2.1 Conceitos e caracterização

AutorVinicius Cordeiro - Anderson Claudino da Silva
Páginas29-43

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No exercício do voto deve-se observar que as linhas gerais de um partido podem determinar a escolha que um cidadão faz por um ou outro candidato. Com isso, ao se apresentar por uma determinada legenda, o candidato expõe publicamente a defesa dos valores que justiicam a existência do partido que ele integra.

De fato, muitos eleitores consideram de suma importância avaliar a iliação partidária, já que é praticamente impossível encontrar um candidato que pense exatamente igual a todos os seus eleitores. É fundamental destacar que o ordenamento jurídico brasileiro não permite as candidaturas independentes, e uma das condições de elegibilidade por expressa previsão constitucional é a iliação partidária.

São vários os conceitos de idelidade partidária formulados pelos doutrinadores. Vejamos alguns.

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Plácido e Silva8leciona o seguinte:

"derivado do latim idelitas (idelidade, lealdade), no conceito jurídico, entende-se a observância exata e leal de todos os deveres ou obrigações impostos pela própria lei. É, assim, o cumprimento ou a execução de todos os deveres atribuídos à pessoa em virtude de en-cargo, e contrato ou de qualquer outra obrigação [...] Opõe-se à inidelidade, que é a falta de cumprimento da obrigação ou do dever imposto".

Said Farhart assim conceitua a idelidade partidária:

"consiste na adesão intelectual do membro do partido - iliado ou representante eleito, no Governo, no Congresso, nas Assembleias Legislativas estaduais ou nas Câmaras Municipais - à ilosoia do partido, sua concepção de sociedade e dos métodos e meios para realizar suas ideias a esse respeito" 9 .

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Finalmente, Marcos Ramayana10aduz que a compreensão do instituto "está correlacionada com os deveres impostos pelo estatuto do partido político ao seu iliado (eleito ou não eleito). A lei faz menção à idelidade e disciplina, o que enseja uma evidente interligação entre as expressões que no fundo resvalam no acatamento das diretrizes e dos objetivos partidários".

Assim, tendo em vista os conceitos acima transcritos, pode-se compreender que são elementos que caracterizam a idelidade partidária:

a) a observância do programa, das diretrizes e dos objetivos partidários, e coerência entre votos e atitudes, pronunciamento de acordo com tais ditames;

  1. o respeito às deliberações internas, como decisões dos organismos diretivos, diretórios partidários, comissões executivas, convenções, ou das bancadas partidarias;

  2. a atuação em prol dos resultados eleitorais do partido, ou candidatos por ele apoiados ou lançados, nas suas campanhas e disputas eleitorais em geral;

  3. a estrita observância das normas estatutárias, interna e externamente.

A Constituição Federal de 1988 consagrou a instauração de um Estado Democrático de Direito, sendo importante ressaltar que um dos pilares do regime

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democrático é a existência de partidos fortes, com um programa de governo bem elaborado, discutido e socialmente conhecido.

Os partidos políticos são instâncias associativas permanentes e estáveis, dotadas de ideologia e programa político próprios, destinadas à arregimentação coletiva, buscando, em último plano, conquistar o controle do poder político, seja pela ocupação de cargos ou inluência nas decisões políticas. Entretanto, algumas falhas no sistema partidário exigiram dispositivos que protejam a fortaleza dessa instituição preciosa à democracia, no comento de Janine Adeodato Acioly:

"A idelidade partidária é aspecto indispensável ao fortalecimento das instituições políticas. Por muitos anos ocorreu uma valorização do candidato em detrimento do partido, situação essa que facilitou a migração partidária, muitas vezes com inalidade meramente eleitoral ou pessoal, em face da ausência de compromisso com os programas partidários." 11

É importante destacar que a questão da idelidade não pode ser vista apenas pelo ângulo do estabelecimento de sanções, como a perda de mandato, me-

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recendo reparos ou excepcionalidades; sobre o tema Clèmerson Merlin Clève asseverou:

"Em determinadas circunstâncias, a liberdade de consciência pode e deve autorizar, a despeito da eleição de diretriz partidária, a abstenção do parlamentar. Não é possível, ainal, que não se dê ao representante eleito sequer o direito de esquivar-se, por motivo de foro íntimo, dever de consciência ou convicção política, religiosa ou ilosóica, de votar de acordo com a ordem recebida" (in Fidelidade partidária, Ed. Juruá, 1998, p. 30).

Ficou célebre a punição recebida por dois parlamentares do PT (Partido dos Trabalhadores) que se opuseram à deliberação de um congresso partidário, em respaldo à questão do aborto: os dois deputados, um evangélico e outro católico, que alegaram objeção de consciência, mas isso não evitou a punição dos políticos pela direção partidária.

MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO12ilumina o juízo sobre o fato quando opina que:

"a resistência à idelidade funda-se menos no respeito aos princípios tradicionais do que no apego dos parlamentares que fazem as leis e as constituições à

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sua própria conveniência. De fato, se essa medida tem o gravíssimo defeito de rejeitar o deputado à cúpula partidária, tem o mérito de impedir que o eleitorado iel à determinada corrente ique sub-representado no Parlamento porque alguns dos eleitos mudaram de ideias, ou, o que não é impossível, se deixaram seduzir por outros grupos".

O mesmo autor teceu loas ao movimento de Março de 1964, entre tantos motivos, por ter estabelecido um estatuto jurídico que fortalecia o caráter programático dos partidos, enrijecia a disciplina, "proscrevendo as dissidências (...)"13, privilegiava a "democracia pelos partidos" e que via o parlamentar como "um soldado, iel e disciplinado, do partido (...)". O mesmo...

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