9. Dos crimes contra a pessoa
Autor | Leonardo Castro |
Páginas | 244-295 |
244 DIREITO PENAL
9 DOS CRIMES CONTRA A PESSOA
9.1. DOS CRIMES CONTRA A VIDA
9.2. HOMICÍDIO
Homicídio simples
Art. 121. Matar alguém:
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
9.2.2.1. CONDUTA
Crime do artigo 121, caput, o homicídio simples tem por verbo nu-
clear matar (tirar a vida de alguém). Para que fique caracterizado o
delito, deve o homicida agir com vontade livre e consciente de matar
alguém (dolo direto) ou assumir o risco de produzir o resultado natu-
§ 3º). Exemplos: (1) com vontade de matar (dolo), Carlos dispara dois
tiros contra Joaquim, que morre em razão da agressão; (2) ao manusear
de forma imprudente uma arma de fogo (culpa), Joaquim a dispara
acidentalmente e atinge Carlos, matando-o.
ATENÇÃO!
O homicídio é o único crime doloso contra a vida que admite prisão
temporária (Lei nº 7.960/89, art. 1º, III, “a”).
9.2.2.2. SUJEITOS ATIVO E PASSI VO
Crime comum, pode ser praticado por qualquer pessoa. A vítima
também pode ser qualquer pessoa (bicomum). Basta que esteja viva, e
que a vida seja extrauterina.
×Crime impossível
LEONARDO CASTRO 245
pois é comum que se faça confusão em relação à inidoneidade relativa
ou absoluta para a produção do resultado morte. Dois exemplos:
(a) João quer matar Carlos. Para alcançar o resultado desejado, João
pega todos os remédios que encontra em sua casa e, após moê-los,
os mistura à uma vitamina. Em seguida, faz com que Carlos beba o
líquido, na esperança de causar a morte por overdose. Ocorre que,
dentre os medicamentos misturados à bebida, nenhum é capaz de
matar, nem mesmo em altas dosagens. Neste caso, não há como res-
ponsabilizá-lo por homicídio, nem mesmo tentado, afinal, a morte
da vítima jamais seria alcançada. Trata-se de crime impossível por
absoluta ineficácia do meio de execução.
(b) João quer matar Carlos. Para alcançar o seu objetivo, dilui raticida
(veneno de rato) em um suco e, em seguida, faz com que Carlos beba
o líquido. Carlos passa muito mal e chega a ser hospitalizado, mas
não morre em virtude de João ter usado quantidade insuficiente de
veneno para causar a morte da vítima. No exemplo, João responderá,
sim, por homicídio, na forma tentada. A diferença? O raticida é meio
idôneo para causar a morte – ineficácia relativa do meio -, que só não
se consumou por razões alheias à vontade de João.
9.2.2.3. CONSUMAÇÃO
O homicídio é crime material, cuja consumação depende da ocorrên-
cia do resultado naturalístico. Se a vítima sobreviver, o delito é punido
em sua forma tentada.
×Tentativa de homicídio
Por se tratar de crime material – que se consuma com a produção
do resultado naturalístico -, o homicídio só se consuma se a vítima,
de fato, morrer. Caso fique viva, mas por razões alheias à vontade do
o homicida será punido pela pena do delito (seis a vinte anos, sem
simples, ou doze a trinta anos, se qualificado), diminuída de um a dois
terços (CP, art. 14, parágrafo único). No entanto, cuidado: a tentativa
está caracterizada apenas quando o crime não se consuma (a morte não
ocorre) contra a vontade do homicida. Exemplo: agindo com vontade
de matar, Carlos dispara tiros contra Francisco, mas não atinge o alvo
desejado por erro de pontaria. Ele quis matar? Sim. A vítima ficou viva
contra sua vontade? Sim. Logo, tentativa.
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9.2.2.4. ELEMENTO SUBJETIVO
Os homicídios simples e qualificado são dolosos (direto ou eventual),
mas o artigo 121 pune, em seu § 3º, a modalidade culposa do delito. É
preciso ter cuidado com o dolo eventual, a culpa consciente e a culpa
inconsciente, conforme explicado a seguir.
×Dolo eventual e culpa consciente
Em um caso real, não é fácil distinguir o dolo eventual de culpa cons-
ciente. Se bebo um litro de cachaça e decido dirigir – se é que isso é
possível -, é evidente que assumi o risco de causar um acidente (logo,
dolo eventual). No entanto, se bebo um copo de cerveja, a situação já
não é tão simples. Para a legislação, estou embriagado. Entretanto, é
possível dizer que, após um copo de cerveja, assumi o risco de matar
alguém? Ademais, se dirijo a 150 km/h em uma via de limite máximo
de 50km/h, não é difícil apontar pelo dolo eventual. Todavia, e se a
velocidade for de 70km/h? Por ter excedido em 20km/h a velocidade
permitida, assumi o risco de matar alguém? Não por outro motivo, em
homicídios causados por acidente de trânsito, a briga entre a acusação e
a defesa costuma girar em torno do dolo eventual e da culpa consciente.
×Culpa imprópria
Imagine o seguinte exemplo: João e Carlos, inimigos, pertencentes a
facções rivais, se encontram enquanto caminhavam pela rua. João leva
a mão à cintura para pegar o seu celular e avisar aos demais integrantes
da organização a localização de Carlos. Entretanto, Carlos interpreta
equivocadamente o gesto de João, e imagina que o seu inimigo saca-
rá uma arma. Em suposta legítima defesa (legítima defesa putativa),
Carlos dispara tiros contra João, causando-lhe a morte. Ou seja, temos
duas realidades: a verdadeira, em que João apenas quis pegar o celular;
a de Carlos, em que o inimigo atentaria contra a sua vida ao sacar uma
arma de fogo.
Como Carlos deve ser punido? Depende. Se o erro era inevitável, não.
Entretanto, se evitável, deve ser punido a título de culpa (homicídio
culposo). No caso do erro evitável, em que ocorre o homicídio culposo,
Carlos pode ser punido por homicídio culposo consumado, se João
falecer, ou por tentativa de homicídio culposo, caso a vítima sobreviva.
Ou seja, embora Carlos tenha agido dolosamente, a sua punição se dá
por culpa (intitulada culpa imprópria) e, caso o crime não se consume,
nada mais justo que seja punido pela tentativa.
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