Agência nacional de energia elétrica (ANEEL): a mitigação do modelo brasileiro de organização administrativa hierarquizada

AutorSérgio Guerra
Ocupação do AutorPós-Doutor em Administração Pública
Páginas270-305
270 Temas RelevanTes no DiReiTo De eneRgia eléTRica
Muito se debate acerca da forma ideal de atuação da administração
pública brasileira nos tempos atuais. Parece ser unânime que a
mesma deve ser moderna, ter como vetor de sua atuação a necessi-
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problemas cotidianos da população.
Mas, por que a forma de atuação da organização administrativa
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sobre a atuação da administração pública? Um fato é, entre nós, de
capital importância para essa ordem de questões.1
Despontou no Brasil, nas letras promulgadas da Carta Cidadã de
1988, o desenho de um novo Estado de Direito, agora democrático,
estruturando a ordem social focada no trabalho, bem-estar e justiça
social, e a ordem econômica sobre os pilares da livre iniciativa e da
valorização do trabalho humano.
Sob o ideal de que compete ao Estado formular políticas públicas
visando, cumulativamente, regular a competitividade nos mercados
e promover o bem comum da sociedade (meio), o foco, a meta maior,
passa a ser alcançar instrumentos de elevação e proteção da digni-
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Presencia-se um novo e instigante sistema, em que o protago-
nismo do Poder Executivo, o conhecido intervencionismo exacerbado
no campo econômico, cede lugar à atuação estatal regulatória, com
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que demandam novas soluções para atingir o bem-estar do cidadão.
Um dos principais traços dessa fase por que passa a sociedade
brasileira está no fato de que a atuação estatal em um determi-
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segmento e afetar o direito individual. Isto é, diante da enorme
diversidade de interesses contrapostos, a implementação de polí-
ticas públicas, regra geral, não atende satisfatoriamente a todos os
desejos e expectativas dos brasileiros.
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dade cotidiana e impostos pela Constituição Federal de 1988, não há
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1
Conforme debate trazido em nosso GUERRA, S. Agências reguladoras: da organização
administrativa piramidal à governança em rede. Belo Horizonte: Fórum, 2012.
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agência nacional De eneRgia eléTRica (aneel): a miTigação Do moDelo ... 271
de melhor aplicação dos recursos orçamentários, ao contrário do
que, em muitos casos, ainda ocorre sob o rótulo da vetusta escolha
discricionária.2
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deve ser um instrumento para o desenvolvimento nacional e prestar
contas de suas atividades. As áreas que abrangem as políticas públicas
voltadas à distribuição de renda, alimentação, oferta de empregos,
segurança, investimentos em educação, acesso à justiça, melhorias
na saúde e programas de infraestrutura para moradia e saneamento
básico devem ser a base central do planejamento, imposto, de forma
aberta, aos governos pelo atual sistema constitucional.
Contudo, ainda hoje, no Brasil, depara-se com certa opacidade
no planejamento e na capacidade para implementar, adequadamente,
as políticas públicas nessas áreas essenciais para o desenvolvimento
da sociedade.
Em suma, se o Estado brasileiro passa a ser Regulador, com obje-
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e reserva de atividades econômicas ao setor privado, a sociedade
atual necessita de uma governança pública orientada, especialmente,
para a transparência dos resultados alcançados com a ação gover-
namental.
O acompanhamento dos resultados deve, sempre que possível,
ser realizado, objetivamente, por meio de indicadores de desem-
penho, métricas e índices, que, de alguma forma, abandonem o casu-
ísmo e traduzam as consequências das ações políticas, das escolhas
públicas, em melhores condições de vida para a população. Esses
resultados, portanto, devem ser avaliados, mensurados e controlados
pela sociedade. É um dos melhores mecanismos do “poder” chegar
às mãos dos cidadãos.
Ademais disso, vive-se, sob a forma de Estado Regulador, uma
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e executar, isoladamente, todos os investimentos estratégicos neces-
sários para o desenvolvimento do país.
2 GUERRA, S. 
administrativas. Belo Horizonte: 2008. p. 57.
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É necessária, como vem ocorrendo nos últimos anos, a formação
de consórcios e parcerias entre governos das diferentes esferas (União,
Estados e municípios), entidades da administração indireta, orga-
nismos internacionais, organizações não governamentais e empresas
privadas. Só assim, o Governo poderá viabilizar a execução de diversos
programas estruturados nas políticas públicas.
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como está estruturada a organização administrativa brasileira?
Sem prejuízo de algumas leis especiais e disposições constitucio-
nais que disciplinam a matéria, o marco legal da organização adminis-
trativa brasileira ainda é disposto, em grande parte, pelo Decreto-Lei
nº 200 de 1967. Assim, o Brasil, em termos de organização adminis-
trativa, está próximo de um modelo ainda não totalmente superado
de uma administração inspirada – mas, não totalmente alcançada –
no modelo 3 com ilhas de excelência, rotulada de pesada,
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Sabe-se que a administração pública ensaiou a adoção de um
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implantado. Seguindo tal posicionamento, os órgãos da administração
3
O modelo racional-legal, pelo qual a dominação se exerce por meio de um quadro
administrativo burocrático (ao invés da burocracia patrimonial), foi estruturado
por Weber, de modo que os funcionários: (a) são pessoalmente livres, isto é, devem
obedecer apenas às obrigações objetivas de seu cargo; (b) são nomeados – e não
eleitos – sob uma rigorosa hierarquia dos cargos; (c) têm competências funcio-
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mediante concurso (provas etc.); (e) são remunerados em dinheiro – compatível
com a posição na hierarquia – com direito à aposentadoria; (f) devem exercer o
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tempo de serviço ou por merecimento, ou as duas; (h) devem separar trabalho
das questões pessoais (não haver apropriação do cargo); (i) devem seguir rigo-
roso sistema de controle administrativo disciplinar. Por essa estrutura, Weber
sustentou que se atingiria, de forma mais racional, o exercício de dominação.
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e extensibilidade dos serviços, e aplicabilidade formalmente universal a todas
as tarefas públicas. WEBER, M. Economia e sociedade. v.2. Trad. Regis Barbosa e

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