Acórdão nº 1.0460.12.000456-5/001 de TJMG. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, 18 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelMoreira Diniz
Data da Resolução18 de Abril de 2013
Tipo de RecursoReexame Necessário-cv

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL. CRIANÇA E ADOLESCENTE. DIREITO À EDUCAÇÃO. PROTEÇÃO. POSSIBILIDADE. FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA. REQUISITOS PRESENTES. ENSINO FUNDAMENTAL. MATRÍCULA. RECUSA. RESTRIÇÃO ETÁRIA. DIREITO À EDUCAÇÃO. GARANTIA PREVISTA NA CR/88.

- A Constituição da República de 1988, ao definir o Ministério Público, em seu art. 127, como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, atribui a ele "a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis".

- É assegurado à criança e ao adolescente o direito à educação, prerrogativa constitucional fundamental indisponível, e que compreende desde o atendimento à pré-escola, passando pelo ensino fundamental e médio, obrigatórios e gratuitos, o acesso aos mais elevados níveis de ensino, pesquisa e criação artística.

- Os arts. 201 e 208 do Estatuto da Criança e do Adolescente atribuem ao Parquet legitimidade ativa ad causam para propor Mandado de Segurança em defesa dos direitos individuais indisponíveis, ainda que não sejam homogêneos, daqueles que, em razão da idade, encontram-se em situação de maior vulnerabilidade.

- O Mandado de Segurança é cabível para a proteção de direito líquido e certo não protegido por Habeas Corpus nem por Habeas Data, em sendo o responsável pelo abuso de poder ou ilegalidade autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público, nos termos do art. 5º, inc. LXIX, da CR/88.

- O direito à educação é garantia constitucional que não pode ser restringida por lei de hierarquia inferior, devendo o Estado e a sociedade promover meios para tornar possível o acesso aos meios mais elevados de progresso intelectual.

V.v DIREITO CONSTITUCIONAL - DIREITO PROCESSUAL CIVIL - REEXAME NECESSÁRIO - MANDADO DE SEGURANÇA - MINISTÉRIO PÚBLICO - EDUCAÇÃO - ACESSO AO PRIMEIRO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL - INTERESSE INDIVIDUAL - ILEGITIMIDADE ATIVA - PROCESSO EXTINTO - SENTENÇA REFORMADA.

- Ante a inexistência de autorização, pela Constituição Federal, ou pela lei processual, para o Ministério Público, em nome próprio, impetrar mandado de segurança destinado a beneficiar uma pessoa natural específica, impõe-se a extinção do processo, sem resolução do mérito, por ilegitimidade ativa, se a ação mandamental foi proposta nesses moldes.

DIREITO CONSTITUCIONAL - REEXAME NECESSÁRIO - MANDADO DE SEGURANÇA - EDUCAÇÃO - ACESSO AO PRIMEIRO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL - IDADE MÍNIMA - CRITÉRIO RAZOÁVEL - OFENSA A PRECEITO CONSTITUCIONAL - INOCORRÊNCIA - SEGURANÇA DENEGADA - SENTENÇA REFORMADA.

- A norma legal que estabelece idade mínima para ingresso no primeiro ano do ensino fundamental não viola a Constituição Federal, que apenas estabelece a educação como direito de todos e dever do Estado.

- O estabelecimento de idade mínima para ingresso no ensino fundamental não decorre de capricho do legislador, mas análise de estudos científicos que indicam qual é a idade mais adequada do desenvolvimento do ser humano para acesso às diversas fases de sua formação.

REEXAME NECESSÁRIO-CV Nº 1.0460.12.000456-5/001 - COMARCA DE OURO FINO - REMETENTE: JD 2 VARA CÍVEL CRIMINAL DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DA COMARCA OURO FI - AUTOR(ES)(A)S: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - RÉ(U)(S): MUNICÍPIO OURO FINO - AUTORID COATORA: DIRETOR DE EDUCAÇÃO DO MUNICÍPIO DE OURO FINO

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, por maioria, vencido o Relator, em REEXAME NECESSÁRIO, REJEITAR A PRELIMINAR E CONFIRMAR A SETENÇA.

DES. MOREIRA DINIZ

RELATOR.

DES. DÁRCIO LOPARDI MENDES

PRESIDENTE E RELATOR PARA O ACÓRDÃO.

