"Hoje, no Brasil, o Judiciário é a grande face da distribuição de renda"

AutorAlexandre Facciolla

Lívio Enescu é uma figura que chama a atenção nos encontros de operadores do Direito de São Paulo. Suas gravatas borboleta são conhecidas tanto entre advogados quanto entre a magistratura, com quem ele tem bom relacionamento.

Presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado de São Paulo (biênio 2014 — 2016), Enescu tem posições firmes sobre as relações entre empresa e empregado. Ele avalia, por exemplo, que a mudança alcançada com a Emenda Constitucional 45, de 2004, tornou mais ampla a área de atuação dos advogados — que ele passou a liderar. A Justiça do Trabalho, lembra ele, não só cuida das relações de emprego, mas das relações de trabalho: “Essa advocacia passa a ter muita pujança, estabelecendo hoje, na minha opinião, a maior classe média da advocacia em todo o país”, assinala.

Filho de imigrantes fugidos do stalinismo na Romênia, que, por acaso, tiveram como destino de fuga o Brasil, o advogado recebeu a revista eletrônica Consultor Jurídico em seu escritório, no centro de São Paulo. No encontro, falou sobre questões que vão da rearticulação da própria categoria — a AATSP conta apenas 800 associados, enquanto o estado tem cerca de 100 mil advogados trabalhistas — à relação da advocacia trabalhista com os tribunais e com os clientes. Enescu também falou sobre as implicações do Processo Judicial eletrônico e a descentralização do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região.

Apesar de não advogar na área esportiva, Enescu tem o esporte como peça fundamental para a construção das relações sociais e, também, da própria democracia. Tanto que o estabelecimento de atividades festivas e de cunho esportivo são pautas essenciais de sua gestão à frente da AATSP.

Na conversa com a revista, ele relembrou como foi parar na advocacia e, depois, na militância da categoria trabalhista. “Vi que a área trabalhista possibilitava colocar ideologia junto com o ferramental do Direito”, rememora.

Com 57 anos, Enescu acumula o cargo de presidência da Comissão do Advogado Assalariado, e as vice-presidências da Comissão de Direitos e Prerrogativas e da Comissão de Direito Desportivo da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil.

Leia a entrevista:

ConJur — Quais são os pontos prioritários da advocacia trabalhista?

Lívio Enescu — Na questão trabalhista há primeiro o preconceito. A questão do capital e trabalho sempre foi vista pela questão de defesa dos direitos dos trabalhadores. Na época da ditadura militar, apesar de não terem mexido no direito dos trabalhadores, não se permitia a organização deles em sindicatos e centrais; se permitia, combatia e criminalizava a atuação. No seu bojo, temos a advocacia trabalhista — que sempre foi tida como uma advocacia menor, no conjunto da advocacia geral. Com o crescimento da Justiça do Trabalho em todo o país, há o crescimento da advocacia trabalhista. Em São Paulo, por exemplo, 100 mil advogados que são cadastrados trabalhistas nos dois Tribunais Regionais do Trabalho: o da 2ª Região, que é o tribunal da capital, Baixada Santista e grande São Paulo, e no da 15ª Região, que é o tribunal do interior. Ainda falta muita coisa para ser estabelecida na luta dos advogados.

ConJur — Houve uma mudança estrutural na advocacia trabalhista em 2004, com a Emenda Constitucional 45?

Lívio Enescu — Sim. A gente percebe a advocacia trabalhista hoje muito pujante. A lei trabalhista mudou. Com a constitucionalização e a reforma, mais jovens que vêm da academia vão para advocacia trabalhista, para Procuradoria do Trabalho, para magistratura trabalhista, ou seja, existe uma abertura de campo muito grande. O advogado trabalhista, diferentemente do advogado normal, tem uma ida ao judiciário muito maior. É o advogado que mais participa de audiências, quase que diárias.

ConJur — Isso acontece mesmo com chegada do processo eletrônico?

Lívio Enescu — Sim, porque na Justiça do Trabalho as audiências de conciliação são obrigatórias. Além disso, há muitas audiências, já que, nessa área, a prova é essencial. Oitenta porcento das demandas trabalhistas são por conta de horas-extras e equiparação salarial que precisam de prova em sede de audiência. Já as outras carreiras nem tanto, porque é só ver se a lei foi cumprida ou não. Essas questões de Direito não precisam nem de audiência.

ConJur — Em sua campanha para a AATSP, a necessidade de dinâmica social e esportiva ficaram em evidência. Quais são os planos quanto a isso?

Lívio Enescu — A incivilidade da dinâmica social paulistana é percebida na relação entre os advogados, e também entre os advogados e os operadores do Direito. Não digo que seja uma relação muito difícil, mas há uma relação não muito amistosa com a magistratura. É algo que precisa ser construído. É necessário construir pontes e tirar muros, e para isso tem que ter a associação, como a gente diz na gíria, quebrando o gelo e trazendo mais os advogados para o seu ambiente dentro da associação, estabelecendo dinâmicas sócio-culturais e desportivas. Na questão desportiva...

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