito, a presença de Vossa Excelência, nos autos do processo-crime em epígrafe, oferecer, no prazo legal, as presentes ALEGAÇÕES FINAIS, asseverando que não perpetraram o delito que lhes foi arrostado graciosamente pela peça inicial coativa.

O Ilustre Representante do Ministério Público, de acordo com a denúncia e as suas Alegações às fls. ... dos autos, pretende imputar aos Réus as sanções do art. 168-A, c/c o art. 71 do Código Penal Brasileiro.

Atribui-lhes ainda nessa peça tipificação por omissão própria, com o dolo (animus rem sibi habendi), como elemento subjetivo do tipo do crime em questão.

Diz, consubstanciada a materialidade no Auto de Infração Fiscal, lavrado pela autoridade previdenciária e pelas notificações de lançamento em Livro da empresa - NFLDs ns. ................. e .................. e ................, porque os denunciados, à época dos fatos, eram os responsáveis pela empresa COMÉRCIO DE .................. LTDA., porque nos meses de fevereiro, abril, agosto a dezembro de 1998, incluindo o 13º salário; de janeiro a maio de 1999 e, ainda, de julho de 1999 a dezembro de 2000, incluído o 13º salário de 1999, descontaram de seus empregados e dei-

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xaram de repassar aos cofres do INSS, no prazo legal, as importâncias relativas a contribuições previdenciárias no valor de R$ 7.741,00 (sete mil, setecentos e quarenta e um reais).

PRELIMINARES

DA PRESCRIÇÃO

Os Réus respondem à presente ação penal com base na denúncia feita pelo Ministério Público Federal, com fulcro nas sanções do art. 168-A e 71 do Código Penal, em razão de descontarem dos seus empregados e deixarem de repassar aos cofres do INSS as importâncias relativas a contribuições previdenciárias relativas aos meses de fevereiro, abril, agosto a dezembro de 1998, incluindo o 13º salário; de janeiro a maio de 1999 e, ainda, de julho de 1999 a dezembro de 2000, incluído o 13º salário de 1999.

Ocorre, Excelência, que a Lei nº 9.983/2000, que acrescentou o art. 168-A ao Código Penal, foi publicada em 14.07.2000, com vigência, segundo seu art. 4º, a partir de 90 (noventa) dias após sua publicação (14.10.2000).

O princípio da anterioridade da Lei, previsto no art. 1º do Código Penal, diz que "não há crime sem lei anterior que o defina; não há pena sem prévia cominação legal".

Assim, para que qualquer fato possa ser considerado crime, é indispensável que a vigência da lei que o define como tal seja anterior ao próprio fato.

In casu, isso não ocorre porque a lei em que se baseou a denúncia entrou em vigor em 14.10.2000, e os fatos que deram ensejo à ação penal ocorreram de 1998, 1999 e até final de 2000, segundo a peça inicial coativa. Assim, teriam os denunciados que responder pela nova lei no que se refere, apenas, ao não recolhimento das contribuições previdenciárias relativa aos meses de Novembro e Dezembro de 2000.

Desse modo, se a retroatividade da Lei nº 9.983/2000 não for mais benigna aos acusados, não deve a mesma ser aplicada, o que se entende que ocorre no presente caso porque a lei vigente, à época dos fatos (art. 168/CP), estipula a pena de reclusão de um a quatro anos, mais multa, e, segundo afirma CELSO DELMANTO em seu Código Penal Comentado, p. 332, a essa sanção não se aplicam as figuras qualificadoras, sob pena de violar os princípios da reserva legal e da

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proibição da analogia prejudicial ao acusado, garantidos e assegurados pelo art. 1º do Código Penal.

Portanto, a lei nova (Lei nº 9.983/2000) não se trata de Lex Mitior aos acusados, vez que prevê uma pena de reclusão, de dois a cinco anos, e multa (art. 168-A/CP).

Destarte cabe a anulação, por inépcia da denúncia, pela inaplicabilidade aos acusados da conduta típica prevista no art. 168-A do Código Penal, devendo haver a desclassificação da conduta dos Réus para o delito do art. 168, caput, cominando-lhes pena mínima, porque inexistia tal lei à época dos fatos.

Assim, a punibilidade dos Réus deve ser extinta pela prescrição, seja em razão da conduta delitiva praticada no período de 1998, 1999 e 2000, seja pela data do recebimento da denúncia (13.11.2002) até a publicação da sentença, tendo decorridos 4 (quatro) anos, o que implica a prescrição da pretensão punitiva em abstrato dos fatos anteriores à vigência da indigitada Lei, a teor dos dispositivos da Lei Substantiva Penal, roborados pelo entendimento jurisprudencial dominante dos nossos Tribunais, a exemplo das seguintes ementas, verbis:

TRF4-005413) PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA E PECULATO. BENS PERTENCENTES À FUNAI. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DE DOIS RÉUS PELA PRESCRIÇÃO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. ART. 56 DA LEI 6.001/73. INAPLICABILIDADE. RESPONSABILIDADE PENAL DE INDÍGENAS. POSSIBILI-DADE. CACIQUE. EQUIPARAÇÃO A FUNCIONÁRIO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE VÍNCULO COM A FUNAI. INVIABILIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA APROPRIAÇÃO INDÉBITA. COMPROVADA AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA PRESCRIÇÃO DO TERCEIRO RÉU. MANTIDA A CONDENAÇÃO POR PECULATO DA APELANTE.

