Acórdão Inteiro Teor nº RR-1192-61.2010.5.04.0751 TST. Tribunal Superior do Trabalho 8ª Turma, 24 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelDora Maria da Costa
Data da Resolução24 de Abril de 2013
Emissor8ª Turma

TST - RR - 1192-61.2010.5.04.0751 - Data de publicação: 26/04/2013 [Anonymoused]

A C Ó R D Ã O

(8ª Turma)

GMDMC/Dr/cb/mm RECURSO DE REVISTA.

1. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CULPA IN VIGILANDO. O Tribunal Regional decidiu a controvérsia em consonância com os artigos 186 e 927 do Código Civil, que preveem a culpa in vigilando. Ademais, os artigos 58, III, e 67 da Lei nº 8.666/93 impõem à Administração Pública o dever de fiscalizar a execução dos contratos administrativos de prestação de serviços por ela celebrados. No presente caso, o ente público tomador dos serviços não cumpriu adequadamente essa obrigação, permitindo que a empresa prestadora contratada deixasse de pagar regularmente a seus empregados as verbas trabalhistas que lhes eram devidas. Saliente-se que tal conclusão não implica afronta ao art. 97 da CF e contrariedade à Súmula Vinculante nº 10 do STF, nem desrespeito à decisão do STF na ADC nº 16, porque não parte da declaração de inconstitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93, mas da definição do alcance das normas inscritas nesta Lei, com base na interpretação sistemática. Recurso de revista não conhecido. 2. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. LIMPEZA E COLETA DE LIXO DE BANHEIROS PÚBLICOS. INAPLICABILIDADE DA OJ 4 SDI-1 DO TST. Decisão regional em harmonia com o entendimento pacificado nessa Corte, no sentido de ser devido o adicional de insalubridade em caso de limpeza de banheiros públicos, desde que constatado por laudo pericial, não tendo a OJ 4,II, da SDI-1 do TST o condão de afastar a percepção do aludido benefício, por não se tratar de lixo doméstico de residências e escritórios. Ressalva de entendimento desta relatora. Recurso de revista não conhecido. 3. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AUSÊNCIA DE CREDENCIAL SINDICAL. Segundo a diretriz das Súmulas nºs 219 e 329 deste Tribunal, na Justiça do Trabalho a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nunca superiores a quinze por cento, não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte estar assistida por sindicato da categoria profissional e comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família. Decisão do Regional contrária à jurisprudência sumulada desta Corte. Recurso de revista conhecido e provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-1192-61.2010.5.04.0751, em que é Recorrente ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e são Recorridas ANITA TEREZINHA KREWER e SANTOS E ALVES ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA.

Trata-se de recurso de revista de fls. 463/483, interposto pelo Estado do Rio Grande do Sul, segundo reclamado.

A Vice-Presidente do TRT da 4ª Região admitiu o apelo por meio da decisão de fls. 487/488, por contrariedade à Súmula 219,I, do TST.

Não foram apresentadas contrarrazões ao recurso de revista, conforme certidão de fl. 492.

O Ministério Público do Trabalho (seq. 3) opina pelo conhecimento e provimento do recurso de revista no tocante aos honorários advocatícios.

É o relatório.

V O T O

I - CONHECIMENTO

Preenchidos os pressupostos comuns de admissibilidade, atinentes à tempestividade, representação processual e preparo, examinam-se os específicos do recurso de revista.

1. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CULPA IN VIGILANDO.

No que tange ao tema em foco, assim consignou o Tribunal de origem:

"O Juízo de origem declarou a responsabilidade subsidiária do segundo reclamado frente a todo o contrato havido entre a autora e a primeira reclamada.

Investe o segundo reclamado contra essa decisão, alegando que a contratação da primeira reclamada foi precedida de licitação regular e válida, não lhe sendo aplicável a responsabilidade subsidiária por força do que dispõe o art. 71 da Lei nº 8.666/93. Diz que a Súmula 331 do TST é inaplicável, assim como a 11 deste Regional. Invoca a Súmula Vinculante nº 10 do STF, asseverando que foi desrespeitada a cláusula de reserva de plenário, contida no art. 97 da CF. Por fim, assevera que após o STF ter julgado procedente a ADC nº 16, declarando a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93, não pode o TST persistir no equivocado e ilegal entendimento da Súmula n° 331.

Examino.

Registro que nenhuma das recorrentes insurge-se quanto ao período abrangido pela respectiva condenação (desde 02.08.2004), conforme delimitado na sentença, tampouco quanto ao reconhecimento de que a extinção contratual operou-se em 28.05.2009, sem prévio aviso mediante despedida sem justa causa.

