Abuso de autoridade: ameaça real ou falácia?

AutorRaphaella Benetti da Cunha Rios
CargoJuíza de direito no Paraná
Páginas128-140
128 REVISTA BONIJURIS I ANO 31 I EDIÇÃO 661 I DEZ19/JAN20
SELEÇÃO DO EDITOR
Raphaella Benetti da Cunha Rios JUÍZA DE DIREITO NO PARANÁ
LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE:
AMEAÇA REAL OU FALÁCIA?
Há quem sustente que a nova legislação pode inibir as atividades
jurisdicionais de magistrados e promotores; e há quem afirme que
faltava, de fato, um freio ao servidor público
R
ecentemente, assistimos ao advento me-
teórico da Lei 13.869/19, que versa sobre
o abuso de autoridade. Referida norma
vem gerando manifestações entusiasma-
das, tanto de amor como de ódio. Amor
daqueles que defendem que faltava um freio ao
servidor público da mesma maneira que existe
para o particular. Ódio por parte especialmen-
te de juízes e promotores, que vêm entendendo
que os tipos abertos contidos na lei podem dar
ensejo à inibição da atividade jurisdicional livre,
minando a independência funcional dos magis-
trados e membros do Ministério Público.
A mídia em geral, inclusive através da inter-
net e das redes sociais, apela para a sensibili-
dade do cidadão. Af‌inal, a lei em comento vem
sendo vendida como uma verdadeira arma para
o particular que se sinta prejudicado por abu-
sos cometidos por servidores públicos. Quem
nunca passou por uma situação de estresse em
alguma repartição pública? Isso infelizmente é
comum e já deve ter acontecido com todo mun-
do. Porém, é preciso analisar o momento em
que a Lei 13.869/19 entrou em vigor, bem como
o porquê de ter sido desencadeada, ou seja, as
razões por trás da sua rápida tramitação.
Conforme tentarei demonstrar, é preciso
coibir condutas abusivas de autoridades, mas
não é possível atentar contra a independência
funcional de juízes, sob pena de se colocar em
risco o regime democrático. E a Lei 13.869/19
acaba por possibilitar a punição de atos corri-
queiros, necessários ao bom exercício da juris-
dição, especialmente no combate à corrupção.
Nesse sentido, este artigo pretende analisar
a Lei 13.869/19 sob o prisma técnico, bem como
suas repercussões na mitigação da indepen-
dência funcional do juiz, verdadeiro direito
humano fundamental que é, já que consagra-
do, inclusive, em tratados internacionais dos
quais o Brasil é signatário.
1. INDEPENDÊNCIA COMO DIREITO
HUMANO FUNDAMENTAL DE TODO E
QUALQUER MAGISTRADO
Em tese de doutorado apresentada em 2019
perante à Universitat de Barcelona – e que deu
origem a um livro nela inspirado –, trabalhei o
Rev-Bonijuris_661.indb 128 14/11/2019 17:44:43

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