Acórdão nº 0802194-02.2021.8.14.0013 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 01-04-2024
Data de Julgamento | 01 Abril 2024 |
Órgão | 1ª Turma de Direito Público |
Ano | 2024 |
Número do processo | 0802194-02.2021.8.14.0013 |
Classe processual | REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL |
Assunto | Obrigação de Fazer / Não Fazer |

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) - 0802194-02.2021.8.14.0013
JUIZO RECORRENTE: CISINANDO THALLIS QUEIROZ FERREIRA
REPRESENTANTE: DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DO PARA
RECORRIDO: MUNICIPIO DE CAPANEMA
RELATOR(A): Desembargadora CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO
EMENTA
REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. SERVIDOR MUNICIPAL. VIGIA. REMOÇÃO. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO IDÔNEA. INOBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO, DA AMPLA DEFESA E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. ILEGALIDADE. NULIDADE. RESTABELECIMENTO DA LOTAÇÃO ORIGINÁRIA. ABONO DE AUSÊNCIAS LANÇADAS IRREGULARMENTE. REMESSA NECESSÁRIA CONHECIDA E DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA.
1. Trata-se de Reexame Necessário de sentença na qual o município requerido foi condenado a promover a relotação do autor em seu antigo posto, bem como a abonar possíveis faltas lançadas indevidamente, em razão de remoção irregular.
2. Os documentos apresentados pelo município não são contemporâneos aos fatos narrados na peça vestibular, o que demonstra que o autor foi impedido de trabalhar em seu local habitual sem a existência de qualquer ato idôneo, devidamente motivado.
3. O princípio da motivação exige que a Administração Pública indique os elementos fáticos e jurídicos de suas decisões, de modo que qualquer cidadão tenha ciência de tais fundamentos e possa exercer o controle sobre eles. O ato administrativo não pode ter fundamentação genérica, pois deve indicar os elementos de fato que contribuíram concretamente para a sua edição, sob pena de nulidade.
4. Sem a demonstração clara e suficiente dos motivos (circunstâncias fáticas) que ensejaram determinado ato, o administrado fica impedido de exercer o contraditório e a ampla defesa de seus interesses, o que caracteriza intolerável transgressão à garantia do devido processo legal.
Outrossim, de acordo com a Teoria dos Motivos Determinantes, a veracidade do motivo condiciona a validade do ato. Se a alegada razão fática de um ato administrativo não for não for verdadeira, então esse ato é nulo e não produz qualquer efeito. Jurisprudência.
5. Remessa necessária conhecida e desprovida. Sentença confirmada.
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Excelentíssimos Desembargadores integrantes da 1ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, na 10ª Sessão Ordinária do seu Plenário Virtual, realizada no período de 1º/4/2024 a 8/4/2024, à unanimidade, em conhecer da remessa necessária e confirmar integralmente a sentença, nos termos da fundamentação.
Desembargadora CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO
Relatora
RELATÓRIO
PROCESSO Nº. 0802194-02.2021.8.14.0013
1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
REEXAME NECESSÁRIO
SENTENCIANTE: JUÍZO DA 1ª VARA CÍVEL E EMPRESARIAL DE CAPANEMA
SENTENCIADO / AUTOR: CISINANDO THALLIS QUEIROZ FERREIRA
SENTENCIADO / REQUERIDO: MUNICÍPIO E CAPANEMA
RELATORA: DESA. CÉLIA DE LIMA PINHEIRO
A EXMA. DESEMBARGADORA CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO (RELATORA):
Trata-se de Reexame Necessário de sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Capanema (ID 17245356), que julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, condenando o referido município “à obrigação de fazer consistente na imediata relotação do autor para seu antigo posto na Unidade de Saúde do Mata-Sede, e ainda abonar possíveis faltas lançadas em suas folhas de ponto nos meses de setembro e outubro de 2021, e nos meses vindouros, caso continue impedindo o autor de exercer sua função”.
Na inicial, o demandante relatou, em síntese, que:
a) É servidor público efetivo do Município de Capanema, exercendo o cargo de vigia, com lotação na Unidade Básica de Saúde da Vila Mata-Sede e carga horária de 40 horas semanais, em escala de 12x36 horas;
b) Exerce o cargo desde 6/5/2019 na referida unidade, entrando às 19:00 horas e saindo às 7:00 horas da manhã, quando começa o turno de outro funcionário;
c) No dia 20/9/2021, o aguardou o próximo vigia chegar até às 7:32 horas. Como o referido servidor não chegou, fechou a unidade e foi embora, pois cursa Engenharia Civil no período matutino, e suas aulas iniciam às 8:20 horas;
d) Os atrasos de outros vigias eram recorrentes e o autor acabava passando muitas vezes do horário, o que causava prejuízo à sua frequência no curso superior;
e) A Coordenadora da Unidade afirmou que providenciaria a advertência e a remoção do autor;
f) No dia 21/9/2021, foi trabalhar normalmente e, ao pedir as chaves da unidade para a enfermeira responsável, esta informou que não poderia entregá-las, pois o autor não pertenceria mais ao quadro de servidores daquele local, por ter sido removido;
g) Diante da ausência de comunicação formal por parte do setor de recursos humanos, em 1º/10/2021 foi até o Ministério Público, para relatar a situação e obter orientações. A promotora responsável encaminhou Ofício à Secretaria Municipal de Saúde, solicitando esclarecimentos, mas não obteve resposta;
h) Em 17/10/2021, registrou os fatos em Boletim de Ocorrência Policial. Em 18/10/2021, protocolou Ofício junto ao Departamento de Recursos Humanos do município, solicitando esclarecimentos sobre sua situação funcional. Entretando, não obteve qualquer resposta;
i) Em 19/10/2021, compareceu à Defensoria Pública, em busca da defesa de seus direitos. A Defensoria expediu Ofício à Procuradoria do município, solicitando informações sobre o caso, mas não obteve resposta.
j) Está sendo impedido de trabalhar na unidade onde era lotado e não foi informado em qual local deveria exercer suas atividades;
k) Sua remoção é nula, pois não possui a necessária motivação e foi realizada como uma forma de punição;
l) Está em estágio probatório e pode sofrer prejuízos, caso suas ausências, ocasionadas pelo município, não sejam abonadas.
Ao final, pleiteou: 1) a concessão de antecipação de tutela, para o restabelecimento de sua lotação e para determinar a disponibilização de suas folhas de ponto, referentes aos meses de setembro e outubro de 2021; 2) no mérito, a confirmação da tutela de urgência, e a condenação do município ao cumprimento de obrigação de fazer, consubstanciada na preservação da lotação originária do demandante, bem como no abono de possíveis faltas lançadas no período em que ficou impedido de exercer suas atividades.
A tutela de urgência foi parcialmente deferida, para restabelecer a lotação inicial do requerente, nos termos da decisão ID 17245342.
O município de Capanema apresentou contestação por meio da petição ID 17245348, alegando, em síntese, que:
1) O autor fora removido do seu local de origem de trabalho com a motivação necessária, comunicada por meio de memorando, informando sobre a necessidade de se indicar um vigia para a equipe da UPA – Capanema, para trabalhar em jornada de 12x36 (documento anexo) em virtude do desfalque da equipe de vigias daquela importante unidade;
2) O demandante se recusou a assinar o memorando;
3) Exerceu regularmente seu poder discricionário, realizando a remoção do autor por necessidade do serviço;
4) Os postos de saúde foram gradeados, com o objetivo de disponibilizar vigias para outros locais com maior necessidade.
Após a apresentação da réplica, o Juízo de origem realizou o julgamento antecipado do mérito, julgando procedentes os pedidos formulados na peça vestibular, nos termos da sentença ID 17245356. Não houve a interposição de recurso por parte do ente federativo, conforme consignado na certidão ID 17245358.
Instado a se manifestar, o Ministério Público opinou pela confirmação da sentença (ID 17343158).
É o relatório.
VOTO
A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO (RELATORA):
I. Juízo de Admissibilidade. Reexame necessário e recurso de apelação.
Nos termos do art. 496, caput e inciso I, do CPC, “está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença: I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público”.
A sentença recorrida é ilíquida, pois estabelece uma obrigação de fazer. O município demandado não apresentou recurso voluntário. Nos termos do § 3º do art. 496 do CPC, a remessa necessária não pode ser dispensada quando a sentença for ilíquida. Revela-se imprescindível, portanto, o reexame da sentença, como condição de sua eficácia.
II. Reexame Necessário. Mérito.
Na inicial, o demandante alega, em resumo, a nulidade de sua remoção e requer o restabelecimento de sua lotação originária, bem como o abono das eventuais ausências relativas ao período em que foi impedido de trabalhar na Unidade Básica de Saúde da Vila Mata-Sede.
A sentença examinada possui o seguinte dispositivo:
“(...)
3.DISPOSITIVO
Ante o escorço fático e jurídico, julgo procedente o pedido inicial para condenar o MUNICÍPIO DE CAPANEMA à obrigação de fazer consistente na imediata relotação do autor para seu antigo posto na Unidade de Saúde do Mata-Sede, e ainda abonar possíveis faltas lançadas em suas folhas de ponto nos meses de setembro e outubro de 2021, e nos meses vindouros, caso continue impedindo o autor de exercer sua função.
Arbitro multa de R$ 200,00 (duzentos reais) por dia de descumprimento, limitados a R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Confirmo a tutela antecipada de urgência concedida no Id Num 63688137.
Extingo o processo com resolução do mérito nos termos do art.487, I do CPC.
Isentos de custas, na forma do art. 40, II, da Lei 8.583/17.
Condeno o ente público ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), considerando o grau de complexidade da causa.
Após o prazo recursal, não havendo recurso voluntário, remeta-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará, por força do duplo grau obrigatório, nos termos do art.496 do CPC.
Expeça-se o necessário.
Servirá a presente, por cópia digitada, como mandado/ofício, nos termos do Provimento nº 003/2009-CJRMB e alterações posteriores.
P.R.I.C.”. (Grifo nosso).
Os...
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