Da indenização

Páginas459-473

Page 459

39. 1 Considerações introdutórias

Quando alguém causa prejuízo a outrem está obrigado a reparar o dano se agiu com dolo ou culpa. É a regra geral. O agente do ato ilícito que causa dano é obrigado a indenizar, ressarcindo o prejuízo.

Indenização se refere à reparação de prejuízo ou dano que se tenha causado a outrem. Tem a finalidade de integrar ao patrimônio da pessoa aquilo do que se desfalcou, correspondente a uma compensação de caráter monetário.

Pode ser promovida voluntariamente ou contenciosamente.

Voluntariamente ou extrajudicialmente quando o indenizador, espontaneamente, vem pagar ou reparar o que é devido ao indenizado.

Contenciosamente, quando se opondo o indenizador a esse pagamento, intenta o prejudicado a ação de indenização, em virtude da qual o indenizador será compelido a ressarcir os danos, a pagar ou satisfazer o pagamento a que estava obrigado.376Dissemos ser regra geral a obrigação de reparar o dano àquele que causar prejuízo a outrem por culpa ou por dolo. A exceção é quando o dano é proveniente

Page 460

de caso fortuito ou força maior. Confira pelo seguinte aresto: "Ocorrendo acidente em interior de educandário decorrente de prática de esporte em quadra, incabível é falar em indenização ao estudante que lá se machucou. O certo é que a quadra se apresentava em condições regulares à prática de atividade física, sendo que o fato que lá se sucedeu foi proveniente de caso fortuito" (in RT 815/348). Analise, ainda, a seguinte decisão: "Tratando-se de contrato de transportes, a responsabilidade civil do transportador é objetiva. No entanto, ocorrendo o roubo de carga a mão armada, fica caracterizado caso fortuito ou força maior, de forma a excluir a responsabilidade da empresa transportadora" (in RT 816/232). "Se as chuvas intensas e de caráter excepcional prevaleceram como causa do dano, sendo decretado, inclusive, estado de calamidade, não há que se responsabilizar a Administração, vez que o fato decorreu exclusivamente do fenômeno da natureza" (in RT 824/328).

No presente capítulo, iniciaremos estudo referente à liquidação dos danos provenientes de atos ilícitos em caso de homicídio e, em seguida, trataremos da liquidação dos danos advindos de atos ilícitos oriundos de lesões corporais, de usurpação, do exercício de atividade profissional, por injúria, difamação ou calúnia e de ofensa à liberdade pessoal, seguindo, assim, o roteiro do Código Civil.

39. 2 Da liquidação das obrigações resultantes de atos ilícitos

O agente do ato ilícito, que causa dano, está sujeito à indenização, ressarcindo o prejuízo. Para tanto, é preciso reduzir à quantidade certa, apurando-se um líquido. Trata-se da liquidação, uma operação que tem por objetivo estabelecer uma situação de liquidez para que a indenização seja justa.

Vale, a respeito, ter presente, o conteúdo do art. 944 do CC, in verbis:

"A indenização mede-se pela extensão do dano".

O art. 944, caput , do Código Civil não afasta a possibilidade de se reconhecer a função punitiva ou pedagógica da responsabilidade civil. Note-se, entretanto, que a possibilidade de redução do montante da indenização em face do grau de culpa do agente, estabelecida no parágrafo único do art. 944 do novo Código Civil, deve ser interpretada restritivamente, por representar uma exceção ao princípio da reparação integral do dano, conforme orientam os Enunciados n. 46, 379 e 380 do CJF377.

Page 461

Dano é toda ofensa que uma pessoa causa à outra, da qual possa resultar uma deterioração ou destruição da coisa ou um prejuízo ao patrimônio do ofendido. Não trataremos, espeificamente, do dano moral, aquele que atinge bens de ordem moral, tais como a honra, a profissão, a família etc. "O dano moral consiste na penosa sensação da ofensa, humilhação perante terceiros na dor sofrida, amparada pela nossa Constituição Federal em seu art. 5.º, V e X" (in RT 824/338).

39. 3 Da indenização em caso de homicídio

Se a vítima de acidente resultante de ato ilícito falecer, deve-se dar à família tudo aquilo que ela receberia do falecido, além do pagamento de todas as despesas resultantes da morte. Por isso nosso legislador escreveu o art. 948 do CC, in verbis:

"No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:

I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família.

II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima"378.

Page 462

O causador do dano, portanto, será compelido a ressarcir, além das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral, o luto da família e a indenização pelo dano moral, a prestar alimentos periódicos durante um certo tempo às pessoas a quem o falecido os devia, pensão essa reajustada na forma prevista na legislação especial.

