Apresentação
Autor | Ana Carolina Brochado Teixeira/Joyceane Bezerra de Menezes |
Páginas | 5-8 |
APRESENTAÇÃO
O reconhecimento dos direitos de personalidade e a soma dos direitos fundamentais
lastreados no princípio-garantia dignidade da pessoa humana não tem sido suficientes para
debelar as práticas sociais discriminatórias em virtude de fatores como gênero, idade e
deficiência. Persiste no imaginário social, a figura do sujeito de direitos abstrato ilustra-
do por sua normalidade e autonomia insulares que findam por diminuir e invisibilizar
aquela pessoa que traz consigo um ou vários traços de vulnerabilidade.
Quando elementos como gênero e deficiência se associam à certa condição social,
nacionalidade e cor, potencializam as práticas de discriminação e de opressão das identi-
dades, desafiando as doutrinas antidiscriminatórias. A sinergia entre essas diversas fontes
de discriminação demanda que o enfrentamento também se faça de forma sistêmica,
segundo o paradigma da interseccionalidade.
Nessa perspectiva, a análise de gênero e deficiência como critérios de discrimi-
nação e vulnerabilidade no âmbito do direito privado, esbarrará, inequivocamente, na
interseccionalidade – ou seja, na interação sinergética entre diversas modalidades de
discriminação que vulnera ainda mais a pessoa. Mais vulnerável e espoliado em sua auto-
nomia será aquele que sofre os efeitos dos múltiplos fatores de opressão e discriminação.
A condição da mulher negra, de baixa renda, com deficiência pode se tornar ainda
mais gravosa se ela for idosa; pessoa com deficiência que também é transgênero sofrerá
maior sorte de preconceito. Isso força a conclusão de que a classificação das pessoas em
grupos específicos, segundo o gênero, a idade ou a deficiência não formará coletivos
homogêneos. Em cada um deles, haverá pessoas que sofrem mais severamente a dis-
criminação e um maior déficit na sua cidadania pelo entrelaçamento de outros fatores
discriminantes, o que também intensifica a sua vulnerabilidade social.
Neste grande grupo formado pelo gênero feminino, há aquelas mulheres que se
assentam em lugares altos e gozam de franca autonomia no ambiente doméstico e pro-
fissional, enquanto muitas outras vivem imersas em um sistema de opressão doméstica,
social e/ou econômica do qual não consegue se libertar. No Brasil, o vasto rol dos tra-
balhadores informais, considerados altamente vulneráveis pela ausência de vínculos e
condições dignas de trabalho, representa 38% (trinta e oito por cento) da população e
desse contingente, 64% (sessenta e quatro por cento) são mulheres negras.1
1. Dados consolidados pela Folha de São Paulo dão conta de que 38% da população é considerada altamente
vulnerável, em razão da informalidade de seus vínculos. Tratam-se de trabalhadores sem carteira assinada
que atuam em empresas, realizam serviços domésticos ou que trabalham por iniciativa própria sem re-
gistro formal. Nesse universo, as mulheres negras ocupam a faixa de 64%. Crise do coronavírus acentua
desigualdade de gênero e cor. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/04/crise-do-
-coronavirus-acentua-desigualdade-de-genero-e-cor-diz-estudo.shtml?utm_source=whatsapp&utm_me-
dium=social&utm_campaign=compwa. Acesso em: 26/04/2020.
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