Quanto à questão central, é incontroverso que a autora, contratada pela primeira reclamada, laborou em benefício do Estado (nas dependências da Polícia Civil - Delegacia de Polícia de Campina das Missões - 10ª RP) como servente de limpeza, por força de contratos de prestação de serviços de limpeza firmados entre as reclamadas (fls. 46-160).

Subjaz, desde a terceirização empreendida, obrigação potencial do tomador dos serviços no tocante ao passivo trabalhista não solvido pela empresa contratada, como decorrência de responsabilidade subjetiva. Se de um lado o ordenamento jurídico reconhece licitude ao objeto do contrato celebrado entre o ente público e a prestadora de serviços, por outro, é certo que ambas respondem pelas obrigações trabalhistas, civis e tributárias daí derivadas, direitos e obrigações recíprocos que se estabelecem a partir do princípio fundamental consubstanciado nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, fundamentos deste Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, inc. IV). À luz de tal arcabouço jurídico, não prospera a tese de absoluta irresponsabilidade da pessoa jurídica de direito público, sujeito que é de direito e obrigações, máxime diante do preceito hermenêutico da proporcionalidade, segundo o qual às prerrogativas se contrapõem as responsabilidades, na mesma medida. Seguindo este norte, temos que o artigo 71 da Lei nº 8666/93, a despeito de ter sido declarado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal no final de novembro de 2010 (ADC 16), não é norma que mereça interpretação isolada como se contemplasse espécie de supra direito, exigindo, sim, exegese sistemática que o harmonize com os demais dispositivos que integram a própria lei na qual se acha inserido e demais normas constitucionais e infraconstitucionais de proteção ao trabalho humano. A propósito do tema, Carlos Maximiliano ensina que:

Não se encontra princípio isolado em ciência alguma. Acha-se, cada um em conexão íntima com outros. O direito objetivo não é um conglomerado caótico de preceitos; constitui vasta unidade, organismo regular, sistema, conjunto harmônico de normas coordenadas, em interdependência metódica, embora fixada cada uma em seu lugar próprio. De princípios jurídicos mais ou menos gerais deduzem corolários; uns e outros se condicionam e restringem reciprocamente, embora se desenvolvam de modo que constituem elementos autônomos operando campos diversos. (Hermenêutica e Aplicação do Direito. 9ª ed. 2ª tir. Rio de Janeiro: Forense,1981,p.128).

Sobre o mencionado art. 71 da Lei 8.666/93, a Profª. Alice Monteiro de Barros (Curso de Direito do Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2006. p. 509) leciona no seguinte sentido:

Esse dispositivo, ao resguardar os interesses do poder público, isentando-o do pagamento dos direitos sociais aos que venham a lhe prestar serviços, subverte a teoria da responsabilidade civil e atenta contra a Constituição vigente. Ora, admitir a isenção contida nessa norma implica conceder à Administração Pública, que se beneficiou da atividade dos empregados, um privilégio injustificável em detrimento da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho preconizados pela própria Constituição, como fundamentos do Estado Democrático de Direito (art. 1º, III e IV). Ressalte-se, ainda, que a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços funda-se na existência do risco, assumido pela Administração Pública ao contratar com prestadora de serviços inadimplente, e ter-se beneficiado da força de trabalho dos empregados contratados por esta última.

Instado a prestar informações relativas ao tópico IV da Súmula 331, o presidente do E.TST declarou que referida Corte faz o reconhecimento da responsabilidade da Administração Pública com base em fatos (descumprimento dos direitos trabalhistas pela empresa prestadora) e não pela decretação da inconstitucionalidade do art. 71 da Lei 8.666/93.

Consideramos que a decretação de constitucionalidade do indigitado dispositivo não implica imunidade automática do ente público em relação ao inadimplemento dos direitos trabalhistas dos empregados da empresa prestadora que contratou. Os princípios constitucionais clássicos que se impõem à Administração Pública demandam-lhe estreita observância da legalidade, que resguarda os direitos dos trabalhadores, da impessoalidade, que coíbe as discriminações e favoritismos, da moralidade, que resguarda a lisura e a boa-fé objetiva do administrador, da publicidade, mediante a total transparência na prática de seus atos e, por fim, da eficiência, na busca de resultados positivos tanto para o Estado quanto para seus administrados.

Lembro que o artigo 67 da Lei 8.666/93, complementado pela Instrução Normativa n. 02/2008 do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), que regulamenta a matéria no âmbito da Administração Pública Federal, impõe ao contratante minudencioso guia de acompanhamento e fiscalização da execução do contrato, por evidente, aí incluído o dever de verificar o cumprimento das obrigações trabalhistas e previdenciárias que dele derivam.

Assim, no caso concreto, o descumprimento das obrigações contratuais trabalhistas, conforme diviso no presente caso, dá azo à responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, em decorrência da culpa in elegendo ou in vigilando imputável à Administração Pública nas relações contratuais trabalhistas, uma vez figurando o...

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