Acórdão nº 50044413520198210026 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 23-03-2022

Data de Julgamento23 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50044413520198210026
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001458890
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5004441-35.2019.8.21.0026/RS

TIPO DE AÇÃO: Tráfico de Drogas e Condutas Afins

RELATOR: Desembargador CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

ISAÍAS G.C. interpõe agravo interno contra a decisão monocrática que negou provimento ao apelo manejado pelo ora recorrente, nos autos da "representação" levada a efeito pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, em razão da prática de ato infracional equiparado ao crime de tráfico de drogas, descrito no art. 33, caput, da Lei 11.343/06.

Em suas razões recursais (evento 19), o recorrente suscita preliminar de nulidade da decisão agravada, na medida em que o presente caso não se enquadraria em qualquer das hipóteses em que o CPC autoriza o julgamento da forma como realizado. Fazendo referência as disposições dos arts. 932 e art. 1011, I, ambos do CPC, deixa claro que, neste feito, houve descumprimento do Princípio da Colegialidade. Assim, requer o acolhimento da prefacial, devendo o apelo interposto ser submetido ao órgão colegiado.

No mérito, o agravante sustenta não haver provas mínimas a sustentar o juízo de condenação, já que apenas o que se tem nos autos é a mera palavra dos policiais que atuaram na ocorrência. Salienta que, in casu, o Ministério Público não se desincumbiu a contento do ônus de provar a autoria e materialidade do ato infracional (art. 156 do CPP), não tendo havido demonstração da prática de traficância por parte do adolescente Isaías, o que impõe o reconhecimento da improcedência da presente representação, forte no art. 189, IV, do ECA.

Tece considerações mais sobre os princípios da presunção da inocência; in dubio pro reo; princípios da intervenção mínima e da brevidade, atualidade e necessidade (estes últimos expostos no artigo 35, incisos II, V a VII, da Lei nº. 12.594/2012, e no artigo 100, § único, incisos I, II, VI a VIII, do Estatuto da Criança e do Adolescente), bem como sobre a necessidade de que estes princípios benéficos aplicados aos réus no procedimento criminal comum, também sejam admitidos, quando for o caso, aos adolescentes sujeitos ao procedimento especial da Infância e da Juventude.

Ao ressaltar, por fim, que a decisão guerreada viola o princípio da intervenção precoce, postula pela sua reforma, a resultar do juízo de improcedência da presente representação.

Foram apresentadas as contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

Primeiramente, afasto a prefacial suscitada, uma vez que, tratando-se de recurso manifestamente improcedente, conforme constou da decisão ora objeto de agravo, amparada, dentre outros fundamentos, em jurisprudência sobre a matéria, cabível o julgamento singular.

Foi clara a intenção do legislador, possibilitando ao Relator a realização de julgamento singular nas hipóteses de recurso manifestamente improcedente, sendo perfeitamente cabível o enfrentamento do mérito recursal em decisão monocrática, não havendo falar em ofensa a princípios constitucionais, já que inexistente previsão legal no sentido de que somente o órgão colegiado, no caso, a Câmara, poderia julgar o recurso.

Ao contrário, os arts. 932, VIII, do CPC e 206, XXXVI, do RITJRS permitem o julgamento monocrático.

Em face disto, estava plenamente autorizado o julgamento singular, inclusive em matéria de fato.

Oportuno lembrar que o julgamento monocrático em determinado tema foi instituído para desobstruir as pautas dos Tribunais, a fim de que fosse prestada uma jurisdição mais célere.

Ademais, a jurisprudência tem entendido que há possibilidade de julgamento monocrático pelo Relator quando a decisão é equivalente à que seria prestada pelo Colegiado/Câmara, inexistindo qualquer prejuízo porque há possibilidade de interposição de agravo interno da decisão do Relator, visando modificá-la no órgão fracionário.

Neste sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE. DECRETAÇÃO DE REVELIA. INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO. PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO NÃO INTERROMPE O PRAZO. DECISÃO MONOCRÁTICA. 1. Considerando a existência de orientação jurisprudencial dominante nesta Corte sobre o tema, mostra-se possível o julgamento monocrático. (...) AGRAVO DE INSTRUMENTO NÃO CONHECIDO. (Agravo de Instrumento, Nº 70084058916, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eliziana da Silveira Perez, Julgado em: 20-03-2020)

APELAÇÃO CÍVEL. MUNICÍPIO DE SANTA ROSA. CANCELAMENTO DE DISTRIBUIÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL. ALEGAÇÃO DE O EXEQUENTE OBJETIVAR FUGIR DE FUTURA IMPLANTAÇÃO DO SISTEMA EPROC DE AUTOS ELETRÔNICOS. DECISÃO MANIFESTAMENTE ILEGAL. REFORMA. DECISÃO MONOCRÁTICA. 1. CABIMENTO DA APELAÇÃO (...) 3. JULGAMENTO MONOCRÁTICO Não é empecilho de julgamento monocrático o fato de eventualmente a hipótese não se encaixar como luva nas fôrmas do art. 932, do CPC, pois existem as hipóteses implícitas de provimento e de desprovimento, dentre elas a decisão manifestamente ilegal. 4. DISPOSITIVO Nesses termos, provejo de plano. (Apelação Cível, Nº 70083658443, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Irineu Mariani, Julgado em: 23-01-2020)

