Aplicação do incidente de resolução de demandas repetitivas para as ações coletivas: um terceiro caminho pautado na isonomia

AutorLaís Fernandes Almeida
CargoPós graduada em Direito Processual pela Universidade Federal de Juiz de Fora/MG
Páginas240-281
Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP. Volume 16. Julho a dezembro de 2015
Periódico Semestral da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira. ISSN 1982-7636. pp. 240-281
http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/redp/index
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APLICAÇÃO DO INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS
REPETITIVAS PARA AS AÇÕES COLETIVAS: UM TERCEIRO CAMINHO
PAUTADO NA ISONOMIA
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THE APPLICATION OF REPETITIVE PROCEEDINGS TO CLASS ACTIONS:
THIRD WAY BASED ON EQUALITY
Laís Fernandes Almeida
Pós-graduada em Direito Processual pela Universidade
Federal de Juiz de Fora/MG.
lais_fernandes_jf@hotmail.com
RESUMO: O presente artigo se propõe a analisar o ditame do art. 976, CPC 2015 que prevê
aplicação do incidente de resolução de demandas repetitivas. A adoção deste mecanismo
demonstra o apreço pelas decisões uniformes e a necessidade de conter o contingente de
causas que obstrui do judiciário e privilegiar a celeridade. O incidente aplica-se também às
demandas coletivas, de tal modo que remedia, mas não repara a injustiça ocasionada pela
previsão do art. 16, LACP que cria mecanismo inconstitucional e desprovido de suporte
teórico, pelo qual a coisa julgada sobre restrição territorial. O incidente pode servir de auxílio
para melhor delinear os direitos individuais homogêneos e os direitos repetitivos.
PALAVRAS-CHAVE: Igualdade; CPC 2015; incidente de resolução de demandas
repetitivas; ação coletiva.
ABSTRACT: The goal of this dissertation is to analyse the new discipline of repetitive
demands, brought by art. 976, CPC. The adoption of this mechanism shows the value of
iguality in decisions and the urgent need to manage the number of causes which are causing
many difficulties for a fast and equal solution. The new mechanism can be apllied to
demands similar to class actions and the result is more equality despite of the injustice
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Artigo recebido em 16/08/2015 e aprovado em 27/11/2015.
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Artigo produzido sob orientação do Prof. Dr. Márcio Carvalho Faria e Profa. Dra. Clarissa Diniz Guedes.
Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP. Volume 16. Julho a dezembro de 2015
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brought by the application of art. 16, LACP, which is against national constitution because
restrict res iudicata in a certain territory.
KEYWORDS: Equality; CPC 2015; discipline of repetitive demands; class actions.
SUMÁRIO: 1. Contexto histórico. 1.1. Incidente e a realização de justiça e isonomia. 2.
Precedentes. 3. O incidente. 3.1. Da confusão teórica. 3.2. Conceito de demandas repetitivas.
3.3. Grinover: uma visão apurada sobre o direito coletivo. 3.4. Primeiro requisito de
aplicação do IRDR: repetição da questão de direito. 3.5. Segundo requisito: risco de ofensa
à isonomia e à segurança jurídica. 3.6. Procedimento. 4. Aplicação do incidente. 4.1. A
aplicação da tese jurídica comum. 4.2. A distinção entre ação coletiva e o IRDR. 5. Tutela
Coletiva. 5.1. Coisa julgada na tutela coletiva. 5.2. Um direito para cada lugar? 5.3.
Precedente X Coisa julgada. 6. Conclusão. 7. Referências bibliográficas.
1 CONTEXTO HISTÓRICO
Inicialmente, o processo era marcado por um perfil individualista, influenciado pelo
liberalismo; as regras do CPC/73 foram estruturadas para resolver conflitos individuais. Este
posicionamento se revelou inadequado para a resolução dos conflitos atuais, que muitas
vezes repetem situações pessoais idênticas, que tramitam paralelamente a despeito da
coincidência das ações quanto ao objeto e na razão de seu ajuizamento.
