Artigos 468 a 470

AutorCinara Rosa Figueiró
Páginas335-349

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Cinara Rosa Figueiró

Juíza do Trabalho no TRT-RS. Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela UNISC-RS.

CAPÍTULO III

DA ALTERAÇÃO

O contrato de trabalho é de trato sucessivo e vocacionado à vigência por prazo indeterminado, por isso está sujeito a alterações que modificam os direitos e obrigações ajustadas pelas partes, de modo a adequá-lo às necessidades que surgem periodicamente. Estas alterações podem ser objetivas ou subjetivas, sendo que sua validade depende da observância de determinadas condições.

A Reforma Trabalhista, introduzida pela Lei n. 13.467 de 2017, entrou em vigor em novembro de 2017, trazendo inúmeras alterações nos dispositivos da CLT. A aplicação das novas regras aos contratos de trabalho celebrados anteriormente e que permanecerão vigentes deve passar por uma análise criteriosa, observando o direito adquirido, os atos já realizados (art. 5º, inciso XXXVI, CF) e a impossibilidade da lei em gerar efeito retroativo.

Logo após o início da vigência da Lei n. 13.467 de 2017, em 14 de novembro de 2017, foi editada a Medida Provisória n. 808 de 2017, que estabeleceu alterações no texto legal. A Medida Provisória produz efeitos jurídicos desde a data da sua publicação, mas sua transformação em lei dependia de aprovação do Poder Legislativo, tendo o Congresso Nacional, prazo de 60 dias, prorrogáveis uma única vez, por igual prazo, para aprovar, alterar ou rejeitar o texto apresentado pelo Presidente. Após ser aprovada por ambas as Casas do Congresso Nacional, a Medida Provisória retornaria para sanção do Presidente e, a partir de então, passaria a vigorar como Lei Federal. Caso fosse rejeitada pelo Congresso Nacional ou não aprovada no prazo de 120 dias, caberia aos congressistas editar decreto legislativo para assentar os efeitos da Medida Provisória em seu período de vigência.

No que tange aos efeitos da nova legislação, o art. 2º da Medida Provisória n. 808 de 2017, criou regra de temporariedade e estabeleceu que o disposto na Lei n. 13.467 de 2017 se aplica, na integralidade, aos contratos de trabalho vigentes, com a finalidade de impor aos contratos de trabalho em curso todas as disposições.

A aplicação das regras introduzidas pela Lei n. 13.467 de 2017, bem como da previsão introduzida pela Medida Provisória n. 808 de 2017, deve ser interpretada, inicialmente, em conformidade com a Constituição da República, em especial o disposto nos arts. 5º, inciso XXXVI e 7º, caput, que traduzem o Princípio da Condição Mais Favorável, retratado, em âmbito infraconstitucional, no art. 468 da CLT. Vale ressaltar, também, que as regras de direito intertemporal do art. 15 do CPC são aplicáveis ao Processo do Trabalho, como faculta o art. 769 da CLT.

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Nesse exame, o disposto no art. 468 da CLT assume decisiva importância como um filtro para identificar, no caso concreto, as hipóteses em que as alterações são prejudiciais, direta ou indiretamente, ao trabalhador, bem como se ocorrem por mútuo consentimento entre as partes, dentro dos limites ditados pela Lei e pela Constituição da República.

Art. 468 – Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

§ 1º Não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício de função de confiança.

§ 2º A alteração de que trata o § 1º deste artigo, com ou sem justo motivo, não assegura ao empregado o direito à manutenção do pagamento da gratificação correspondente, que não será incorporada, independentemente do tempo de exercício da respectiva função. (Incluído pela Lei n. 13.467 de 2017)

Entre os princípios gerais de Direito estão o da irretroatividade das leis e da aplicação imediata da lei nova, sendo que, no Direito do Trabalho, deve ser acrescido o princípio da condição mais benéfica e da vedação à alteração contratual lesiva.

Nesse aspecto, a regra que proíbe a alteração contratual lesiva ao empregado continua valendo, na forma do caput do art. 468 da CLT, sendo aconselhável a análise ponto a ponto, inclusive das peculiaridades de cada contrato celebrado, para introduzir as modificações trazidas pela Lei n. 13.467 de 2017. Efetivada a alteração, o ideal é que o ajuste seja repactuado por escrito, com expressa concordância do empregado.

A Reforma não alterou o art. 3º da CLT, quando estabelece que o empregador assume os riscos da atividade econômica e, observados certos limites, pode introduzir alterações não substanciais nas condições de trabalho. As alterações capazes de gerar maior controvérsia são aquelas que dizem respeito ao que foi ajustado quanto à forma e quantidade de remuneração, ao local de trabalho e às funções do emprego.

