3. Do crime
Autor | Leonardo Castro |
Páginas | 78-136 |
78 DIREITO PENAL
3 DO CRIME
3.1. TEORIA GERAL DO CRIME
O que é crime? São inimagináveis e incontáveis as possíveis respostas.
Posso dizer que, assim como a contravenção penal, o crime é espécie
do gênero infração penal. Também posso dizer que crime é aquilo o que
a lei assim considere (conceito formal). Ademais, delito é a conduta
humana causadora de relevante lesão ou perigo de lesão a um bem ju-
rídico tutelado (conceito material). No entanto, entre tantos conceitos,
um se destaca: o analítico, que trata do crime de forma estruturada.
Para melhor compreender, relembro das aulas do colégio, quando o
professor de biologia dizia que o corpo humano é composto por ca-
beça, tronco e membros. Para o conceito analítico, o crime é composto
por fato típico, ilicitude e culpabilidade. No entanto, há uma importante
diferença em relação ao corpo humano: é possível que um corpo não
possua membros, mas não há crime caso falte um dos seus elementos
de composição – os intitulados substratos. Se dissecássemos o crime,
encontraríamos a estrutura abaixo.
FATO TÍPICO CULPABILIDADEILICITUDE
Volto a dizer, caso falte um dos substratos, toda a estrutura cede e o
crime deixa de existir. Um exemplo, para melhor esclarecer: a legítima
do reconhecida, o segundo substrato (ilicitude) deixa de existir e, em
consequência, ocorre a ruína de toda a estrutura do delito. Ou seja: a
legítima defesa faz com que o crime deixe de existir.
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FATO TÍPICO
Legítima defesa
CULPABILIDADEILICITUDE
O primeiro substrato, fato típico, possui quatro elementos: conduta,
resultado, nexo causal e tipicidade. A culpabilidade é composta por três
elementos: imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e exigibi-
desses elementos dos substratos, estabelecendo quando estão ou não
presentes. Ademais, também estabelece as causas gerais de exclusão
da ilicitude.
FATO TÍPICO ILICITUDE CULPABILIDADE
(a) Conduta;
(b) Resultado;
(c) Nexo causal;
(d) Tipicidade.
Ausência de previsão legal
que torne a conduta lícita.
(a) Imputabilidade;
(b) Potencial consciência da ilicitude;
(c) Exigibilidade de conduta diversa.
3.1.1. FATO T ÍPIC O
A conduta é elemento do fato típico. Quando ausente, o crime não
existe. A conduta pode ser conceituada como o comportamento hu-
mano voluntário psiquicamente dirigido a um fim. Ela se manifesta
por ação (crime comissivo) ou por inação (crimes omissivos). Tem de
existir vontade do indivíduo que a realiza, caracterizada por dolo ou
culpa – na culpa, não se deseja o resultado, mas a conduta é voluntária.
×Exemplo de exclusão da conduta: a coação física irresistível.
O resultado considerado elemento do fato típico é o jurídico. Só há
crime se da conduta resultar lesão ou risco de lesão ao bem jurídico
tutelado. Existe um outro resultado, denominado naturalístico, que é a
mudança no mundo exterior causada por uma conduta. A sua existên-
cia é fundamental à consumação dos crimes materiais (ex.: o homicídio,
que só se consuma com a morte da vítima), mas irrelevante aos crimes
formais e inexistente nos de mera conduta.
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×Ou seja: se pratico uma conduta (comissiva ou omissiva), mas não
produzo qualquer risco ao bem jurídico tutelado, não há crime por
falta de resultado.
O nexo causal é a ligação entre a conduta e o resultado. Pode ser físi-
co, quando o resultado é consequência natural da conduta – se disparo
um tiro e o projétil destroça o organismo da vítima, causando sua mor-
te, há relação física entre a minha ação e o resultado –, ou normativo,
se a ligação é estabelecida pela lei, de forma artificial.
×Exemplo de exclusão do nexo causal: agindo com vontade de matar,
coloco veneno no café de alguém. No entanto, antes de ingeri-lo,
outra pessoa dispara tiros e mata a vítima pretendida, causando sua
morte. Como a minha conduta em nada influenciou para a produção
da morte, não devo ser responsabilizado pelo homicídio consumado.
Inexiste nexo causal entre minha ação e o resultado.
O quarto elemento do fato típico é a tipicidade, que se divide em:
(a) Tipicidade formal: a conduta tem de ser considerada, em lei, crimi-
nosa. Ex.: o homicídio é crime por estar tipificado no art. 121 do
CP. Quando inexistente lei que criminalize a ação ou omissão, o
juízo de subsunção não se completa e a conduta é considerada for-
malmente atípica. Ex.: até 2012, era formalmente atípica a conduta
de invadir dispositivo informático (conduta atualmente tipificada
no art. 154-A do CP).
(b) Tipicidade material: não basta que a conduta seja formalmente tí-
pica. Para que seja reconhecida a existência do crime, tem de haver
lesão ou risco de lesão relevante ao bem jurídico tutelado (tipici-
dade material). Quando aplicado o princípio da insignificância, a
tipicidade material é afastada – e, em consequência, o crime –, pois
a lesão ao bem jurídico tutelado (ex.: patrimônio) foi ínfima.
3.1.2. TIPICIDADE CONGLOBANTE
Alguns autores falam em tipicidade formal e em tipicidade congloban-
te, no lugar da tipicidade material. Explico: para quem adota essa forma
de pensar, a tipicidade é formada por tipicidade formal e tipicidade
conglobante, e esta é composta pela tipicidade material e pela antiju-
ridicidade (ilicitude). O problema da teoria: a tipicidade conglobante
invade objeto de análise do segundo substrato do crime, a ilicitude,
causando confusão quando aplicada alguma excludente (ex.: art. 23
do CP). Entenda:
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