Analise Crítica das Primeiras Decisões Judiciais Brasileiras Sobre Pedido de Reconhecimento de Vínculo de Emprego dos Motoristas da Empresa Uber: Reflexões Sobre os Limites do Sistema Jurídico Trabalhista no Brasil

AutorAna Paula Silva Campos Miskulin; Daniel Bianchi; Felipe Augusto de Azevedo Marques Arruda
Ocupação do AutorJuíza do Trabalho do TRT da 15ª Região, Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Federal de Goiás e integrante do Núcleo de Estudos «O trabalho além do direito do trabalho: dimensões da clandestinidade jurídico-laboral» da Faculdade de Direito da USP/Advogado/Assessor Jurídico no MPT
Páginas821-842
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ANALISE CRÍTICA DAS PRIMEIRAS DECISÕES JUDICIAIS
BRASILEIRAS SOBRE PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE VÍNCULO DE
EMPREGO DOS MOTORISTAS DA EMPRESA UBER: REFLEXÕES SOBRE OS
LIMITES DO SISTEMA JURÍDICO TRABALHISTA NO BRASIL
CRITICAL ANALYSIS OF THE FIRST BRAZILIAN JUDICIAL DECISIONS ON
THE APPLICATION FOR RECOGNITION OF THE EMPLOYMENT RELATIONSHIP OF
UBER'S DRIVERS: REFLECTIONS ON THE LIMITS OF THE LABOR LEGAL SYSTEM IN
BRAZIL.
Ana Paula Silva Campos Miskulin
1488
Daniel Bianchi
1489
Felipe Augusto de Azevedo Marques Arruda
1490
RESUMO: É cada vez mais comum a contratação de serviços de diferentes naturezas, por meio
de aplicativos para celulares e sites na internet. Consequentemente, cresce o número de
empresas que desenvolvem e administram esses sites e aplicativos, como também o número de
trabalhadores que ofertam serviços a essas empresas. Dentre elas, a Uber, empresa que promete
conectar motoristas a passageiros, foi a que alcançou a maior popularidade, inclusive por conta
das batalhas judiciais por ela enfrentadas em diversos países para consolidar seu modelo de
negócio. Uma destas querelas ocorre no campo juslaboral. De um lado, motoristas buscam
reconhecimento do vínculo de emprego com a Uber e, assim, ter acesso aos direitos sociais e
proteções estatais que de outra forma não teriam. De outro, a empresa busca consolidar a ideia
de que não presta serviço de transporte de passageiros, mas serviço de tecnologia, isto é, no
desenvolvimento e manutenção do aplicativo explorado por motoristas e passageiros. A análise
dessa controvérsia é relevante, já que permite avaliar a potencialidade do sistema jurídico
trabalhista em apreender o fenômeno da uberização, refletindo sobre a forma mais adequada de
se destinar proteção social a estes trabalhadores que, por enquanto, encontram-se à margem do
sistema jurídico trabalhista. Deste modo, propõe-se uma análise crítica das duas primeiras
decisões judiciais oriundas do TRT da 3ª Região, em que foram analisadas a existência ou não
de vínculo empregatício entre o motorista e a UBER, observando como a atividade da empresa
e o trabalho dos motoristas foram concebidos pelos magistrados, a possível ideologia que subjaz
tal concepção e suas consequências para a definição do vínculo jurídico entre empresa e
1488
Juíza do Trabalho do TRT da 15ª Região, Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade
Federal de Goiás e integrante do Núcleo de Estudos «O trabalho além do direito do trabal ho: dimensões da
clandestinidade jurídico-laboral» da Faculdade de Direito da USP;
1489
Advogado, mestre em Ciência Política pela FFLCH-USP e especialista em Direito do Trabalho pela FD-USP,
além de membro pesquisador do GPTC (Grupo de Pesquisa Trabalho e Capital) e do NTADT (Núcleo de Estudos
«O trabalho além do direito do trabalho: dimensões da clandestinidade jurídico-laboral», ambos da Faculdade de
Direito da USP;
1490
Assessor Jurídico no MPT, graduado em Psicologia e Direito pela Universidade de São Paulo; integrante do
Núcleo de estudos «O trabalho além do direito do trabalho: dimensões da clandestinidade jurídico-laboral» e do
Grupo de Pesquisa Trabalho-Capital, ambos da Faculdade de Direito da USP;
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trabalhador. Por fim, buscou-se refletir se as decisões ali consignadas podem apontar como o
sistema jurídico trabalhista no Brasil pode destinar proteção mais adequada aos trabalhadores
que prestam serviços por meio de aplicativos.
Palavras chave: UBER, motoristas, direito do trabalho, proteção, vínculo de emprego
ABSTRACT: It is increasingly common to contract services of different natures, through
mobile applications and websites. As a result, the number of companies that develop and
manage these sites and applications grows, as well as the number of workers who offer services
to these companies. Among them, Uber, a company that promises to connect drivers to
passengers, was the one that reached the highest popularity, also because of the judicial battles
it faced in several countries to consolidate its business model. One of these quarrels occurs in
the labor field. On the one hand, drivers seek recognition of the employment relationship with
Uber and, thus, have access to the social rights and state protections they would otherwise not
have. On the other hand, the company seeks to consolidate the idea that it does not provide
passenger transportation service, but technology service, that is, in the development and
maintenance of the application operated by drivers and passengers. The analysis of this
controversy is relevant, since it allows assessing the potential of the labor legal system in
apprehending the phenomenon of uberization, reflecting on the most appropriate way to assign
social protection to these workers who, for the time being, are on the fringes of the system labor
law. Thus, a critical analysis of the first two judicial decisions from TRT of the 3rd Region is
proposed, in which the existence or not of an employment relationship between the driver and
UBER was analyzed, observing how the company activity and the work of the drivers were
conceived by the magistrates, the possible ideology that underlies such conception and its
consequences for the definition of the legal bond between company and worker. Finally, it was
tried to reflect if the decisions contained therein can point out how the labor legal system in
Brazil can assign more adequate protection to the workers who provide services through
applications.
Keywords: UBER, drivers, labor law, protection, employment bond
INTRODUÇÃO: O estudo da situação dos motoristas de Uber como atividade do
Núcleo de Estudos o Trabalho para Além do Direito do Trabalho (NTADT)
Procuramos retratar neste artigo o momento em que se encontra a pesquisa que vimos
realizando, desde agosto de 2016, no Núcleo de Estudos “O trabalho para além do Direito do
Trabalho: Dimensões da clandestinidade jurídico-laboral” (NTADT), sobre as condições dos
homens e mulheres que se cadastram no site da empresa Uber com a finalidade de atuarem
como motoristas. Como sugere o próprio nome do núcleo de estudos, a ideia inicial era elaborar
um estudo que fosse além da abordagem meramente jurídica do fenômeno, buscando
compreender, de forma crítica, as complexidades das relações de trabalho que, pelo menos,
aparentemente, escapam daquelas que tradicionalmente são objetos do Direito do Trabalho.
Impende destacar que a pesquisa se encontra em desenvolvimento de sua primeira
etapa, centrada em uma aproximação teórica em relação ao fenômeno da uberização e da

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