Mas, qual deverá ser a duração desse tempo acima referido? Consoante orientação jurisprudencial, o limite de vida provável de uma pessoa, para o efeito indenizatório, é de 65 anos (in RT 769/244, 764/191, 525/114, 516/106, 507/119). No caso da vítima menor, a obrigação de pensionar dura até a data em que ela completaria 25 anos, idade essa, via de regra, em que os filhos se casam e deixam de prestar auxílio aos pais. Confira-se o seguinte aresto: "A indenização devida aos pais da vítima menor de acidente de trânsito, morta por atropelamento, deve ser fixada até o momento em que completaria 25 anos de idade, momento em que se presume que deixaria o lar paterno para contrair matrimônio e constituir sua própria família" (in RT 760/372).

Já sabemos que uma das condições para o recebimento de indenização é provar também o prejuízo. Como ficará a situação se a vítima, menor, não exercia atividade lucrativa, não contribuindo, portanto, para o sustento dos pais? E o caso da esposa que não exerce profissão lucrativa?

A questão do menor, que motivou grandes polêmicas e copiosa jurisprudência, ora num sentido, ora noutro, está superada face à jurisprudência do STF, consubstanciada na Súmula n. 491: "É indenizável o acidente que cause a morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado". A decisão de nossa mais alta Corte leva em consideração, portanto, a ajuda que futuramente a vítima poderia prestar a seus pais. Veja a propósito, a seguinte ementa de acórdão: "É inquestionável o cabimento da indenização, embora a vítima contasse apenas quatro anos de idade, pois a morte de uma criança ocasiona um prejuízo em potencial, máxime em família pobre" (in RT 462/99).

Portanto, os pais do menor de idade, vitimado em acidente motivado por ato ilícito, têm direito de exigir do culpado, indenização na forma do art. 948 do Código Civil, e a sentença, que julgar procedente a ação, determinará, ainda, a constituição de um capital, para garantir o pagamento das prestações vincendas, na forma do art. 602 do CPC379, que assim diz:

Page 463

"Toda vez que a indenização por ato ilícito incluir prestação de alimentos, o juiz, quanto a esta parte, condenará o devedor a constituir um capital, cuja renda assegure o seu cabal cumprimento.

§ 1.º Este capital, representado por imóveis ou por títulos da dívida pública, será inalienável e impenhorável;

I - Durante a vida da vítima;

II - Falecendo a vítima em consequência do ato ilícito, enquanto durar a obrigação do devedor.

§ 2.º O juiz poderá substituir a constituição do capital por caução fidejussória, que será prestada na forma do art. 829 e seguinte.

§ 3.º Se, fixada a prestação de alimentos, sobrevier modificação nas condições econômicas, poderá a parte pedir ao juiz, conforme as circunstâncias, redução ou aumento do encargo.

§ 4.º Cessada a obrigação de prestar alimentos, o juiz mandará, conforme o caso, cancelar a cláusula de inalienabilidade e impenhorabilidade ou exonerar da caução o devedor".

Este é um meio eficaz que o legislador impôs para garantir o credor contra o inadimplemento das obrigações de prestações futuras. A propósito, o Tribunal já decidiu que na constituição do capital, deve-se levar em conta apenas os juros de 6% ao ano, sendo a correção mera atualização para que o capital constituído tenha sempre o mesmo poder aquisitivo. E conclui o tribunal: "Se não fosse dessa forma, a cada três meses teria a executada de reforçar o capital, uma vez que é igualmente reajustável a prestação alimentícia a que a exequente faz jus" (in RT 527/64). Significa que o juiz somente libera para o alimentado a importância correspondente aos juros, que deve corresponder ao que ele deve receber relativo aos alimentos. Assim, por exemplo, o juiz pode determinar que o agente do ato ilícito deposite uma importância tal que os juros de 6% ao ano correspondam à pensão a ser paga. Se o agente foi condenado, por exemplo, a pagar R$ 1.000,00 por mês, deverá fazer um capital de R$ 200.000,00, depositando-o em um banco oficial, cujos juros a 6% ao ano corresponderá exatamente ao valor da condenação, ou seja, R$ 1.000,00.

Com relação à mulher casada que trabalha no lar e não possui remuneração, transcrevemos a seguir, a título de curiosidade, a ementa de um acórdão do TJSP, que bem mostra a situação: "Contribuindo a esposa para o lar, com serviços caseiros apenas, não poderá o marido pretender indenização pelo seu falecimento em desastre, pois aludidos trabalhos compensar-se-iam com as despesas que teria

Page 464

no sustento e manutenção da companheira" (in RT 352/115). Felizmente, neste julgamento houve voto vencido de autoria do Des. Coelho de Paula no sentido de que a esposa, ao se dedicar aos misteres caseiros, inclusive cuidando...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT