Acórdão nº 50003369620168210130 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Criminal, 19-04-2022
Data de Julgamento | 19 Abril 2022 |
Órgão | Sexta Câmara Criminal |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50003369620168210130 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20001961540
6ª Câmara Criminal
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Criminal Nº 5000336-96.2016.8.21.0130/RS
TIPO DE AÇÃO: Furto (art. 155)
RELATOR: Desembargador JOSE RICARDO COUTINHO SILVA
APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA
APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA
RELATÓRIO
O Ministério Público ofereceu denúncia contra DANIEL LUÍS BRITES, com 33 anos de idade à época do fato, dando-o como incurso nas sanções do artigo 155, §§ 1º e 4º, inciso I, do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso:
“No dia 13 de novembro de 2015, por volta das 02h00min, próximo ao escritório Elenira Bolzan, o denunciado DANIEL LUIS BRITES, durante repouso noturno, mediante rompimento de obstáculo, subtraiu para si coisa alheia móvel, qual seja, 01 (um) pneu estepe de caminhonete D20, avaliado em R$ 400,00 (quatrocentos reais), conforme Auto de Avaliação Indireta da fl. 11, pertencente a vítima VALDIOCIR LUIZ BOLZAN.
Na ocasião, o denunciado entrou na garagem onde se encontrava a camionete e, usando de um pedaço de serra, cortou o "engate" de proteção do pneu com o cadeado, para furar o pneu estepe de sua camionete."
A denúncia foi recebida em 17.04.2017 (Evento 3, doc. PROCJUDIC1, fl. 28, dos autos originários).
Citado (Evento 3, doc. PROCJUDIC1, fls. 34/37, dos autos originários), o acusado apresentou resposta escrita à acusação através da Defensoria Pública (Evento 3, doc. PROCJUDIC1, fls. 40/42, dos autos originários).
Durante a instrução, foi ouvida uma testemunha e interrogado o réu (Evento 3, doc. PROCJUDIC2, fls. 19/21, dos autos originários).
Convertido o debate oral em memoriais, foram esses apresentados no evento 3, doc. PROCJUDIC2, fls. 32/40 e 42/50, com continuação no doc. PROCJUDIC3, fls. 01/05, dos autos originários).
Sobreveio sentença, considerada publicada em 22.07.2019 (Evento 3, doc. PROCJUDIC3, fl. 17, dos autos originários), julgando parcialmente procedente a ação penal para condenar o réu como incurso nas sanções do artigo 155, § 1º, do Código Penal, às penas de 02 anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 15 dias-multa, à razão mínima (Evento 3, doc. PROCJUDIC3, fls. 07/16, dos autos originários).
Irresignada, a defesa interpôs apelação suscitando, preliminarmente, a nulidade do auto de avaliação, eis que realizado de forma indireta e por pessoas inabilitadas. Arguiu, ainda, a atipicidade da conduta em virtude da incidência do princípio da insignificância. No mérito, alegou insuficiência probatória quanto à autoria delitiva, resumindo-se à confissão do acusado na fase policial e à palavra de testemunha que não presenciou a subtração. Salientou que as imagens do agente criminoso captadas pelas câmeras de seguranças não são nítidas, o que torna duvidoso o reconhecimento realizado pela testemunha com base nelas. Requereu, diante disso, a absolvição do acusado. Subsidiariamente, postulou o afastamento da majorante do repouso noturno, por não haver demonstração de que houvesse alguém repousando por ocasião da subtração; e o reconhecimento da atenuante genérica (art. 66 do CP). Quanto às penas, pugnou o redimensionamento da pena-base ao mínimo legal, com o afastamento da nota negativa dada aos antecedentes, eis que já punido o agente nos feitos respectivos; o afastamento da reincidência, diante da sua inconstitucionalidade; e a isenção da pena de multa, diante da hipossuficiência do condenado. Por fim, prequestinou os dispositivos invocados no recurso (Evento 3, doc. PROCJUDIC3, fls. 28/50, dos autos originários).
O Ministério Público apresentou contrarrazões (Evento 3, doc. PROCJUDIC4, fls. 02/19, dos autos originários).
Em parecer, a Procuradoria de Justiça opinou pelo improvimento do apelo (Evento 7 destes autos).
Esta Câmara adotou o procedimento informatizado e foi observado o artigo 613, inciso I, do Código de Processo Penal.
É o relatório.
VOTO
Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Inicialmente, no tocante às preliminares de nulidade do auto de avaliação e de atipicidade da conduta, deixo de examiná-las, eis que restarão prejudicadas, como se verá, pela apreciação do mérito do apelo favorável ao réu.
No mérito, materialidade e a autoria delitivas foram, assim, analisadas pelo ilustre Juiz de Direito, Dr. Francisco Schuh Beck, ao proferir a sentença (Evento 3, doc. PROCJUDIC3, fls. 07/16, dos autos originários):
"(...)
MÉRITO:
O feito está estreme de vícios e ilegalidades formais. Arredada a preliminar, passo à análise do mérito.
Da Existência do Fato:
A existência do fato delituoso descrito na inicial acusatória (materialidade) resta demonstrada por meio do Boletim de Ocorrência (fl. 03), Auto de reconhecimento (fl. 05), Auto de avaliação indireta (fl. 11) e, principalmente, pelos depoimentos colhidos na fase policial e em juízo.
Da Autoria:
A autoria também está esclarecida VANDERLEI GONÇALVES AIRES, Policial Militar, disse que lembra das imagens de segurança do local que filmaram o réu subtraindo o material. Não recorda da abordagem, tampouco se foi restituída a res furtiva (mídia fl. 49).
Ao ser interrogado, DANIEL LUÍS BRITES usou do direito ao silêncio (mídia da fl. 49).
Compulsando o material probatório construído no feito, em que pese o silêncio do réu em sede judicial, considerando o depoimento da testemunha em juízo, aliado ao auto de reconhecimento das fls. 05-07 e, sobretudo, a confissão do réu em sede policial, tenho que não há dúvida quanto à autoria dos fatos em face do acusado
Da Adequação Típica:
Uma vez delimitado o contexto fático que constitui substrato para a lide acusatória, cumpre analisar a adequação de tal fato.
O art. 155, caput, do CP criminaliza a conduta de subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel.
Por outro lado, o §4º do art. 155 do CP expressa que o furto não será simples, mas sim qualificado quando, dentre outras hipóteses, for cometido com rompimento de obstáculo, com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza e em concurso de pessoas (inciso I, II e IV).
No caso, todavia, há dúvida razoável acerca do rompimento do obstáculo por parte do réu. Isso porque, não há laudo, tampouco evidência inequívoca do rompimento de obstáculo para o sucesso da empreitada criminosa.
Nesse sentido, considerando a ausência de elementos inequívocos acerca do rompimento de obstáculo para o sucesso da subtração, mostra-se inviável o acolhimento da qualificadora exposta na exordial.
A Defesa invoca o princípio da insignificância, a fim de afastar a tipicidade material da conduta. Sem razão, contudo.
Para a incidência do princípio da insignificância, necessário também o analisar das condições subjetivas do agente.
O réu é reincidente em crimes patrimoniais.
Essas circunstâncias pessoais, a meu ver, não autorizam seja considerada insignificante a conduta, sob pena de se relegar impunível a criminalidade, que embora de menor gravidade, mostra-se reiterada.
Não é outra a dicção do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
APELAÇÃO-CRIME. FURTOS SIMPLES. CONTINUIDADE DELITIVA. 1. ÉDITO CONDENATÓRIO. MANUTENÇÃO. Prova amplamente incriminatória. Relatos da vítima que confirmou a presença do acusado no local dos fatos nas datas das rapinas, reconhecendo-o como seu autor, o que vem corroborado pelas imagens das câmeras de segurança que flagraram o réu subtraindo a res. Denunciado que confessou a prática dos ilícitos. Prova segura à condenação, que vai mantida. 2. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. Para o reconhecimento do princípio da insignificância, que vem sendo admitido pela doutrina e jurisprudência como causa de exclusão da tipicidade, sob o ponto de vista material da conduta, vários fatores devem concorrer, não bastando apenas que o objeto do crime seja de valor irrisório, mas deve-se levar em consideração o impacto que a conduta vier a gerar no patrimônio da vítima, bem como as condições subjetivas do beneficiário e a gravidade do delito em si. Hipótese na qual o valor da res furtivae, avaliada, no total considerando que se trata de furto continuado , em R$ 198,00, que representava cerca de 22% do valor do salário mínimo da época, que era de R$ 880,00, não podendo ser considerado irrisório. Condições subjetivas do imputado que não recomendam o reconhecimento da bagatela, já que registra 1 condenação definitiva e 3 provisórias. Lesividade da conduta afirmada. Tipicidade formal e material. [...] (Apelação Crime Nº 70076089135, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fabianne Breton Baisch, Julgado em 25/07/2018)
Das Agravantes e Atenuantes:
Não reconheço possibilidade de incidência da chamada coculpabilidade como atenuante genérica.
Eis o fardo da liberdade: os atos individuais, livres e conscientes, devem ser imputados a quem os pratica. “Sociedade” e “Estado” não são entes morais e não possuem vontade, portanto não são culpáveis. Somente pode ter culpa o homem, ser moral que é, dotado de inteligência e vontade. Admitir o contrário é obscurantismo irracional, amparado em opções ideológicas.
A jurisprudência nacional amplamente rechaça tal construção ideológica.
APELAÇÃO...
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