O acesso aberto à luz dos Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia

AutorPaulo Roberto Cintra, Ariadne Chloe Furnival, Douglas Henrique Milanez
Páginas207-224
205
v. 22, n. 50, 2017.
p. 205-222
ISSN 1518-2924
Encontros Bibli: revista eletrônica de biblioteconomia e ciência da informação, v. 22, n.50, p.
205-222, set./dez., 2017. ISSN 1518-2924. DOI: 10.5007/1518-2924.2017v22n50p222
O acesso aberto à luz dos Estudos Sociais da
Ciência e Tecnologia
Open access from the perspective of the Social Studies of
Science and Technology
Paulo Roberto CINTRA (paulocntr@yahoo.com)*
Ariadne Chloe FURNIVAL (chloe@ufscar.br)**
Douglas Henrique MILANEZ (douglasmilanez@yahoo.com)***
* Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Política Científica e Tecnológica UNICAMP.
** Professora do Departamento de Ciência da Informação UFSCar.
*** Pesquisador do Departamento de Engenharia de Materiais UFSCar.
Resumo
O acesso aberto é um movimento em prol de uma literatura científica disponibilizada sem
custos aos usuários e livre de restrições para seu reuso. Este ensaio tem por objetivo refletir
sobre as mudanças trazidas pelo acesso aberto à comunicação científica à luz dos conceitos
propostos pelos teóricos do s Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia. Para tanto, o estudo se
baseou nos imperativos institucionais de Merton, nos conceitos de Bourdieu sobre capital
simbólico e nos argumentos de Latour acerca do arregimento de aliados. Co ncluiu-se que o
acesso aberto t em potencial para alterar as dispa ridades hierárquicas existentes entre os
pares, uma vez que possíveis ganhos em visi bilidade, legibilidade e acessibilidade dos artigos
disponibilizados em livre acesso, poderiam impactar positivamente na avaliação da
produção do pesquisador junto às agências de fom ento e instituições de ensino e, dessa
forma, elevar seu capital científico.
Palavras-chave: Ciência. C omunicação Científica. Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia.
Acesso Aberto. Periódico Científico. Sociologia.
Abstract
Open access is a movement in favor of a scientific literature available without costs to users
and free o f restrictions for its reuse. This essay aims to reflect the changes brought by open
access to scientific communication from the perspective of the concepts proposed by the
Social Studies of Science a nd Technology theorists. Therefore, the study was based on
Merton's institutional imperatives, Bourdieu's concepts of sym bolic capital, and Latour's
arguments about the recruitment of allies. It was concluded that open access has the
potential to change the hierarchical disparities among p eers, since possible gains in visibility,
readability and accessibility of freely available articles could positively impact the eva luation
of researcher's production within development agencies and Educational insti tutions and, in
this way, increase their scientific capital.
Keywords: Science. Scientific Communication. Social Studies of Science and Technology.
Open Access. Scientific Journal. Sociology.
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons.
ENSAIO
Recebido em:
07/02/2017
Aceito em:
04/07/2017
206
1 INTRODUÇÃO
Meadows (1999) afirma que a disseminação de informações é fundamental
para o avanço e progresso da ciência, pois é dessa maneira que os conhecimentos
gerados pelos cientistas podem ser avaliados, testados e certificados pelos pares,
com seus resultados podendo ser aprovados ou refutados. Assim, es forços
individuais de pesquisadores do passado e do presente são agregados a favor da
produção científica futura. Merton (1997), um dos precursores dos Estudos Sociais
da Ciência e Tecnologia, estabeleceu que um dos imperativos institucionais da
ciência deveria ser o comunismo. Isto é, devido a sua dependência em relação à
herança intelectual, todos os resultados científicos gerados devem ser comuns à
sociedade. Logo, uma pressão é gerada s obre o cientista para que este divulgue os
resultados de suas pesquisas, a fim de que as fronteiras do conhecimento possam
evoluir.
Nesse sentido, van Raan (2001) mostra que a troca de informações pode
ocorrer por meios formais e informais. A comunicação formal, por exemplo, se dá
através da divulgação escrita, regida por normas, como em artigos de periódicos
científicos e nos livros. Cristovão (1979) argumenta que e sse tipo de comunicação
oferece maior visibilidade, maior segurança quanto à recuperação da informação e
maior controle na qualidade, já que, idealmente, nesse modelo de publicação, os
trabalhos passam pelo crivo da revisão por pares. A comunicação informal, por sua
vez, acontece quando a transmissão da informação ocorre em espaços de
conversação, como conferências, eventos e seminários, além de contatos
interpessoais e particulares como telefonemas, conversas, e-mails, redes sociais e
visitas in loco (CRISTOVÃO, 1979). Para a autora, a s vantagens nesse tipo de
transferência de conhecimento são a maior atualização e agilidade no feedback
acerca dos resultados produzidos entre os pares. Cristovão (1979) contudo, lembra
que nesse tipo de comunicação não há uma avaliação prévia da informação, ou seja,
não existem filtros que permitam chegar ao indivíduo apenas o conhecimento
considerado de qualidade. Outrossim, a recuperação e armazenagem de tais
conversas são mais difíceis quando comparadas às da comunicação formal, visto
que, nesses casos, a informação é mutável e, portanto, passível de alterações em
curtíssimo es paço de tempo. Assim, a comunicação informal, mesmo que por
ventura seja armazenada, não fica disponível para ampla divulgação.
Por essa acepção, segundo Mueller (2006), o principal canal de comunicação
entre os pares são os periódicos, pois, além das características apontadas por
Cristovão (1979), ainda possibilitam confirmar autoria de uma descoberta científica.
Suber (2012), no entanto, observa a existência de diversas barreiras de acesso a esta
informação científica divulgada através dos periódicos, sobretudo pelo progressivo
aumento no custo de assinatura das principais revistas científicas, fato que
acarretou em um movimento em prol do acesso aberto. Termo advindo do i nglês
open access, o acesso aberto foi definido pela Iniciativa Budapeste para o Acesso
Aberto (Budapest Open Access Initiative), em 2002, como a disponibilização online de
artigos científicos em texto completo aos usuários interessados em seu conteúdo,
sem custos ou limitações de acesso, e sem restrições de direitos autorais ou de
licenciamento para seu re uso. A Budapest Open Access Initiative (2002) ainda
ratificou duas formas de se disponibilizar os arquivos em acesso aberto: i) pela via
verde green road), na qual os autores realizam o autoarquivamento de suas
pesquisas em repositórios institucionais e sites pessoais; e ii) pela via dourada
(gold road), em que as editoras dos periódicos asseguram o livre acesso às suas
publicações. Weitzel (2014) aponta também a existência de um modelo híbrido
pelo qual as revistas científicas de acesso fechado (ou seja, aquelas cujo acesso
ocorre através da subscrição do periódico) oferecem a opção aos autores de fazerem

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