DES. MOREIRA DINIZ (RELATOR)

Cuida-se de reexame necessário, ante sentença do MM. Juiz do Juizado da Infância e da Juventude da comarca de Ouro Fino, que concedeu a segurança impetrada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais - em benefício de Kerolly Thaiza Fernandes Antunes, contra ato da Diretora de Educação do Município de Ouro Fino.

O impetrante alega que a menor teve sua matrícula indeferida junto à Escola Municipal Ester Favilla, sob o argumento de que não tem a idade mínima para ingressar no primeiro ano do ensino fundamental, conforme determina os parágrafos 1º. e 2º. do artigo 8º. da resolução 07/2010, do Conselho Nacional da Educação; e que a referida resolução é contrária às disposições da Constituição Federal.

A sentença concedeu a segurança, determinando que "a Diretora de Educação do Município de Ouro Fino, Zinita Maria Costa Carneiro, matricule, em definitivo, a criança Kerolly Thaiza Fernandes Antunes no primeiro ano do Ensino Fundamental" (fl. 39).

Passo ao reexame necessário.

Da leitura da petição inicial, extrai-se que o Ministério Público, em nome próprio, postula a concessão de ordem em favor de Kerolly Thaiza Fernandes Antunes.

A Constituição Federal ampliou as atribuições afetas à instituição Ministerial, no intento de lhe conferir instrumentos para a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e de direitos indisponíveis.

Entre tais atribuições constitucionais, entretanto, não se visualiza uma que autorize o Ministério Público a se empenhar na defesa de direitos individuais heterogêneos, específicos, pela via do mandado se segurança.

A título de exemplo, basta ver que, quanto à ação civil pública, que se presta à tutela de direitos difusos, coletivos, e para alguns direitos individuais homogêneos, a Constituição Federal atribuiu legitimidade ativa ao Ministério Público (CF, artigo 129, inciso III).

Aliás, se a própria Constituição Federal, ao tratar do mandado de segurança coletivo, no seu artigo 5º, inciso LXX, estabeleceu que apenas os partidos políticos, sindicatos, entidade de classes e associações, detêm legitimidade ativa, excluindo, assim, a iniciativa do Ministério Público, contraria o bom senso e a razoabilidade admitir sua legitimidade para impetrar mandado de segurança individual em favor de particular.

Mesmo sendo menor de idade, a beneficiária da ação não se encontra em situação de abandono material, a exigir a atuação ministerial. Até porque os pais da menor velam por seus interesses, como se percebe pela leitura dos autos.

Embora sentimentalmente louvável, o comportamento do ilustre Promotor de Justiça oficiante representa, a meu ver, inadmissível atropelo das normas jurídicas procedimentais.

Convém destacar que ainda que se alegue eventual pobreza da beneficiária, isso não constitui motivo autorizador da intervenção do Ministério Público em benefício da mesma, porque o Estado, com a Defensoria Pública, está organizado para prestar assistência jurídica gratuita aos que dela necessitem, sendo certo, ainda, que o mesmo serviço pode ser desenvolvido por departamentos das Faculdades de Direito, a isso destinados, bem como por advogados particulares, que podem ser nomeados pelo magistrado para o cumprimento do encargo, inclusive a pedido do Ministério Público.

Nesse ponto, se não é exigível do cidadão leigo a ciência de tais mecanismos, o mesmo não se pode dizer dos membros do Ministério Público, que, ao receberem visitas de pessoas interessadas na propositura de ações, devem encaminhá-las aos devidos setores, isto é, à Defensoria Pública, ou a algum advogado que se disponha a, gratuitamente, patrocinar o feito.

Sendo assim, resta configurada uma substituição processual não autorizada pela Constituição Federal ou pela lei processual, o que conduz à ilegitimidade ativa do Ministério Público, e conseqüente carência de ação.

Ainda que se entenda que o Ministério Público não seja o autor da ação, mas mero representante da beneficiária da providência reclamada, restaria inevitável a extinção do feito, sem exame de mérito, porque não há fundamento legal para essa representação.

Com tais apontamentos, reformo a sentença, e julgo extinto o processo, sem exame do mérito, com base no artigo 267, inciso VI, do Código de Processo Civil.

Custas, pelo impetrante; isento por força de lei.

Não há condenação ao pagamento de honorários advocatícios, ante o teor da súmula 512 do Supremo Tribunal Federal, assim como da súmula 105 do Superior Tribunal de Justiça.

DES. DÁRCIO LOPARDI MENDES (PRESIDENTE E RELATOR PARA O ACÓRDÃO)

V O T O

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