  1. Inicialmente, verifico que em relação aos apelantes V. e W., condenados à pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos, transcorreram-se mais de 4 (quatro) anos entre o recebimento da denúncia (14.04.98 -fl. 396) e a publicação da sentença condenatória (27.06.02 - fl. 645), devendo ser declarada, de ofício, extinta a punibilidade pela prescrição, nos termos dos artigos 107, IV, 109, V, e 110, § 1º, todos do Código Penal.

  2. Tendo em vista a disposição do art. 118 do CP, segundo a qual "as penas mais leves prescrevem com as mais graves", tendo sido extinta a punibilidade desses réus pela prescrição, tanto a pena privativa de liberdade quanto à de multa cumulativamente aplicada estão prescritas

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    (art. 114, II, do CP), restando prejudicado o exame de suas apelações (Súmula 241 do extinto TFR).

  3. O réu I. foi condenado pela prática de peculato pela venda de trator pertencente à FUNAI.

  4. Rejeitada a preliminar de inépcia da denúncia, pois preencheu perfeitamente os requisitos legais ao descrever os fatos delituosos de forma bastante clara e concisa, apontando e discriminando quais os ilícitos cometidos por cada um dos réus.

  5. A existência de direitos e deveres dos membros das comunidades indígenas em nossa ordem constitucional exige a verificação concreta do nível de aculturação sofrido. Nestes autos, os acusados de origem indígena estão plenamente integrados à civilização. A saber, V. e I. são semi-alfabetizados, falam a língua portuguesa, as testemunhas narram comportamentos normais à vida em sociedade (fls. 477/478; 487; 489, por exemplo), foram interrogados em juízo sem ter sido apontado qualquer traço de insociabilidade, portanto devem ser considerados imputáveis. Por outro lado, anoto que a legislação invocada, qual seja, o Estatuto do Índio (Lei nº 6.001/73) é aplicável aos indígenas em processo de aculturação. Precedente do STJ.

  6. Comprovada a autoria e materialidade delitiva em relação ao 2º fato delituoso narrado na denúncia.

  7. A condição de cacique do réu I.R. não o equipara a funcionário público para fins do crime de peculato. O fato de ser escolhido pela sua comunidade para "interagir" com a FUNAI apenas lhe confere responsabilidade no encaminhamento das demandas da comunidade e não a responsabilidade patrimonial peculiar dos servidores públicos daquela fundação.

  8. Não há provas nos autos que demonstrem a existência de investidura do apelante em função pública que lhe dê direitos e deveres como servidor público a fim de justificar a equiparação feita pelo MPF e confirmada pela sentença. Ao contrário, o próprio relatório da sindicância levada a efeito na FUNAI assevera que tal vínculo inexiste, chegando a capitular o fato como crime de apropriação indébita na fl. 159. Desclassificada a conduta para o delito do art. 168 do CP, cominando-lhe a pena mínima.

  9. Entretanto, diante da pena concretizada ao réu I., verifico que transcorreram-se mais de 4 (quatro) anos entre o recebimento da denúncia (14.04.98 - fl. 396) e a publicação da sentença condenatória (27.06.02 - fl. 645), devendo ser declarada, de ofício, extinta a punibilidade pela prescrição, nos termos dos artigos 107, IV, 109, V, e 110, § 1º, todos do Código Penal.

  10. Não se pode aplicar à prática do delito de peculato o princípio da insignificância, inobstante haja referência nos autos que o valor do prejuízo seja de valor irrisório. O bem jurídico tutelado, que se traduz

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    na Administração Pública, em seu aspecto patrimonial e moral, já foi ferido. O servidor público deve observar o dever de lealdade para com a Administração.

  11. Comprovada a autoria e materialidade do delito de peculato em relação à ré A..

  12. Apelação da ré improvida.

    (Apelação Criminal nº 10488/RS (200204010479669), 7ª Turma do TRF da 4ª Região, Rel. Fábio Rosa, j. 17.06.2003, unânime, DJU 02.07.2003)

    TRF3-008184) PENAL. ARTS. 2º, INC. II, DA LEI 8.137/90 E 95, LETRA "D", DA LEI 8.212/91. RÉUS ABSOLVIDOS COM BASE NO ART. 386, INC. V, DO CPP. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA EM ABSTRATO DOS FATOS ANTERIORES A 24.07.91. COMPROVADAS MATERIALIDADE E AUTORIA. NÃO COMPROVADA A EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE DE INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. PROVIDA A APELAÇÃO QUANTO AOS FATOS PRATICADOS DE 11 A 12/91 E DE 10 A 12/92. DECRETADA, DE OFÍCIO, A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA PRESCRIÇÃO PUNITIVA.

    Apelação ministerial contra sentença...

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