Meios Alternativos de Resolução de Conflitos Trabalhistas: o Termo de Ajustamento de Conduta Firmado Perante o Ministério Público do Trabalho

AutorLuís Antônio Camargo de Melo
Ocupação do AutorProcurador-Geral do Trabalho e Professor de Direito do Trabalho do Centro Universitário IESB.
Páginas136-142

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Papel do estado

A visão tradicional que sempre se teve do Estado é a de que a sua existência se destina a prevenir e apaziguar os conflitos e garantir a paz social. Atualmente, essa visão não mais corresponde à realidade, pois o Estado, exclusivamente, é incapaz de lidar com o elevado número de demandas que são submetidas aos seus órgãos. A adoção de formas alternativas de resolução dos conflitos sugere a insuficiência dos meios consagrados a tal fim, mas não quer, nem pode, pretender substituir as formas tradicionais. As demandas crescentes exigem novas respostas para os mais variados conflitos de interesses da atualidade, mas o termo "solução alternativa de conflitos" deve ser entendido mais no sentido da sua complementariedade aos meios de solução de demandas tradicionalmente previstos, de modo que essa interação possa trazer novas possibilidades de transformação social. Trata-se de admitir que estes últimos por vezes não são capazes de dar respostas satisfatórias para as questões de determinados grupos sociais. Em determinadas circunstâncias, os instrumentos tradicionais se mostram tão inadequados que se justifica o emprego de outros meios alternativos, como de há muito se constatou nos conflitos correntes em favelas nas quais o Estado não tem nenhuma inserção real ou em que sua presença ocasionaria mais acirramento do que solução.

O ordenamento legal brasileiro tem privilegiado as composições, os acordos, os ajustes, como meios para resolução de conflitos. Na área cível, há os Juizados Especiais, que buscam, sempre que possível, a conciliação (art. 2º). De igual modo, no Código de Processo Civil nota-se a tentativa de pacificação social pelo consenso por meio de audiência preliminar de conciliação (art. 331 - quando a causa admitir transação), e na abertura da audiência de instrução, quando novamente se procura conciliar as partes (arts. 447 a 449). Na área penal, a Lei Federal n. 9.099/95 (Lei do Juizado Especial Criminal) viabiliza também a conciliação (arts. 72 e 73), enfatizando a reparação do dano. No âmbito constitucional, há PEC do Judiciário tentando implementar a fase conciliatória como obrigatória em todos os tipos de processo. E, historicamente, o Processo do Trabalho encampou este estágio como procedimento obrigatório no início e no final da audiência, em todos os graus de jurisdição; além de, por força da Lei n. 9.958/2000, haver estabelecido as Comissões de Conciliação Prévia, que o STF definiu como sendo etapa meramente facultativa (ADIS ns. 2.139-7, 2.160-5 e 2.148-6). A Constituição Federal em vigor assegura a arbitragem no art. 114, §§ 1º e 2º, ao lado da negociação, como formas de

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enfrentamento ao conflito coletivo de trabalho. Por outro lado, ainda temos a possibilidade do ajuizamento do dissídio coletivo.

No âmbito do TST, questiona-se a aceitação da arbitragem no plano dos conflitos individuais de trabalho, conforme evidenciam, por amostragem, as seguintes ementas:

