Adjudicação

AutorHumberto theodoro júnior
Ocupação do Autordesembargador aposentado do tribunal de justiça de minas gerais. professor titular aposentado da faculdade de direito da ufmg. doutor em direito
Páginas501-516

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310. Introdução

Com a sistemática implantada pela Lei nº 11.382/2006, à época do CPC/1379, e mantida pelo NCPC, a alienação em hasta pública deixou de ser a meta normal ou preferencial da expropriação na execução por quantia certa. Antes de chegar a tal modalidade expropriatória, o art. 825, I, do NCPC prioriza a adjudicação dos bens penhorados em favor do exequente ou de outras pessoas previstas no art. 876, § 5º. Antes de chegar ao leilão, há ainda a permissão ao exequente para optar pela alienação por iniciativa particular (art. 880, caput). Somente depois de inviabilizadas essas duas primeiras modalidades de expropriação é que se passará a cogitar da alienação em leilão judicial, como se depreende do citado art. 880.

Uma vez, portanto, superadas as eventuais questões em torno da penhora e da avaliação (reduções, ampliações e substituições), o juiz dará início aos atos de expropriação de bens (art. 875).1Tais atos poderão ser o deferimento da adjudicação, se requerida por algum interessado, ou, à sua falta, a autorização para início da alienação por iniciativa particular. Do leilão judicial só se cogitará mais tarde, se não houver manifestação de interessado pelas formas preferenciais de expropriação elencadas no art. 881.2

311. Conceito de adjudicação

A adjudicação é uma figura assemelhada à dação em pagamento, uma forma indireta de satisfação do crédito do exequente, que se realiza pela transferência do próprio bem penhorado ao credor, para extinção de seu direito.3

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Em lugar da soma de dinheiro, que é objeto específico da execução por quantia certa, na adjudicação o credor recebe bens outros do executado, numa operação, porém, que nada tem de contratual, pois participa da mesma natureza da arrematação, como ato executivo ou de transferência forçada de bens, sob a forma de expropriação. Conceitua-se, portanto, a adjudicação como ato de expropriação executiva em que o bem penhorado se transfere in natura para o credor, fora da arrematação. Há situações especiais em que se admite a terceiros, além do exequente, a faculdade de obter a adjudicação, também sem o pressuposto da concorrência em hasta pública (NCPC, art. 876, § 5º).4Quando o adjudicante é o exequente, a medida pressupõe requerimento de sua parte, não obstante seja a forma preferencial de expropriação na execução por quantia certa. É que tendo o direito de se pagar em dinheiro, não pode ser compelido, contra sua vontade, a receber coisa diversa para solução de seu crédito.

A adjudicação dos bens penhorados, repita-se, transformou-se, com a reforma da Lei nº 11.382/2006, na forma preferencial de satisfação do direito do credor na execução de obrigação por quantia certa, regime mantido pelo NCPC (arts. 825, I e 881, caput).5As tradicionais modalidades de apuração de numerário por meio de alienação judicial tornaram-se secundárias. A execução tende, em primeiro lugar, a propiciar ao exequente a apropriação direta dos bens constritos, em pagamento de seu crédito. Ao mesmo tempo, a reforma ampliou a legitimação dos que podem concorrer à adjudicação, nela incluindo aqueles que, antigamente, podiam exercer a remição (cônjuges, ascendentes e descendentes do executado), além de outros interessados (art. 876, § 5º). Desapareceu, pois, a remição como modalidade especial de expropriação executiva. O direito dos antigos remidores, porém, não desapareceu; transformou-se em direito à adjudicação.6O conceito de adjudicação, portanto, ampliou-se, tanto na maior dimensão de seu papel na execução por quantia certa como na sua abrangência subjetiva.

Pode-se, diante do novo quadro legal, definir-se a adjudicação como o ato executivo expropriatório, por meio do qual o juiz, em nome do Estado, transfere o bem penhorado para o exequente ou para outras pessoas a quem a lei confere preferência na aquisição. Não se confunde com a arrematação, porque a função precípua da adjudicação, quando a exerce o próprio credor, não é a de transformar o bem em dinheiro, mas o de usá-lo diretamente como meio de pagamento. Contudo, "tanto como na arrematação, há neste ato expropriatório atuação processual executiva do Judiciário, no exercício da tutela jurisdicional"7. Em regra, não há desembolso de dinheiro por parte do adjudicatário, porque o valor do bem se destina ao resgate do

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crédito do próprio adquirente. Há, todavia, casos em que o preço da adjudicação, no todo ou parte, tem de ser depositado em juízo, como nas hipóteses dos §§ 4º e 5º do art. 876.8São os casos em que o crédito do exequente é menor que o valor do bem adjudicado, ou aqueles em que o pretendente à adjudicação é terceiro sem preferência sobre o preço da expropriação.