A obrigação de prestar trabalho, embora determinada qualitativa e quantitativamente, traz em si certa indeterminação no conteúdo das prestações singulares, podendo o empregador de forma válida no exercício do poder de comando estabelecer regras para disciplinar a execução normal do trabalho.

A modificação introduzida no artigo 468, não alterou a regra geral, de que o contrato de trabalho não pode ser modificado unilateralmente pelo empregador, buscando concretizar o princípio da proteção ao hipossuficiente que inspira o Direito do Trabalho. Essa limitação somente é afastada nas hipóteses legais e nos casos de flexibilização facultada pela Constituição da República, mediante convenção ou acordo coletivo. Da mesma forma, restou mantida a disposição de que a licitude das alterações está condicionada ao mútuo consentimento e ausência de prejuízos ao empregado, diretos ou indiretos, como pressupostos de legalidade das alterações contratuais.

Questão que já se mostrava tormentosa e deve ganhar força está em estabelecer o limite do jus variandi do empregador e, em contraponto, o alcance do jus resistentiae do empregado, que pode se opor a determinações ilícitas oriundas do empregador e, em algumas situações específicas, até mesma àquelas que são lícitas.

Diante das alterações trazidas pela Lei n. 13.467/2017, será intensificada a discussão quanto a esses limites, em especial no que diz respeito à observância do equilíbrio nas relações contratuais, que é assegurado pela Constituição da República. A controvérsia foi ampliada pelo disposto no art. 2º da Medida Provisória n. 808 de 2017, que estabeleceu efeitos imediatos nos contratos em curso.

Nesse cenário, deve-se afirmar que as alterações serão lícitas, em princípio, se forem bilaterais e não acarretarem prejuízo ao empregado. Por outro lado, as alterações unilaterais somente serão toleradas se realizadas no exercício regular do jus variandi.

No que tange ao regulamento de empresa, embora suas cláusulas sejam originalmente estabelecidas de forma unilateral pelo empregador, aderem, de forma tácita ou expressa, ao contrato de trabalho, passando a integrar os contratos individuais, fazendo surgir para os empregados garantia quanto a alterações prejudiciais, regra que foi mantida pela nova lei e que não se alterou pela Medida Provisória n. 808 de 2017. Nessa linha, o entendimento vertido na Súmula n. 51 do E. TST.

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Desta forma, o critério adotado para validar ou não as alterações contratuais promovidas pelo empregador permanece sendo o prejuízo experimentado pelo empregado, ainda que elas resultem de mútuo consentimento. Este prejuízo poderá ser direto quando diminui o patrimônio atual do empregado ou indireto quando impede um acréscimo que era esperado normalmente por ele. O prejuízo pode ser ou não de natureza econômica, bastando que seja efetivo e identificável. Assim, o prejuízo pode ter natureza patrimonial, atingindo a remuneração do empregado, bem como pode ser de natureza funcional ou de natureza moral ou psicológica, hipótese em que uma alteração que aparentemente é vantajosa, na prática, pode revelar-se, prejudicial ao empregado, inclusive em projeção futura. Destarte, para análise do prejuízo é indiferente que seja imediato ou mediato ou que seja previsível ou não no ato da novação.

A aplicação imediata das alterações, na forma prevista no art. 2º da Medida Provisória n. 808 de 2017 não pode ir ao ponto de afrontar à garantia do direito adquirido e ao ato jurídico perfeito (art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição da República e art. 6º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro); à valorização do trabalho humano (art. 170, caput, da Constituição da República); a função social do contrato (art. 121, do Código Civil); aos princípios da probidade e da boa-fé (art. 422 do Código Civil). Vale lembrar, ainda, que o art. 9º da CLT dispõe que são nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos nas normas trabalhistas, e que o art. 468 da CLT, conforme já exposto, veda alteração contratual em prejuízo ao trabalhador.

Assim, no exercício do jus variandi, que está amparado no poder de comando, tem sido facultadas pequenas alterações unilaterais que não retratem alteração significativa e não importem em prejuízo ao empregado. No entanto, ele deve ser exercitado com razoabilidade, não se tratando de um direito absoluto, servindo de parâmetro para identificar todas as espécies de abusos ou desvios que possam ser cometidos pelo empregador, critérios que não foram modificados pela Reforma ou foram alcançados pelo art. 2º da Medida Provisória n. 808 de 2017. Nesse particular, a lei garante ao empregado o direito de se opor às modificações que lhe causem prejuízos ou sejam ilegais, que é definido como jus resistentiae.

A Reforma Trabalhista implementa a lição de GRILLO, ao destacar do ponto de vista econômico, que propõe uma maior flexibilidade para a modificação das condições de trabalho, há uma ampliação do poder diretivo com a...

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