Análise econômica da tributação

AutorCristiano Carvalho
Ocupação do AutorDoutor e Mestre em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo ? PUC-SP
Páginas263-280
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ANÁLISE ECONÔMICA
DA TRIBUTAÇÃO
Cristiano Carvalho
Doutor e Mestre em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo – PUC-SP. Pós-Doutor em Direito e Economia pela University of California, Berke-
ley. Livre-Docente em Direito Tributário pela USP. Professor convidado do Programa
de Pós-Graduação em Direito da Universidade de São Paulo, no Instituto Brasileiro
de Estudos Tributários – IBET e no Instituto de Economia da Unicamp. Vice-Chair da
International Tax Law Committee, American Bar Association. Presidente da Academia
Tributária das Américas – ATA. Membro fundador e ex-diretor da Associação Brasileira
de Direito e Economia – ABDE. Advogado.
Sumário: 1. Introdução – 2. O que a Análise Econômica aplicada ao Direito tributário não é
3. Algumas aplicações no Direito tributário; 3.1. Por que pagamos tributos?; 3.2. O tributo
“ótimo”; 3.3. O peso morto da tributação; 3.4. Deveres instrumentais e formais, custos de
conformidade e o Teorema de Coase – 4. Conclusões – 5. Referências Bibliográcas.
1. INTRODUÇÃO
A aplicação da escola de pensamento e do método interdisciplinar conhecido como
Análise Econômica do Direito ou, simplesmente, Direito e Economia à tributação é
prática corriqueira entre os acadêmicos e prof‌issionais norte-americanos dedicados ao
tema. Todavia, por circunstâncias históricas peculiares, bem como por uma inf‌luência
própria do civil law continental europeu, a ciência econômica quedou-se afastada das
correntes doutrinárias mais inf‌luentes do Direito Tributário em nosso país.
Várias causas específ‌icas poderiam ser identif‌icadas como responsáveis por isso:
o positivismo jurídico que marcou fortemente o direito público latino-americano;
uma antiga e perene confusão entre a ciência econômica e a ciência das f‌inanças,
por boa parte de nossos tributaristas; ou, como já adiantado acima, a inf‌luência da
doutrina italiana, alemã e ibérica no Direito Tributário brasileiro, em detrimento de
uma aproximação com o direito norte-americano.
Seja qual(is) for(em) a(s) causa(s), o fato é que não há mais razão para afastar
as potentes lentes da Análise Econômica dos estudos sobre o fenômeno tributário,
em vista de simples, porém irrefutáveis argumentos, como veremos a seguir.
Ocorre que a tributação é uma das mais fortes intrusões que o sistema jurídico
tem o condão de fazer na esfera de autonomia privada. Por essa mesma aptidão de
afetar a liberdade individual, os tributos são potentes estímulos ao comportamento
humano, aptos a alterar escolhas e ações dos cidadãos.
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CRISTIANO CARVALHO
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Surpreendentemente, a doutrina jurídica clássica (não apenas a tributária) de-
senvolvida e ensinada em nossas plagas não se preocupa com a relação entre normas
jurídicas e comportamento individual. A Análise Econômica, por outro lado, enfoca
precipuamente os incentivos gerados aos indivíduos pelo sistema jurídico, como
também as consequências efetivas acarretadas por tais estímulos.
Destarte, as ferramentas do Direito e Economia se prestam tanto para a análise
positiva do fenômeno tributário (como a tributação é) quanto para a análise nor-
mativa (como a tributação deveria ser), possibilitando a formulação de políticas
públicas. Ainda que esta segunda possa ser altamente subjetiva e questionável, a
depender dos f‌ins específ‌icos visados pelo Estado, é certo que a Análise Econômica
possibilita prever, ainda que de forma limitada e falível, as consequências advindas
das normas jurídicas.
Ademais, a Economia, não obstante ser uma ciência humana – sujeita, portanto,
aos vieses e limitações decorrentes da subjetividade de seu objeto de estudo, o com-
portamento humano intersubjetivo – ao menos procura ser epistemologicamente
objetiva, propondo hipóteses e buscando comprová-las empiricamente, na melhor
tradição do autêntico método científ‌ico.
Quanto ao seu uso propositivo, assim como qualquer outra tecnologia dispo-
nível ao ser humano, as ferramentas do direito e economia podem servir para tanto
para propósitos morais, como imorais ou mesmo amorais. E, da mesma forma que
não se pode culpar Max Planck, Albert Einstein ou Niels Bohr pelo uso prático que
os governos f‌izeram e fazem da física nuclear, jamais se poderá debitar do Direito e
Economia o uso que dele vierem a fazer. Porém, uma coisa é certa: os f‌ins visados
pelo legislador e pelo aplicador do direito seriam muito mais facilmente obtidos com
a manipulação ef‌iciente das normas como produtoras de incentivos.
2. O QUE A ANÁLISE ECONÔMICA APLICADA AO DIREITO TRIBUTÁRIO NÃO É
A confusão mais frequente que se faz entre o Direito e Economia e a sua aplicação
no Direito tributário é confundir o método de análise já exposto na presente obra
com um raciocínio f‌inanceiro do tipo “pró-f‌isco” ou “pró-contribuinte”.
O equívoco advém provavelmente da chamada “interpretação econômica do
fato gerador”, cuja origem é do sistema tributário alemão da primeira metade do
século passado (Código Fiscal alemão de 1919 e depois reaf‌irmada de forma mais
forte ainda no período nazista, década dos anos 301). Por essa interpretação, restava
1. No Código Tributário alemão de 1919, assim era disposto:
§ 4o – Na interpretação das leis f‌iscais deve-se ter em conta a sua f‌inalidade, o seu signif‌icado econômico e a
evolução das circunstâncias.
§ 5o – A obrigação do imposto não pode ser evitada ou diminuída mediante o abuso das formas e das possibilidades
de adaptação do direito civil.
Em 1934, a Lei de Adaptação Tributária do regime nazista assim determinou:
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