312. Requisitos da adjudicação

Qualquer que seja a natureza do bem penhorado sua adjudicação é possível. Mas para ser praticada eficazmente duas exigências são feitas pelo art. 876: (i) o requerimento do interessado, pois o juiz não pode impor ao credor aceitar em pagamento coisa diversa daquela que constitui o objeto da obrigação exequenda; há, pois, de partir da opção do interessado essa modalidade substitutiva de prestação obrigacional9; (ii) a oferta do pretendente à adjudicação não pode ser de preço inferior ao da avaliação. Se pretender o credor (ou outro legitimado) adquirir o bem por preço inferior ao da avaliação, isto somente será possível em hasta pública, na qual terá de sujeitar-se à licitação com todos os eventuais concorrentes10.

313. Intimação do executado

O pleito da adjudicação não pode ser resolvido de plano pelo juiz, sem respeitar o contraditório. Uma vez requerida, o executado deverá ser intimado da pretensão do interessado na adjudicação, para que possa se manifestar e acompanhar o ato expropriatório, assegurando o direito ao contraditório e ampla defesa (art. 876, § 1º).

A intimação será feita nos termos do § 1º do art. 876 por uma das seguintes formas de comunicação processual:

(a) pelo Diário da Justiça, na pessoa de seu advogado constituído nos autos (inc. I);

(b) por carta com aviso de recebimento, quando representado pela Defensoria Pública ou quando não tiver procurador constituído nos autos (inc. II);

(c) por meio eletrônico, no caso das empresas públicas e privadas, quando não tenham advogado nos autos. É que ditas pessoas jurídicas são obrigadas a manter cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos, por imposição do art. 246, § 1º (inc. III).

A intimação por via postal será considerada realizada quando o executado houver mudado de endereço e não tiver previamente comunicado ao juízo - mesmo quando

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a comunicação não tiver sido recebida pessoalmente pelo interessado, nos termos do art. 274, parágrafo único (art. 876, § 2º).

Fica dispensada a intimação, nos termos previstos no § 1º do art. 876, se o executado, citado por edital, não tiver procurador constituído nos autos (art. 876, § 3º). Observar-se-á a regra geral de que, perante o réu revel, os prazos correm independentemente de intimação, bastando a publicação do ato decisório no órgão oficial (art. 346).

314. Depósito do preço

O exequente, ao exercer o direito de adjudicar, está dispensado de exibir o preço, desde que este seja igual ou inferior ao seu crédito, e não haja concorrência de outros pretendentes com preferência legal sobre o produto da execução.

Se o preço da adjudicação for maior, caberá ao adjudicatário depositar imediatamente a diferença, como condição de apreciação de seu requerimento (NCPC, art. 876, § 4º, I).11Sendo inferior dito preço, a adjudicação se faz sem depósito algum, e sem prejuízo do prosseguimento da execução pelo saldo devedor remanescente. A adjudicação, em tal caso, não importa quitação ou remissão da dívida, que ficará apenas amortizada.

Em algumas circunstâncias, o adjudicatário terá de efetuar o depósito integral do preço da adjudicação. É o caso em que concorre com outros credores com penhora anterior à sua ou com preferência legal sobre o bem adjudicado. Nesse tipo de concurso (art. 908),12o exequente só tem direito de levantar o produto da alienação judicial se houver sobra depois de satisfeitos os credores preferenciais. Daí por que, ao requerer a adjudicação, tem de depositar integralmente o valor de avaliação do bem penhorado; para evitar que se frustre o direito de preferência do credor hipotecário ou pignoratício, ou titular de outros privilégios legais13.

315. Legitimação para adjudicar

Para designar o beneficiário da adjudicação, o léxico registra, tanto o nome de adjudicante como de adjudicatário14. O novo Código não fala mais em adjudicante, mas em requerente da adjudicação. E fala em adjudicação apenas no art. 877, § 1º.

O NCPC ampliou bastante o rol de legitimados a requerer a adjudicação. De acordo com o disposto no art. 876, caput e seus §§ 5º e 7º são eles os seguintes:

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  1. o exequente, em primeiro lugar, ou seja, o que promove a execução em cujo andamento ocorreu a penhora dos bens a adjudicar;

  2. as pessoas indicadas no art. 889, inc. II a VIII, ou seja: (i) o coproprietário de bem indivisível do qual tenha sido penhorada fração ideal; (ii) o titular de usufruto, uso, habitação, enfiteuse, direito de superfície, concessão de uso especial para fins de moradia ou concessão de direito real de uso, quando a penhora recair sobre bem gravado com tais direitos reais; (iii) o...

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