Acórdão Nº 0900011-87.2014.8.24.0060 do Sexta Câmara de Direito Civil, 18-02-2020

Número do processo0900011-87.2014.8.24.0060
Data18 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemSão Domingos
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0900011-87.2014.8.24.0060, de São Domingos

Relator: Desembargador André Luiz Dacol

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SERVIÇO DE TELEFONIA RURAL (RURALCEL). SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA, ESTABELECENDO OBRIGAÇÃO DE FAZER À RÉ, BEM COMO CONDENANDO-A AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO PELOS DANOS CAUSADOS AOS CONSUMIDORES, A SEREM APURADOS EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. RECURSO DA DEMANDADA.

PRELIMINARES. I) ILEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. INSUBSISTÊNCIA. MÁ PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE TELEFONIA QUE ATINGE UNIVERSALIDADE DE CONSUMIDORES DE ÁREA RURAL, CARACTERIZANDO INTERESSE INDIVIDUAL HOMOGÊNEO, COM RELEVANTE EXPRESSÃO SOCIAL. NESSE SENTIDO, PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE. II) PERDA SUPERVENIENTE DE OBJETO. REJEIÇÃO. MODIFICAÇÃO DA SITUAÇÃO DE ALGUNS CONSUMIDORES QUE NÃO INVIABILIZA ANÁLISE DA DEMANDA.

MÉRITO. I) CULPA EXCLUSIVA DA EMPRESA TIM S/A, QUE FORNECIA INFRAESTRUTURA À RÉ OI S/A PARA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO DE TELEFONIA. ARGUMENTO AFASTADO. RELAÇÃO JURÍDICA EXISTENTE ENTRE CONSUMIDORES E A RECORRENTE. CONTRATO ENTRE A RÉ E TIM S/A QUE NÃO EXIME A PRIMEIRA DE PRESTAR SERVIÇO DE QUALIDADE. DEMANDADA QUE É CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO TELEFÔNICO FIXO COMUTADO (STFC), RESPONDENDO PERANTE CONSUMIDORES E ANATEL PELA ATIVIDADE REALIZADA. II) INEXISTÊNCIA DE DANO INDENIZÁVEL. TESE RECHAÇADA. ALEGAÇÃO NA EXORDIAL E COMPROVAÇÃO NOS AUTOS DE QUE O SERVIÇO FOI PRESTADO DE FORMA DEFICIENTE POR ANOS NA COMUNIDADE DE LINHA MANFROI, EM SÃO DOMINGOS/SC. PERÍODOS DE SEMANAS SEM SINAL TELEFÔNICO, SENDO QUE O PAGAMENTO PELOS CONSUMIDORES DAVA-SE DE MODO CONTÍNUO. DEVER DE INDENIZAR QUE SE MANTÉM, FICANDO O QUANTUM PARA SER APURADO NA FASE DE LIQUIDAÇÃO. III) AFASTAMENTO, MINORAÇÃO OU LIMITAÇÃO DAS ASTREINTES. PARCIAL ACOLHIMENTO, SOMENTE QUANTO À DEFINIÇÃO DE TETO. MULTA DIÁRIA FIXADA POR DECISÃO LIMINAR, CONFIRMADA PELA SENTENÇA, PARA COMPELIR A RÉ A RESTABELECER SERVIÇO TELEFÔNICO DE QUALIDADE NA REGIÃO. VALOR DIÁRIO FIXADO (R$1.000,00) QUE SE MOSTRA ADEQUADO AO CASO CONCRETO. TODAVIA, NECESSIDADE DE FIXAÇÃO DE LIMITE MÁXIMO COM BASE NA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. ASSIM, PARCIAL PROVIMENTO QUANTO AO PONTO.

ÔNUS SUCUMBENCIAIS MANTIDOS. INVIABILIDADE DA FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS.

RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0900011-87.2014.8.24.0060, da comarca de São Domingos Vara Única em que é Apelante Oi S/A e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina e outros.

A Sexta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, a fim de fixar limite máximo de R$100.000,00 para as astreintes.

Presidiu o julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Des. André Carvalho, com voto, e dele participou a Exma. Sra. Desa. Bettina Maria Maresch de Moura.

Funcionou como representante do Ministério Publico o Exmo. Sr. Dr. Murilo Casemiro Mattos.

Florianópolis, 18 de fevereiro de 2020.

Desembargador André Luiz Dacol

Relator


RELATÓRIO

Em atenção aos princípios da celeridade e economia processuais, adota-se o relatório da sentença, transcrito na íntegra, por refletir com fidelidade o trâmite processual na origem:

O representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina ajuizou ação civil pública com pedidos de obrigação de fazer e de indenização em face de OI S/A, qualificada na inicial, narrando, em suma, que a requerida não presta a contento o serviço de telefonia na Linha Manfroi, Zona Rural, Município de São Domingos, o que prejudica os consumidores que lá residem e necessitam dos serviços.

Requereu a antecipação dos efeitos da tutela a fim de que a requerida restabelecesse o sinal de telefonia de qualidade para todos os consumidores rurais respectivos e, ao final, a confirmação da medida, condenando-a ao pagamento de indenização às pessoas atingidas e ao fundo de reconstituição de bens lesados.

Acostou documentos.

Deferiu-se a antecipação dos efeitos da tutela e a inversão dos ônus da prova, e determinou-se a publicação de editais, nos termos do artigo 94 do CDC (fls. 149-156).

Afixado edital para citação dos interessados a intervir no feito (fl. 165).

A requerida interpôs agravo de instrumento (fls. 175-230), ao qual foi negado seguimento (fls. 754-1024).