A atividade econômica moderna, em virtude do desenvolvimento do sistema de
produção e distribuição seriada de bens levou à insuficiência do Judiciário para atender ao
crescente número de feitos repetitivos. As regras do CPC/73 se revelaram inaptas, de modo
que se passou a adotar mecanismos de tutela de direitos coletivos.
Leonardo da Cunha (2011, p. 257) argumenta que estas ações coletivas não são
capazes de abranger todas as situações repetitivas. Primeiro porque não há legitimados
suficientes para tratar de todas as situações massificadas. Segundo, ações coletivas não são
admitidas em alguns casos, como para tratar de matéria tributária e FGTS, por exemplo, por
expressa exclusão feita pela Medida Provisória 2.180-35/2001. Terceiro, porque o regime
aplicável à “coisa julgada coletiva contribui para que as questões repetitivas não sejam
definitivamente solucionadas”, nos dizeres de Cunha (2011, p. 258), já que, em sendo
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julgado procedente o pedido, ou improcedente por instrução insuficiente, haverá coisa
julgada para os legitimados coletivos mas poderão ser propostas demandas individuais para
proteger o direito individual dos sujeitos; julgado improcedente por falta de provas, não
ocorre coisa julgada, de modo que qualquer legitimado coletivo poderá repropor a demanda
e ainda serão possíveis as demandas individuais. Ou seja, havendo improcedência, por
qualquer razão, não fica vedado ajuizamento de ação individual
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O autor, contudo, esqueceu-se de que nem toda demanda repetitiva é direito coletivo,
o que será objeto de estudo mais à frente. Assim, o problema relativo ao volume de trabalho
ocasionado pelas demandas repetitivas, muito recorrentes atualmente, não poderia de
qualquer sorte ser resolvido pelos mecanismos de tutela coletiva, porque nem todo direito
repetido pode ser tratado em ação coletiva – nem todo direito repetido é “coletivizável”.
Os direitos difusos e coletivos strictu sensu não podem ser protegidos por demandas
individuais; o titular de direito difuso não pode sequer ajuizar uma ação individual. Assim,
o problema gira em torno dos direitos individuais homogêneos, dada a dificuldade de sua
delineação e considerando que poderão ser tratados tanto por ação individual quanto por
ação coletiva.
Ademais, Leonardo da Cunha (2011, p. 261) destaca que a restrição da eficácia
subjetiva da coisa julgada em ação coletiva, prevista no art. 16 da lei 7.347/1985 e pelo art.
2-A da Lei 9494/1997 “impõe uma limitação territorial e uma indevida fragmentação dos
litígios”, contrariando as razões de ser da tutela coletiva, que visa a concentrar a discussão
em uma única causa e decidi-la de modo uniforme. Este aspecto será analisado mais
detidamente.
A preocupação com a efetividade trouxe consigo a necessidade de os trâmites
processuais se adaptarem ao fenômeno de massificação de demandas. O volume representou
um grande entrave não só à resolução dos litígios massificados como de todos os outros, pela
dificuldade em se uniformizar a discussão, concentrar a lide, e contornar os problemas
relacionados aos conflitos de competência do art. 16, LACP, de modo que toda a atividade
jurisdicional ficou comprometida. Este resultado fica claro quando refletimos sobre a
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O argumento mais formal para não indução de liti spendência é o de que em uma ação o pedido é coletivo
(difuso, coletivo stricto sensu ou individual homogêneo) e, na outra, o pedido é individual. Mas o direito
individual homogêneo é, teorica mente, divisível, apesar d a repercussão social que marca-o como direito
coletivo. Este posicionamento, pensando na proteção substancial do direito, também prestigia o princípio d a
inafastabilidade da tutela jurisdicional, art. 5º, XXXV, CRFB. O primeiro argumento é explica do por Costa e
Lascala (2010, p. 4).

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