Análise econômica dos contratos

AutorLuciano Benetti Timm e João Francisco Menegol Guarisse
Ocupação do AutorMestre e Doutor em Direito pela UFRGS/Graduado em Direito pela UFRGS. Especialista em Direito Internacional pela mesma Universidade
Páginas157-177
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ANÁLISE ECONÔMICA DOS
CONTRATOS
Luciano Benetti Timm
Mestre e Doutor em Direito pela UFRGS. LLM pela Universidade de Warwick. Professor
do programa de Pós-Graduação em Direito da Unisinos-RS. Professor convidado das
Escolas de Magistratura dos Estados do Rio Grande do Sul, Pernambuco e Alagoas, bem
como dos Tribunais Regionais da 4ª e 5ª Regiões. Foi Pesquisador de Pós-Doutorado
na University of California, Berkely. Ex-Presidente e Membro fundador da Associação
Brasileira de Direito e Economia. Advogado.
João Francisco Menegol Guarisse
Graduado em Direito pela UFRGS. Especialista em Direito Internacional pela mesma
Universidade. Pesquisador do NEDEP-UFRGS.
Sumário: 1. Introdução – 2. Análise Econômica do Contrato; 2.1. Contratos como Instrumentos
para a Criação de Riqueza; 2.2. Contratos Inecientes – 3. Direito Contratual; 3.1. Princípios
Contratuais; 3.2. Regras do Direito Contratual – 4. Conclusão – 5. Referências Bibliográcas.
1. INTRODUÇÃO
Muitos são os trabalhos de dogmática jurídica que procuraram explicar a norma-
tização jurídica do contrato e extrair dela uma coerência lógico-sistemática. O estudo
dogmático necessita de crenças a priori, que não repousam sobre hipóteses cientif‌i-
camente verif‌icáveis (como por exemplo, as interpretações bíblicas ou do Corão, que
dependem da crença na existência de Deus pelo intérprete). Na dogmática jurídica não
é diferente. Pugnar pela “constitucionalização do Direito Civil”, exemplif‌icativamente,
supõe uma crença a priori na superioridade normativa da Constituição. Não há teste
observável para isso. Vale dizer, não há uma realidade subjacente que se queira descre-
ver. Em outras palavras, teorias jurídicas dogmáticas do contrato nada dizem sobre a
realidade das partes e do fenômeno social subjacente ao contrato.
O presente trabalho tem por objetivo apresentar uma proposta diferente, ou
seja, busca antes de tudo, revelar quem são as partes em uma relação contratual e a
realidade social subjacente. Para tanto, necessita buscar um referencial analítico fora
da dogmática jurídica, e, mais especif‌icamente, na Ciência Econômica. Nesse senti-
do, o texto pode ser classif‌icado dentro do que se convencionou chamar de Análise
Econômica do Contrato. Preliminarmente, cabe inquirir sobre o signif‌icado dessa
proposta, explicando os objetos de análise e a abordagem utilizada.
Este trabalho analisará dois objetos: em primeiro lugar, o contrato e, em segun-
do lugar, o direito contratual. O contrato é um fato social, tanto quanto o crime e as
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relações familiares (casamento, f‌iliação). Sua existência é anterior ao direito1, con-
sistindo numa manifestação da necessidade humana de interação econômica (troca).
Sua prática foi descrita por antropólogos em tribos humanas muito rudimentares que
não contavam com um sistema jurídico organizado (exemplif‌icativamente, tribos
incas pré-descobrimento espanhol). O que se entende aqui por contrato (no sentido
de transações) é, portanto, pré-jurídico e difere da def‌inição jurídico-dogmáticas de
contrato como acordo de vontades executável em uma corte de justiça (no sentido
de transações judicialmente executáveis). Estamos nos referindo a relações de troca
entre os indivíduos, envolvendo prestações recíprocas entre os contratantes, inde-
pendentemente do reconhecimento estatal dessa relação.
Já o direito contratual é a regulação jurídica (e essencialmente estatal) do con-
trato, instituindo regras, por exemplo, sobre sua formação, execução, nulidade e os
direitos das partes (seja por meio de precedentes vinculantes das cortes como no sis-
tema de common law; seja em leis, como no sistema de civil law). O direito contratual
tem por principal objetivo identif‌icar um certo número de transações (contratos, no
sentido apresentado no parágrafo anterior) e permitir que eles sejam judicialmente
executáveis graças à sua relevância social. Cada Estado fará isso de forma distinta,
reconhecendo algumas transações como contratos judicialmente executáveis e outras
não. Por exemplo, a venda de marijuana é válida na Holanda, podendo contar com
a proteção estatal, enquanto o mesmo não é verdade, por exemplo, no Brasil (ou
seja, um contrato permitido pelo direito contratual holandês). Isso não quer dizer,
obviamente, que não haja compra-e-venda de maconha no Brasil (contrato), mas
sim que essas transações não são reconhecidas pelo direito contratual brasileiro, não
podendo o vendedor da substância entorpecente mover uma ação judicial para cobrar
a dívida. Mas o direito contratual não tem apenas a função de individualizar aqueles
contratos que poderão ser judicialmente executáveis. Ele também cria incentivos
para o comportamento das partes. Nesse sentido, a forma como os contratos são re-
gulados é distinta em jurisdições diferentes, embora o incentivo ao cumprimento do
acordo possa ser idêntico. Assim, algumas jurisdições favorecem as perdas e danos
como remédio em caso de inadimplemento (por exemplo, países de Common Law),
enquanto outras preferem a execução específ‌ica da obrigação da parte inadimplente
(por exemplo, países de Civil Law como o Brasil).
No que tange ao método de abordagem utilizado nesse artigo, será ele, como
dito anteriormente, de análise econômica. Isso signif‌ica usar as ferramentas da ciên-
cia econômica para compreender, explicar e resolver problemas jurídicos. A análise
econômica envolve uma análise positiva e uma análise normativa. A análise positiva
visa descrever e avaliar a ef‌iciência do um determinado instituto, inquirindo sobre as
consequências econômicas de diferentes arranjos normativos existentes. Em outras
1. Vamos entender aqui por Direito, um sistema jurídico com um mínimo de organização e coerência, respal-
dado por um mecanismo de solução de controvérsias imparcial como podemos encontrar a partir da Roma
Antiga. Nesse sentido, Direito não pode ser associado livre e simplesmente com costume. Um costume pode
até ser aceito como Direito, mas não esgota nem explica o Direito.
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