ARBITRAGEM. POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO PARA SOLUÇÃO DE CONFLITOS TRABALHISTAS. HIPÓTESE FÁTICA DE PRESSÃO PARA RECURSO AO JUÍZO ARBITRAL. INTERPRETAÇÃO DA LEI N. 9.307/96 À LUZ DOS FATOS. SÚMULAS NS. 126 E 221 DO TST. 1. A arbitragem (Lei n. 9.307/96) é passível de utilização para solução dos conflitos trabalhistas, constituindo, com as comissões de conciliação prévia (CLT, arts. 625-A a 625-H), meios alternativos de composição de conflitos, que desafogam o Judiciário e podem proporcionar soluções mais satisfatórias do que as impostas pelo Estado-juiz. 2. In casu, o Regional afastou a quitação do extinto contrato de trabalho por laudo arbitral, reputando-o fruto de pressão para o recurso à arbitragem. 3. Nessas condições, a decisão regional não viola os arts. 1º da Lei n. 9.307/96 e 840 do CC, uma vez que, diante da premissa fática do vício de consentimento (indiscutível em sede de recurso de revista, a teor da Súmula n. 126 do TST), a arbitragem perdeu sua natureza de foro de eleição. Portanto, a revista, no particular, encontrava óbice na Súmula n. 221 do TST. Agravo de instrumento desprovido. (TST/7ª T., AIRR-2.547/2002-077-02-40.9, Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho, DJ 8.2.2008).

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. JUÍZO ARBITRAL. COISA JULGADA. LEI N. 9.307/96. CONSTITUCIONALIDADE. O art. 5º, XXXV, da Constituição Federal dispõe sobre a garantia constitucional da universalidade da jurisdição, a qual, por definir que nenhuma lesão ou ameaça a direito pode ser excluída da apreciação do Poder Judiciário, não se incompatibiliza com o compromisso arbitral e os efeitos de coisa julgada de que trata a Lei n. 9.307/96. É que a arbitragem se caracteriza como forma alternativa de prevenção ou solução de conflitos à qual as partes aderem, por força de suas próprias vontades, e o inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal não impõe o direito à ação como um dever, no sentido de que todo e qualquer litígio deve ser submetido ao Poder Judiciário. Dessa forma, as partes, ao adotarem a arbitragem, tão só por isso, não praticam ato de lesão ou ameaça à direito. Assim, reconhecido pela Corte Regional que a sentença arbitral foi proferida nos termos da lei e que não há vício na decisão proferida pelo juízo arbitral, não se há de falar em afronta ao mencionado dispositivo constitucional ou em inconstitucionali-dade da Lei n. 9.307/96. Despicienda a discussão em torno dos arts. 940 do Código Civil e 477 da CLT ou de que o termo de arbitragem não é válido por falta de juntada de documentos, haja vista que reconhecido pelo Tribunal Regional que a sentença arbitral observou os termos da Lei n. 9.307/96 - a qual não exige a observação daqueles dispositivos legais - e não tratou da necessidade de apresentação de documentos (aplicação das Súmulas ns. 126 e 422 do TST). Os arestos apresentados para confronto de teses são inservíveis, a teor da alínea a do art. 896 da CLT e da Súmula n. 296 desta Corte. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (TST/7ª T., AIRR 1475/2000-193-05-00.7, Min. Pedro Paulo Manus, j. 15.10.2008, DJ 17.10.2008)1

O Projeto de Código de Processo Civil, na iminência de ser aprovado, também cuida da matéria, admitindo procedimentos prévios e incidentais de negociação ou de arbitragem entre os próprios litigantes, ao lado de vários projetos de lei.

A maior vantagem das soluções negociadas é que o diálogo atrai espontaneidade no esclarecimento de condições e facilita o cumprimento voluntário do avençado, além de aproximar ainda mais os interlocutores.

Termo de ajustamento de conduta - tac

O desgaste no grau de confiança das respostas oficiais, decorrente do elevado número de demandas que são submetidas aos órgãos estatais, tem levado o legislador a buscar o reconhecimento de sistemas alternativos que possibilitem a transformação das relações de poder e a consequente distribuição de bens de forma mais compatível com as disposições constitucionais.

Nesse contexto, surgem a partir de situações vividas na prática cotidiana possibilidades alternativas de adoção de mecanismos que proporcionem espaço para aqueles que não têm acesso ao sistema oficial ou dele não recebam respostas satisfatórias para suas questões.

Um dos instrumentos de que se utiliza o MPT para sanar irregularidades, conciliar conflitos e pôr

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fim a condutas indesejadas é o termo de...

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