Citada, contestou tecendo comentários acerca da implementação do serviço de telefonia rural Ruralcel; a ilegitimidade ativa do Ministério Público; a falta de interesse de agir; a necessidade de incluir a Tim Celular S/A no polo passivo. No mérito, afirmou inexistir comprovação da má prestação dos serviços; ser incabível acumulação dos pedidos cominatório e indenizatório; e a impossibilidade de condenação por dano hipotético. Juntou documentos.

Houve réplica (fls. 352-373).

Decisão afastando as matérias preliminares e indeferindo o chamamento ao processo da empresa TIM S/A e a revogação da decisão que deferiu a antecipação da tutela (fls. 374-378).

Intimados, o Ministério Público requereu a designação da audiência para oitiva de testemunhas e a requerida pleiteou a realização de perícia técnica (fls. 389-391), o que foi deferido (fls. 435-437).

A requerida, novamente, interpôs agravo de instrumento (fls. 392-432), ao qual foi negado o efeito suspensivo (fls. 433/434).

Durante a audiência foram ouvidas quatro testemunhas arroladas pelo Ministério Público e uma pela requerida, em mais de um ato em razão da precatória distribuída (fls. 494/495 e 1030/131).

Manifestação da requerida acerca dos linhas ativas e canceladas (fls. 503-505), acompanhada de documentos (fls. 506-507).

Laudo pericial (fls. 633-679 e 736-740) e manifestação das partes a respeito (fls. 733-735 e 745-748).

O Ministério Público manifestou-se pelo bloqueio, via Bacen Jud, de numerários existentes na conta bancária da requerida em razão do descumprimento da ordem judicial (fls. 745-748).

Encerrada a instrução, as partes apresentaram as derradeiras alegações (fls. 1038-1043 e 1063-1079)

É o relatório.

Sobreveio sentença (fls. 1083-1096), a qual julgou a lide nos seguintes termos:

Diante do exposto, com resolução de mérito (CPC, art. 487, I, c/c art. 490), julgo parcialmente procedente a pretensão inicial formulada pelo Ministério Público de Santa Catarina em fase de OI S/A para:

a) confirmar a decisão de fls. 149-156 e, assim, DETERMINAR que a requerida restabeleça, em definitivo, o sinal de telefonia de qualidade para todos os consumidores rurais residentes na Linha Manfroi, interior de São Domingos, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 em favor do Fundo de Reconstituição de Bens Lesados;

b) CONDENAR a ré ao pagamento de indenização pelos danos causados aos consumidores dos serviços de telefonia fixa rural prestados aos consumidores acima mencionados, cujo montante dos prejuízos sofridos deverá ser, individualmente, apurado em sede de liquidação de sentença, nos termos do disposto no artigo 95 e 97 da Lei n.º 8.078/90;

c) REJEITAR os pedidos de fixação, desde já, dos danos individuais e de indenização por danos morais coletivos, nos termos da fundamentação.

Pela sucumbência recíproca em desigual proporção, que considero seja de 80% em desfavor da requerida, condeno-a ao pagamento das despesas e custas processuais, a teor do art. 82 e seguintes do CPC, cuja cobrança deverá permanecer suspensa enquanto perdurar a decisão proferida nos autos 0203711-65.2016.8.19.0001, em trâmite no Poder Judiciário do Estado de Rio de Janeiro.

O Ministério Público, embora sucumbente em parte, é isento do pagamento das custas e despesas processuais, nos termos do Regimento de Custas do Estado.

Inviável a condenação da ré na verba honorária.

Indefiro o pedido de bloqueio judicial, por meio do sistema BacenJud, da verba relativa à multa cominatória.

Comunique-se o digno Desembargador relator do Agravo de instrumento n. 2015.041508-7 acerca da presente decisão.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Transitada em julgado e satisfeitas as formalidades legais, arquivem-se, procedidas às anotações e baixa de estilo.

A ré apelou.

Em suas razões, preliminarmente, sustentou a ilegitimidade do Ministério Público para propor ação civil pública em proteção de grupo isolado de pessoas. Acrescentou, no ponto, haver apenas três consumidores do serviço "ruralcel" na Linha Manfroi, em São Domingos/SC, descaracterizando a utilidade da demanda coletiva. Igualmente, asseverou haver perda superveniente de objeto, porquanto as linhas ainda ativas já foram migradas para a nova tecnologia (satélite), sem nenhum ônus aos clientes, devendo o juiz aplicar o art. 493 do CPC.

No mérito, em síntese, arrazoou: (1) tratar-se de responsabilidade exclusiva da Tim Celular S/A pela falha na prestação do serviço "ruralcel", proprietária da rede de transmissão de sinal analógica que auxiliava a prestação dos serviços fornecidos pela Oi S/A, aplicando-se o art. 14, §3º, II, do CDC; (2) não haver demonstração de dano concreto e efetivo a direitos de personalidade em relação aos usuários, impedindo a condenação por danos morais; (3) o afastamento das astreintes, fixadas em R$ 1.000,00 por dia, ou sua minoração e limitação a determinado patamar máximo, conforme juízo de proporcionalidade e razoabilidade.

Concluiu requerendo: a) o acolhimento da preliminar de ilegitimidade ativa ad causam; b) o reconhecimento de perda superveniente do objeto; c) a improcedência do pedido de condenação da apelante; d) a improcedência do pedido de condenação em multa diária, ou sua minoração e fixação de teto; e) a inversão do ônus de sucumbência.

Contrarrazões foram apresentadas às fls. 1136-1151.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Alexandre Herculano Abreu (fls. 1157-1168).

Às fls. 1174-1178, o Exmo. Sr. Des. Carlos Adilson Silva declinou da competência para uma das Câmaras de Direito Civil.

Sobreveio informação da apelante que haveria apenas uma linha telefônica em...

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