A Análise de Impacto Regulatório (AIR) no Setor de Energia Elétrica

AutorRafael Véras de Freitas
Ocupação do AutorProfessor do Programa de Educação Continuada da Fundação Getulio Vargas (FGV) Direito Rio
Páginas646-676
646 A ANÁLISE DE IMPACTO REGULATÓRIO (AIR) NO SETOR DE ENERGIA ELÉTRICA
24.1 INTRODUÇÃO
No início da década de 1990, as questões que envolviam o exercício da
função regulatória no Brasil estavam relacionadas: (i) à legitimidade do
exercício da função normativa pelas agências reguladoras; (ii) à constitu-
cionalidade da atribuição de mandatos ixos e não coincidentes com o do
Chefe do Poder Executivo para os seus diretores; e (iii) ao cabimento de
recurso hierárquico impróprio de suas decisões.
Os tempos são outros. Atualmente, a Doutrina do assim denominado
“Direito Regulatório” – se é que não se trata de uma das facetas do nosso
velho Direito Administrativo – passa a voltar suas luzes para a qualidade do
exercício da regulação. Isto é, a forma passa a dar lugar à sua substância da
regulação. Não se questiona mais qual seria a natureza dessa função regu-
latória – se regulamentar ou normativa –, mas se tal modalidade de inter-
venção do Estado no Domínio Econômico, prevista no art. 174 da CRFB, é
necessária, adequada e proporcional em sentido estrito.
A inlação normativa que outrora justiicou a famosa “Teoria da Desle-
galização” passa a servir de fundamento para a análise de uma vertente
qualitativa da regulação. Os famosos “standards, previstos nas Leis-quadro
de criação das agências reguladoras, passam a servir de substrato à avaliação
da qualidade da implementação técnica das políticas regulatórias. Trata-se
de uma nova vertente que se materializa, basicamente, na revisão de deter-
minada regulação já editada; na melhora dos processos de criação da regu-
lação; ou, até mesmo, na reconiguração de todo um sistema regulatório.
Em resumo, as discussões sobre o exercício da função regulatória
caminham para que se possam buscar parâmetros objetivos acerca: (i) da
própria necessidade (ou desnecessidade) da intervenção regulatória; e (ii)
da avaliação apriorística da eiciência, dos custos e da segurança jurídica da
implementação/alteração de atos regulatórios. Daí a importância do novo
instrumento da Análise de Impacto Regulatório (AIR).1
1
Embora existam aqueles que fazem distinção entre Análise de Impacto Regulatório
e Avaliação de Impacto legislativo, aplicando aquela a atos regulatórios infrale-
gais e está a atos legislativos primários. Nesse sentido: MENEGUIN, Fernando.
Avaliação de Impacto Legislativo. Disponível em: http://www12.senado.gov.
br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/textos-para-discussao/
td-70-avaliacao-de-impacto-legislativo-no-brasil Acesso em 22 de abr. 2014. Não
se adota, aqui, esta distinção, por se entender que, em verdade, trata-se do mesmo
RAFAEL VÉRAS DE FREITAS 647
Nesse cenário, o objeto do presente ensaio é apresentar algumas expe-
riências alienígenas e um substrato doutrinário acerca da utilização do
referido instrumento de avaliação da qualidade da regulação para o im de
levar a efeito a análise da Resolução Normativa nº 540, de 12 de Março de
2013, da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), que, ao aprovar
a Norma de Organização nº 40, dispõe sobre a realização da Análise do
Impacto Regulatório no âmbito desta agência.
Esse objeto de investigação se justiica na medida em que o setor
elétrico, em razão de sua essencialidade, está, diretamente, relacionado
ao desenvolvimento da indústria nacional e, por conseguinte, ao desenvol-
vimento do país. Além disso, trata-se de um setor que constantemente vem
passando por crises relacionadas ao sistema de abastecimento energético
nacional – a exemplo da oriunda dos déicits das Contas de Resultados a
Compensar (CRC), dos anos 1980, e do racionamento vivido pelo país em
2001. Daí porque a instituição de um adequado instrumento de avaliação
da qualidade da regulação para esse setor se mostra tão relevante.
Outra razão para o aprofundamento da avaliação da qualidade da regu-
lação no setor elétrico está relacionada ao fato de se tratar de um setor que
fora objeto de desverticalização (unbundling), determinação trazida pela
Lei nº 9.074/1995, que impedia que um mesmo agente econômico atuasse
nos segmentos de geração, transmissão, distribuição e comercialização.
Além disso, tal setor é composto por uma plêiade de agentes [por
concessionários, autorizatários, Produtores Independentes de Energia
mecanismo aplicado sobre objetos distintos. Ademais, no âmbito internacional,
aplica-se a AIR sobre atos normativos primários e secundários indistintamente.
Nesse sentido: RODRIGO, Délia Rodrigo. Regulatory Impact Analysis in OECD
Countries: Challenges for Developing Countries. Disponível em: http://www.
oecd.org/gov/regulatory-policy/35258511.pdf Acesso em: 22 de abr. 2014. A
autora explica que os parlamentos têm a responsabilidade formal de revisar e
aprovar uma legislação primária, sendo por isso importante que eles estejam
intimamente integrados em sistemas e processos de qualidade regulatória. A
abordagem do Parlamento de examinar a legislação deve ser claramente alinhada
com os procedimentos de qualidade regulamentares adotados pelo Executivo, que
devem reforçar-se mutuamente. A informação obtida através de AIR tem de ser
tida em conta. Tão logo os parlamentos percebam a importância da AIR, esta pode
fornecer um apoio inestimável para o desempenho de suas funções. Por sua vez,
os reguladores independentes são responsáveis por fazer regras ou interpretá-
los, devendo na realização desse mister operar sob as mesmas disciplinas que os
outros tomadores de regras, nomeadamente no que diz respeito à AIR.

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