AGRAVO INTERNO. (...) 1. A decisão monocrática está autorizada pelo verbete nº 568 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, assim como pela regra do art. 206, XXXVI, do RITJRS. Ademais, a apresentação do agravo interno em mesa supre qualquer defeito na decisão monocrática, nos termos da tese firmada no Tema nº 194 dos julgamentos repetitivos do Superior Tribunal de Justiça. (...) AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. (Agravo, Nº 70080644081, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nelson Antônio Monteiro Pacheco, Julgado em: 30-05-2019)

Desta forma, no ponto, a insurgência não encontra amparo.

Quanto ao mérito, o presente agravo interno não merece acolhimento, tendo em vista a sua manifesta improcedência, que autorizou o julgamento singular.

Quando do julgamento monocrático, proferi a decisão que segue reproduzida como parte das razões de decidir, observado o objeto do presente recurso:

"Efetuo o julgamento na forma monocrática, forte no art. 206, XXXVI, do RITJRS, combinado com o art. 932, VIII, do CPC, observada a orientação jurisprudencial no âmbito deste Tribunal de Justiça e no STJ.

A apelação interposta não merece acolhimento.

Em primeiro lugar, afasto a preliminar suscitada.

Não há falar em ofensa ao Princípio da Intervenção Precoce, em que pese o transcurso de tempo entre a data do fato, ocorrido em 19/07/2019, e a sentença, prolatada em 13 de agosto de 2021.

Ora, o artigo 121, §5º, do ECA, dispõe que as medidas socioeducativas se aplicam até os 21 anos de idade do infrator, não existindo previsão legal acerca da suposta perda de interesse correspondente.

Nesse sentido, aliás, colho o ensejo para transcrever o seguinte precedente:

APELAÇÃO. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO A ESTUPRO DE VULNERÁVEL (ART. 217-A DO CP) E AMEAÇA (ART. 147, CAPUT, CP) 1. RECURSO DEFENSIVO. PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO PRECOCE. INAPLICABILIDADE. Ainda que transcorrido lapso temporal razoável entre as datas da prática do fato e a da aplicação da medida, o processo observou os ditames legais, oportunizando o exercício da ampla defesa, sendo inevitável a efetiva responsabilização dos adolescentes pela prática de ato considerado ilícito, aplicando-lhe medida com efeitos ressocializadores. PROVA SUFICIENTE DA AUTORIA E MATERIALIDADE DOS TRÊS FATOS CONTIDOS NA REPRESENTAÇÃO. Prova farta que evidencia a responsabilidade dos adolescentes pelos fatos graves, perpetrados contra o irmão de um deles, menino com 07 anos de idade, o qual relatou de forma coerente, apesar da tenra idade, os abusos sexuais e ameaças a que foi subjugado pelo irmão e o amigo dele. Palavra da vítima confortada por testemunhas e prova pericial. Inexistência de dúvida da prática dos fatos, sendo imperativa a procedência da representação. 2. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PEDIDO DE APLICAÇÃO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE SEMILIBERDADE PARA UM DOS ADOLESCENTES E MAIOR PRAZO DA PSC, PARA OUTRO. CABIMENTO, NO CASO CONCRETO. Tendo em vista os parâmetros postos pelo o artigo 112, § 1º, do ECA e artigo 35 da lei 12.594/12, no sentido de que a medida socioeducativa deve levar em conta a idade, capacidade do adolescente, as circunstâncias e a gravidade da infração, afigura-se adequada e proporcional a medida socioeducativa de semiliberdade para o irmão do ofendido e maior prazo na PSC do outro adolescente. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PROVIDA E APELAÇÃO DEFENSIVA DESPROVIDA.(Apelação Cível, Nº 70083293084, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Afif Jorge Simões Neto, Julgado em: 20-05-2020)

Destarte, superada a preliminar, passo à análise do mérito do recurso.

Com efeito, de acordo com o art. 103 do Estatuto da Criança e do Adolescente, “ato infracional é a conduta prevista na lei penal como crime ou contravenção penal, que respeita ao princípio da reserva legal, e representa ‘pressuposto do acionamento do Sistema de Justiça da Infância e da Juventude’. (...) a estrutura do ato infracional segue a do delito, sendo um fato típico e antijurídico, cuja estrutura pode ser assim apresentada: a) conduta dolosa ou culposa, praticado por uma criança ou adolescente; b) resultado; c) nexo de causalidade; d) tipicidade (adotando, o Estatuto, a tipicidade delegada, tomando-se ‘emprestada’ da legislação ordinária, a definição das condutas ilícitas); e) inexistência de causa de exclusão da antijuridicidade. (...) O adolescente, portanto, somente responderá pelo seu ato se demonstrada a ocorrência de conduta típica, antijurídica e culpável.”, conforme Luciano Alves Rossato, Paulo Eduardo Lépore e Rogério Sanches da Cunha em Estatuto da Criança...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT