Os Arcos Dentários na Identificação

AutorJorge Paulete Vanrell
Ocupação do AutorMedicina, Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais e Licenciatura Plena em Pedagogia
Páginas539-558

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Identificação pelos dentes

Não existem duas pessoas com a mesma dentição.

Essa é uma verdade que resulta das inúmeras variáveis individualizadoras que oferecem as peças dentárias, e que tornam impossível o fato de que duas pessoas tenham dentaduras idênticas. Daí que exista uma tendência crescente, em Medicina Legal e Forense, de aplicar procedimentos odontológicos para auxiliar nos problemas de identificação.

Atualmente, os dentes se erigem em elementos singulares na identificação odonto-legal. Talvez sua importância nesse sentido decorra da extraordinária resistência das peças dentárias às situações que, em geral, produzem a destruição das partes moles, como a putrefação e as energias lesivas (agentes traumáticos, energias físicas, energias químicas, etc.).

Uma das situações em que a identificação dos dentes oferece singular importância são os casos de grandes catástrofes ou desastres coletivos, infelizmente assaz frequentes.

Nesses eventos infortunísticos, os cadáveres sofrem ações destruidoras, quer pela fragmentação, quer pelo incêndio do local, o que impede que se ponham em prática os procedimentos mais elementares de reconhecimento, como os traços fisionômicos, a identificação papiloscópica ou outros análogos.

Um dos casos mais momentosos, ocorrido no Brasil em 1985, em que a contribuição da odontologia legal foi decisiva, foi o da identificação dos restos mortais do médico alemão Josef Mengele, cognominado o “Anjo da Morte”, responsável pela morte de milhares de pessoas, confinadas no campo de concentração de Auschwitz, durante a 2ª Guerra Mundial.

Em catástrofes aéreas, como as acontecidas com o grupo musical “Mamonas Assassinas”, em 02 de março de 1996, ou entre os 99 passageiros

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do avião da TAM que caiu em São Paulo, em 31 de outubro de 1996, a identificação, em grau de certeza, só foi possível com base nos dados oferecidos pelo exame odontológico, em 75 dos casos, sendo que apenas nos casos restantes a identificação se procedeu pelo exame de DNA ou outros procedimentos.

É que as informações que podem ser obtidas mediante o exame dos dentes não se limitam a checar os achados no cadáver com os registros nas fichas odontológicas, verificando tratamentos dentários ou outras informações clínicas.

Mesmo quando nada se tem, mesmo quando a vítima nunca realizou tratamentos dentários, mesmo quando sequer consultou com um profissional, as informações que se podem obter do exame dental dos restos encontrados, conquanto seja uma ossada ou fragmentos dos ossos do esplacnocrânio (viscerocrânio), podem até orientar sobre dados úteis na investigação policial. Além de identificar se se trata de ossos e dentes da espécie humana, o mesmo estudo pode fornecer informações a respeito da vítima que possibilitem a individualização, mormente quando há noticiados casos de desaparecimento. Nesses casos os dentes podem oferecer dados sobre o cadáver, como:

• espécie, • grupo racial, • sexo, • idade, • altura, • dados particulares, • determinadas profissões.

Espécie

É obvio que ninguém questionaria o diagnóstico da espécie à qual pertencem certas peças dentárias, quando as mesmas se encontram fixadas nos respectivos alvéolos. Basta analisar superficialmente o crânio ou a mandíbula, para detectar que aquele ou esta é ou não de um ser humano.

De fato, o diagnóstico da espécie só se constitui em problema quando apenas temos uma ou mais peças dentárias, isoladas. O que interessa, nesses casos, é saber se referidos dentes pertencem ou não à espécie humana. Caso não sejam humanos, normalmente falece o interesse do Odontolegista, a menos que existam razões supervenientes.

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A característica morfológica fundamental, privativa dos dentes humanos e que os torna diferentes dos de quaisquer outras espécies animais, é que nos dentes humanos a coroa e a raiz se encontram em um mesmo plano, apresentando-se como segmentos de hastes retas.

Contrariamente, nos animais, a raiz sempre descreve curvas, exibindo uma grande angulação. Apenas os macacos antropóides mostram uma certa semelhança, mormente nos incisivos e caninos. Nesses raros casos, tão-somente, será necessário um exame mais minudente e, por vezes, será preciso recorrer à Zoologia (Anatomia Comparada).

Em se tratando de fragmentos de peças dentárias, o exame microscópico pode realizar-se mediante um corte sagital e observação por epi-iluminação, usando um microscópio igual ao utilizado em metalurgia. Com tal técnica os dentes humanos mostram características exclusivas, tais como:

• os prismas do esmalte são ondulados; • referidos prismas são paralelos e perpendiculares à dentina; • esses prismas têm largura média de 5 m e comprimento de 2 mm; • os prismas apresentam estrias escuras transversais em intervalos regulares de aproximadamente 4 m;

• a linha de união entre o esmalte e a dentina exibe um aspecto em guirlanda.

Grupo racial

As principais características raciais encontram-se presentes, especialmente nos molares, por meio dos quais é possível diferenciar as raças ortognatas (brancos ou caucasóides), prognatas (negros, melanodermas e faiodermas) e as denominadas raças primitivas (aborígenes australianos, de Oceania etc.), que em geral se caracterizam por apresentar prognatismo maxilar variável, mas expressivo.

Nessa esteira, as raças ortognatas apresentam:

• nos molares superiores, as cúspides palatino-distais muito pequenas, quando comparadas com as cúspides meso-palatinas. Não obstante, ambos os grupos de cúspides encontram-se separados pelo sulco principal, constituído por uma depressão bem marcada;

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• o primeiro molar inferior conservando apenas uma marca leve da soldadura da cúspide posterior;

• o segundo e terceiro molares inferiores não têm cúspides posteriores diferenciadas.

As raças prognatas, por sua vez, têm:

• nos seus molares superiores, as cúspides palatino-distais de bom tamanho; e

• nos molares inferiores, uma cúspide posterior diferenciada.

As raças primitivas exibem molares inferiores semelhantes aos dos macacos chimpanzés.

O índice dentário se calcula utilizando-se fórmulas; uma das mais difundidas é a de FLOWER:

(Comprimento em reta entre borda mesial de 1º pm e borda distal do 3º m) x 100 / Distância básio-násio

O índice de Flower é útil para estabelecer diferenças entre grupos humanos, segundo a distribuição a seguir:

Não...

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