Agravo de Petição

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Ocupação do AutorAdvogado
Páginas340-364

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1. Lineamentos históricos

O agravo de petição já era previsto pelo Decreto-lei n. 1.239/39 (art. 79), no qual era denominado, apenas, agravo. Dessa figura cuidou também o Decreto n. 6.596/40 (art. 204).

Mais tarde, a Lei n. 5.442/68 — reproduzindo o teor do Decreto-lei n. 8.737/46 — impôs nova redação ao art. 897, “a”, da CLT; outra redação foi dada pela Lei n. 8.432, de 11 de junho de 1992 (art. 49). A redação atual adveio da Lei n. 10.035, de 25 de outubro de 2000.

O prazo para a interposição do agravo de petição, que é de oito dias, foi estabelecido pela Lei n. 5.584/70 (art. 6.º) para todos os recursos trabalhistas típicos; logo, é absolutamente desnecessária a referência que o caput do art. 897 da CLT (com a redação determinada pela Lei n. 10.035/2000) faz a esse prazo.

2. Cabimento

Estatui o art. 897, “a”, da CLT, ser o agravo de petição cabível “das decisões do Juiz ou Presidente, nas execuções”.

Antes de ingressarmos no exame da admissibilidade desse meio de impugnação das resoluções judiciais trabalhistas, há necessidade de efetuarmos algumas considerações acerca da redação da norma legal supracitada.

Nas edições anteriores deste livro, dizíamos, em primeiro lugar, que a referência ao “Juiz ou Presidente” não se justificava, pois o órgão de primeiro grau típico da organização judiciária trabalhista era a Junta de Conciliação e Julgamento, cuja presidência incumbia a juiz togado (CLT, art. 647, “a”). Não havendo, na localidade, Junta de Conciliação e Julgamento instalada, ficaria automaticamente investido nessa jurisdição especializada o juiz de direito da comarca correspondente (CLT, art. 668). O disjuntivo ou, constante do texto legal em exame, poderia conduzir à inferência equivocada de que uma coisa era ser juiz e outra, presidente. Ora, o presidente da Junta de Conciliação e Julgamento era sempre um magistrado, ainda que substituto (neste caso, ele somente respondia pela presidência). A expressão da lei: “Juiz ou Presidente”, não envolvia, portanto, elementos que se excluíam, mas que se completavam: Juiz-Presidente. Hifenizadamente, aliás.

Em segundo, a alusão feita a juiz (no sentido de órgão singular) era correta, uma vez que, por força de comando legal, na execução atuava apenas o magistrado, nunca os

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classistas. Assim, o órgão de primeiro grau, que funcionava de maneira colegiada no processo de conhecimento, se tornava monocrático no de execução, sem que isso infringisse, como se pudesse supor, o preceito constitucional que dizia da paridade de representação das classes sociais da produção, no âmbito da Justiça do Trabalho.

É que, na execução, a atividade monocrática do juiz se limitava a fazer cumprir a decisão proferida pelo Colegiado, sendo, pois, dispensável a presença dos classistas, até porque isto acarretaria grandes entraves ao processo executivo.

Estas considerações, no entanto, perderam o interesse prático que poderiam ter, uma vez que o juízo de primeiro grau trabalhista passou a ser monocrático também no processo de conhecimento, tendo, por isso, sido alterada a sua denominação de Junta de Conciliação e Julgamento para Vara do Trabalho, pela Emenda Constitucional n. 24/99. Está implicitamente derrogada, portanto, a letra “b” do art. 647, da CLT, que ainda alude aos vogais.

Vejamos, a seguir, o que se deve entender por: a) decisão; e b) execução, para efeito de cabimento do recurso específico de agravo de petição.

a) Decisão

Em um sentido amplo, generalizante, o vocábulo decisão (do latim decisio, de decidire = compor, solucionar, resolver, harmonizar) designa toda e qualquer deliberação que se toma acerca de algum assunto. No campo processual, o seu significado é mais restrito, relacionando-se com a solução que se dá a certas questões controvertidas nos autos. No passado, fala-se de decisão terminativa do feito e de decisão definitiva; hoje, o efeito terminativo ou definitivo está reservado para as sentenças, conforme tenham acarretado a extinção do processo sem ou com pronunciamento sobre o mérito, respectivamente (CPC de 1973, art. 162, § 1.º, em sua redação primitiva, que foi recepcionada pelo processo do trabalho). O conceito de sentença, no CPC de 2015, é formulado no art. 203, § 1.º, verbis: “Ressalvadas as disposições expressas dos procedimentos especiais, sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução” (destacamos). Essa reformulação do primitivo conceito de sentença, que constava do art. 162, § 1.º do CPC, derivou do sincretismo operado pela Lei n. 11.232/2005, que trouxe para o processo de conhecimento a antiga execução de título judicial, passando a denominá-la de cumprimento da sentença. A partir daí, é evidente que, naquele processo, já não se poderia manter o primitivo conceito de sentença, como sendo o ato pelo qual o juiz punha fim ao processo (de conhecimento). Considerando, todavia, que o processo do trabalho não realizou semelhante sincretismo, mantendo separados os processos de conhecimento e de execução, torna-se possível seguir aqui afirmando que a sentença é o ato pelo qual o juiz põe fim ao processo, resolvendo, ou não, o mérito.

