A Adoção e o Princípio do Prioritário Interesse da Criança

AutorLuciano Matheus Rahal
Páginas80-85

Page 80

A Adoção e o Princípio do Prioritário Interesse da Criança

DOI: https://doi.org/10.17921/2448-2129.2019v20n2p80-85

LFG/Anhanguera, Pós-Graduação Lato Sensu em Direito de Família e Sucessões da Rede de Ensino. PR, Brasil. E-mail: rahalluciano@hotmail.com

A Adoção e o Princípio do Prioritário Interesse da Criança

The Adoption and the Best Interest of Child Principle

Luciano Matheus Rahal

Resumo

O presente trabalho, à luz da Constituição Federal, Lei nº 8.069/90 (ECA) e Lei nº 13.257/2016 (primeira infância), além de produções doutrinárias e pesquisas realizadas em nível nacional, pretende uma releitura da regra da prevalência da família natural, com o resgaste da relevância do princípio do prioritário interesse da criança. Por meio de método dedutivo se demonstra que o fracasso na inserção de crianças, ainda na primeira infância, em famílias substitutas, na forma de adoção, possui impactos irreversíveis sobre estas pessoas em formação, realidade esta que pode ser alterada caso haja uma mudança de paradigma por parte da rede de proteção, focando as intervenções sempre no prioritário interesse da criança, seja no contexto da família natural ou não.

Palavras-chave: Adoção. Prioritário Interesse da Criança. Primeira Infância.

Abstract

The present work, in the light of the Federal Constitution, Federal Law no. 8.069 / 90 (ECA) and law n.13.257 / 2016 (early childhood), in addition to doctrinal productions and surveys conducted at the national level, intends to re-read the prevalence rule of the natural family, with the regain of relevance of the priority interest of child principle. Through a deductive method, it will be demonstrated that the failure to insert children, in early childhood, into substitute families in the form of adoption, has irreversible impacts on these people in formation, a reality that can be changed in case there is a paradigm shift by part of the safety net, focusing on interventions always on the best interest of the child, whether in the context of the natural family or not.

Keywords: Adoption. Best Interest of the Child. Early Childhood.

1 Introdução

Muitas crianças no Brasil em condições de serem encaminhadas para adoção, por se tratar de hipótese clara de destituição do poder familiar (negligência, maus tratos, abandono etc.), acabam não tendo este destino apesar do elevado número de pretendentes habilitados no Cadastro Nacional de Adoção.

Nesse sentido, o presente trabalho científico pretende demonstrar que a insistência exagerada na preservação do vínculo com os genitores (família nuclear) e a preferência cultural conferida à família extensa, apesar da pouca ou nenhuma vinculação afetiva com o infante, vem limitando as possibilidades de inserção destes incapazes em famílias substitutas na modalidade de adoção ainda na primeira infância, violando o princípio do prioritário interesse da criança.

Dessa forma, a excessiva insistência em preservar os vínculos familiares com os genitores, ou a manutenção da criança sob a guarda da família estendida, notadamente avós, tios, primos e outros, nas hipóteses em que seria evidente a necessidade de destituição de poder familiar, vem dificultando a adoção de crianças em baixa idade, aumentando o número

de “órfãos” nas instituições de acolhimento, que acabam por atingir a maioridade sem a indispensável inclusão familiar.

O presente estudo pretende instigar uma reflexão visando mudança de paradigma por parte do sistema de Justiça (Juiz, Ministério Público, Defensoria Pública e Conselho Tutelar), com enfoque no prioritário interesse da criança, e na célere e efetiva intervenção no sentido de definir a aptidão ou não dos genitores biológicos em continuar exercendo o poder familiar, de modo a permitir que mais crianças tenham a oportunidade de serem criadas em um ambiente que permita seu desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Pretende-se ressaltar a urgente necessidade de mudança de paradigma aos operadores do direito no sentido de ponderar as deficiências e vulnerabilidades da família natural à luz do prioritário interesse da criança, preferencialmente, até seis anos de idade (primeira infância).

Em outras palavras, as vulnerabilidades do contexto da família natural, como: drogadição, miséria extrema e crônica e baixíssima instrução que podem resultar em maus tratos, negligência e abusos, entre outros casos insuperáveis ou de difícil ou improvável superação, não podem obstaculizar o acesso da criança à família substituta.

Rev. Ciênc. Jurídicas., v.20, n.2, p. 80-85, 2019

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RAHAL, L.M.

2 Desenvolvimento

2.1 Metodologia

O presente estudo, portanto, à luz da atualizada legislação, produções doutrinárias e pesquisas, utilizando método dedutivo, teve por objeto a releitura deste importante princípio (prioritário interesse da criança), visando adequá-lo aos demais valores e princípios balizadores presentes na Constituição Federal, Lei nº 8.069/90 (ECA) e Lei nº 13.257/2016 (marco legal da primeira infância).

2.2 O panorama atual da adoção no Brasil

Conforme reiteradamente vem revelando as mais diversas pesquisas em nível nacional ao longo dos anos, o Brasil padece de uma contradição que não vem conseguindo superar: há muitas crianças e adolescentes em condições de serem adotados e um número ainda maior de pretendentes à adoção, aptos a exercerem o poder familiar, porém os índices de adoções regulares (excluídas as chamadas adoções “à brasileira”) são baixíssimos.

A primeira grande pesquisa realizada, em nível nacional, após a implantação do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), que padronizou o cadastro tanto de pretendentes quanto de crianças/adolescentes aptas à adoção, concluiu:

De acordo com os dados do Cadastro Nacional de Crianças Acolhidas (CNCA) relativos ao mês de junho de 2012, existiam 40.340 crianças e adolescentes acolhidos em instituições de acolhimento ou estabelecimentos sustentados por organizações não governamentais (ONGs), comunidades e instituições religiosas em todo o território nacional. Parte dessas crianças e adolescentes compõem as 5.281 crianças e adolescentes aptas à adoção registradas no Cadastro Nacional de Adoção (CNA). Quando esse universo é comparado ao total de pretendentes à adoção, devidamente cadastrados no CNA (28.151 pessoas), verifica-se a proporção aproximada de cinco pretendentes para cada criança cadastrada no CNA. Observa-se que existe um contingente significativamente maior de pessoas interessadas em adotar em relação a crianças e adolescentes aptos à adoção (CNJ, 2013).

Estes dados revelam que há grande número de pretendentes à adoção (28.151 pessoas) e elevado número de crianças/adolescentes em situação de extrema vulnerabilidade
(40.340 crianças), muitas das quais poderiam ser inseridas em família substituta na forma de adoção em número muito superior às formalmente cadastradas (5.281 crianças), caso houvesse mudança de paradigma, como se passa a discorrer mais adiante.

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