Alteração das Condições de Trabalho

AutorEvaristo de Moraes Filho - Antonio Carlos Flores de Moraes
Ocupação do AutorProfessor Emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro - Professor do Departamento de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Páginas273-279

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1. Novação contratual - O surgimento no direito civil do instituto da cessão de crédito revolucionou o princípio da pacta sunt servanda e, como consequência direta, a novação perdeu em importância.

Historicamente, de acordo com o magistério de Washington de Barros Monteiro, a novação "desempenhava papel de grande relevo no direito romano, porquanto nesse direito, uma vez contraída determinada obrigação, não mais se poderia alterar, exceto através de nova obrigação, que se substituísse à primeira".1

Assim sendo, a novação, tal qual era utilizada no direito romano, alicerçava o princípio da intransmissibilidade das obrigações, antagônico à livre transmissão do crédito e à liberdade das transações.

Por isso, a maioria dos países retirou de seus códigos a figura da novação, ou lhe diminuiu o relevo, como é o caso da Alemanha e Suíça.

O Código Civil Brasileiro de 2002 manteve a novação, nos termos dos arts. 360/367 do CC, atribuindo-lhe, segundo Washington de Barros Monteiro,2 características próprias e efeitos jurídicos apreciáveis, diferindo radicalmente do conceito romano.

Na verdade, a novação hoje é opcional, se o objetivo é a transformação do pacto obrigacional, quando nos seus primórdios era o único meio.

No direito do trabalho, é difícil aplicar o conceito de novação, uma vez que pressupõe a substituição de um dos obrigados ou a extinção da obrigação anterior, por meio de nova obrigação. No primeiro caso, só teria aplicação no direito do trabalho a substituição do empregador. No segundo caso, torna-se delicado comprovar a extinção de obrigações e constituição de outras, em contratos de muitos anos que podem, inclusive, ser verbais. Além disso, nossas normas trabalhistas, de proteção ao empregado, não permitem que se acate, na maioria das vezes, a extinção de obrigações anteriores, por parte do empregador, mesmo mediante a assinatura de novo contrato.

Ensina-nos Evaristo de Moraes Filho:3 "Qualquer novação, ainda que com o beneplácito e livre consentimento do empregado (arts. , 444 e 468 da CLT), pode, dentro do período prescricional, vir a ser anulada por ação própria na Justiça do Trabalho, desde que acarrete prejuízo direto ou indireto ao empregado. A um jurista tradicional, tal assertiva chega a parecer absurda e imoral; mas por isso mesmo é que surgiu um novo e especial ramo da ciência do direito, que rompe, de certo modo, com a utilitas do direito civil, do tipo dispositivo, e que goza de algum particularismo".

2. Poder de mando do empregador - A relação do direito do trabalho com a ciência econômica foi examinada neste livro, quando se demonstrou que o trabalho juntamente com o capital e a própria natureza se constituem nos fatores de produção. Assim, o denominado jus variandi do empregador, que, inicialmente, se poderia considerar uma violação à

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norma da pacta sunt servanda, na realidade significa a adequação dos princípios jurídicos aos econômicos.

Além do mais, estando o empregado subordinado permanentemente às ordens de seu empregador, este, por necessidade de serviço, pode variar a produção de seu subalterno, sem que tal questão represente prejuízo ou desrespeito ao pactuado inicialmente.

O jus variandi decorre, por conseguinte, do próprio poder de mando do empregador, que somente deve ser exercido em casos especiais, excepcionais e transitórios, não caracterizando, em nenhum momento, a novação contratual. Poder-se-ia citar, como exemplo, a prorrogação da jornada de trabalho por necessidade imperiosa do serviço ou, ainda, por força maior, quando o aumento de produção será o fator preponderante do ato praticado pelo empregador.

No mesmo sentido tem-se manifestado a jurisprudência, considerando que "não constitui alteração unilateral do contrato o acréscimo diário de 45 minutos na jornada de trabalho, para completar o horário semanal estipulado no pacto laboral. Precedentes do TFR. Incabível, por isso, a concessão de horas extras".4

O Tribunal Superior do Trabalho considerou também incorrer "alteração contratual quando o deslocamento para nova frente de trabalho não acarreta a mudança de domicílio dos empregados e o acréscimo com despesas de transporte é ressarcido".5

Em caso de progresso tecnológico que proporcione ao empregado, remunerado por peça ou tarefa, um aumento de produção independente de seu próprio esforço, poderá ocorrer a modificação do contrato (preço tarifário), ajustando-o ao valor real inicialmente pactuado, em perfeita consonância com a cláusula rebus sic stantibus.

O jus variandi poderá ser exercido pelo empregador na modificação do horário do empregado dentro do mesmo turno da jornada de trabalho, respeitadas as garantias adiante examinadas. No exercício de seu jus variandi, o empregador não deve exceder os limites impostos pelo fim econômico e social de seu direito, pela boa-fé ou pelos bons costumes (art. 187 do CC).

Outro limite a ser guardado pelo empregador no exercício de seu jus variandi é o relativo à função social do contrato (art. 421 do CC), devendo guardar na execução do contrato os princípios de probidade e boa-fé (art. 422 do CC).

Desnecessário, portanto, comentar-se a permissibilidade da alteração unilateral por parte do empregador, quando benéfica ao empregado, como a redução do horário de trabalho com manutenção do salário, além de outras vantagens de natureza pecuniária.

Todavia, a fim de evitar prejuízos "diretos ou indiretos" do empregado, conforme preceitua o art. 468, consolidado, há uma série de limitações à vontade do empregador, impedindo-o de modificar a forma do salário, o local de trabalho, entre outras coisas que analisamos a seguir.

3. Limitação da vontade do empregador - O art. 468 consolidado estabelece que a alteração contratual, embora com mútuo consentimento, só é lícita se não resultar, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente dessa garantia.

Para analisar as hipóteses que podem surgir durante a relação de emprego, mantivemos a metodologia adotada por Evaristo de Moraes Filho desde a edição em 1944 de sua obra Contrato de Trabalho, adaptando-a, apenas, à realidade legislativa e jurisprudência dos dias atuais.

4. Mudança da forma de salário - A comutativi-dade do contrato de trabalho pressupõe que ambas as partes sabem perfeitamente as suas obrigações e as respectivas naturezas: o empregado, de fazer - prestar - determinado serviço; o empregador, de dar - pagar - certa remuneração.

No momento, ocupar-nos-emos com esse último aspecto, diferenciando, inicialmente, as modalidades de que podem se revestir o salário: por tempo ou por unidade de tempo, e por peça ou por unidade de obra. Temos, ainda, um terceiro gênero, intermediário, ou seja, o salário por tarefa.

Resumindo, a primeira espécie significa o pagamento de salário diário, semanal ou mensal, independente da produção. No segundo, o valor da remuneração depende tão somente da produção do empregado, como é o caso do comissionista exclusivo. Finalmente, o salário por tarefa é o que se paga a um operário em consideração ao tempo, mas com

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a obrigação de produzir, dentro dele, um resultado mínimo determinado.

Sobre as duas primeiras formas de remunerar o trabalho, nos ensina Evaristo de Moraes Filho:6 "As duas espécies de execução do contrato de trabalho são inteiramente heterogêneas e inconciliáveis entre si, mesmo em linguagem matemática, visto como se trata de duas unidades diferentes: unidade por tempo e unidade por peça. E a mudança de uma forma para outra, sem motivo de força maior ou de conveniência devidamente...

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