Pudemos asseverar, em linhas anteriores, que a tripartição legal dos atos do juiz em: 1) sentença; 2) decisão interlocutória; e 3) despachos, não é de todo satisfatória, seja porque dela ficaram excluídos certos atos que o magistrado pratica, como diretor do processo, a saber: interrogatório das partes (CLT, art. 848), inquirição de testemunhas

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(CLT, art. 848, § 2.º), do perito (ibidem), inspeção judicial (CPC, arts. 481 a 484) etc., seja porque o Código ignorou a existência de despachos que não são de mero expediente, possuindo, sim, conteúdo tipicamente decisório (como, v. g., o que aprecia a admissibilidade de recursos interpostos; o que concede ou rejeita medidas liminares etc.). Logo, mais do que despachos, são decisões.

Demais, o legislador processual civil de 1973, ao conceituar os atos do juiz discriminados no art. 162 daquele Código, parece haver esquecido o provecto conselho oriundo das fontes romanas — e que fora por ele próprio destacado na Exposição de Motivos (Cap. III, Do Método da Reforma, inc. III, Das Definições Legais) —, segundo o qual omnis definitio in jure civile periculosa est (Digesto, 50.17.202). Em tradução livre: “Toda definição em direito civil é perigosa”.

Sem embargo, no direito romano antigo a sentença constituía o ato pelo qual o julgador punha fim ao processo, apreciando o mérito; a ela se contrapunham, de certo modo, as interlocuções, que compreendiam aqueles pronunciamentos jurisdicionais realizados no curso do processo, sem apreciação do mérito e sem dar-lhe fim. Mais tarde, porém, verificou-se um desvio do significado e da própria finalidade das interlocutórias, que passaram a caracterizar as manifestações do juiz que, sem implicar a extinção do processo, resolviam alguns incidentes surgidos no curso deste. Chegou-se mesmo a falar em sentenças interlocutórias, expressão que continha manifesta contraditio in terminus, pois a denominação clássica de sentença sempre foi reservada para o pronunciamento final do juiz; logo, era inadmissível que se falasse de sentença interlocutória.

Ciente dessa deturpação, que teve início no direito germânico e que se propagou pelos Direitos Intermédio e Canônico, o CPC de 1973 tratou de referir-se à decisão interlocutória (art. 162, § 2.º), conceituando-a como “o ato pelo qual o juiz, no curso do processo, resolve questão incidente”. Embora essa atitude do legislador processual não seja imune a críticas doutrinárias, foi inegável o seu acerto do ponto de vista prático, porquanto eliminou a antiga dúvida, existente na vigência do texto anterior, sobre ser cabível recurso dessa espécie de ato judicial. O CPC de 2015, no art. 203, § 2.º, conceitua a decisão interlocutória como o “pronunciamento judicial de natureza decisória que não se enquadre no § 1.º” da mesma norma.

No processo civil, as decisões interlocutórias podem ser impugnadas pelo recurso de agravo de instrumento (CPC, art. 1.015). No processo do trabalho, ao contrário, vigora o princípio da irrecorribilidade (autônoma e imediata) das interlocutórias (CLT, art. 893, § 1.º).

O que se deve entender, afinal, por decisão para efeito de incidência do disposto no art. 897, “a”, da CLT, que prevê, para atacá-la na execução, o recurso específico de agravo de petição? Teria o legislador utilizado o termo com o sentido de: a) despacho com conteúdo decisório; b) decisão interlocutória; ou c) com a estrita acepção de sentença? Vejamos.

a.1) Despacho com conteúdo decisório

No processo do trabalho, como no civil, a regra é que dos despachos ordinários ou de mero expediente não cabe recurso (CPC, art. 1.001). Devem ser entendidos como tais

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todos os despachos de simples propulsão processual, sem implicar qualquer ofensa a direito das partes: destinam-se, tão somente, a promover o trâmite do processo — vocábulo originário do latim processus, que significa marcha avante, ir à frente.

Há certos despachos, contudo, que não se limitam a uma finalidade meramente impelente do processo, senão que envolvem verdadeira decisão a respeito de determinado ato requerido ou praticado pelas partes. Tomemos como exemplo o “despacho” que admite ou denega a interposição de recursos: o conteúdo decisório dessa classe de despachos é inegável, pois não se atém a ordenar o andamento processual; encerra, como afirmamos, autêntica deliberação a propósito do recurso apresentado por uma ou por ambas as partes. Há, em resumo, uma categoria especial de despachos, que não são de...

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