ARTS. 93 A 113

AutorMarcelo Carvalho Melo
Páginas333-373
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TÍTULO VI
Dos Crimes
Marcelo Carvalho Melo
Promotor de Justiça titular da Promotoria de Justiça junto à 3ª Vara Criminal de Campos
dos Goytacazes.
A Lei 10.741, de 01 de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), afora cuidar dos
direitos fundamentais da pessoa idosa, das medidas de proteção, da política de
atendimento ao idoso e do acesso à justiça, dedicou-se à disposição de preceitos de
natureza penal.
Assim, além de promover alterações no Código Penal (Decreto-Lei 2.848, de
07 de dezembro de 1940), na Lei das Contravenções Penais (Decreto-Lei 3.688, de
03 de outubro de 1941) e na Lei 9.455, de 07 de abril de 1997, reservou seu Título
VI para o tratamento da matéria, inclusive com a criação de tipos penais.
CAPÍTULO I
Disposições Gerais
Art. 93. Aplicam-se subsidiariamente, no que couber, as disposições da Lei
7.347, de 24 de julho de 1985.
Nota-se que o presente dispositivo estabelece a Lei 7.347/1985, que disciplina
a ação civil pública, como fonte de aplicação subsidiária em relação ao Estatuto do
Idoso. Pretendeu, portanto, o legislador suprir omissões acaso existentes no Estatuto
do Idoso mediante a aplicação das normas constantes da Lei 7.347/1985.
Não obstante, tratando-se a Lei 7.347/1985 de diploma legal de índole eminen-
temente processual civil, afigura-se imprópria a inserção do dispositivo em comento
na parte do Estatuto do Idoso orientada à disciplina das questões penais.
Na verdade, ao que parece, a inadequada localização do dispositivo decorre de
equívoco na formatação do texto legal. Dada a pertinência da matéria, certamente
tal dispositivo estaria melhor posicionado no Capítulo III do Título V do Estatuto
do Idoso, que versa sobre a proteção judicial dos interesses difusos, coletivos e in-
dividuais indisponíveis ou homogêneos.
Essa conclusão é reforçada quando se observa que outros dispositivos legais
padecem do mesmo problema de posicionamento, estando deslocados para os agru-
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ART. 93
ESTATUTO DO IDOSO: COMENTÁRIOS À LEI 10.741/2003
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pamentos de artigos, capítulos ou títulos imediatamente posteriores àqueles em que,
pelo conteúdo dos preceitos veiculados, deveriam estar situados.
Ao que tudo indica, os desvios topográficos principiaram-se com o art. 72. Este
dispositivo, que foi objeto de veto presidencial, previa a observância do procedi-
mento sumário do Código de Processo Civil de 1973, então vigente, nos processos
em que fosse parte ou interveniente pessoa idosa. Contudo, acabou por ser incluído
no início Capítulo II do Título V, que trata do Ministério Público, e não no final Ca-
pítulo I do Título V, que cuida das disposições gerais, onde, por coerência, estaria
melhor alocado.
A partir de então, constata-se uma verdadeira cadeia de equívocos, com os úl-
timos dispositivos de cada capítulo sendo transportados para aqueles diretamente
subsequentes.
Foi o que ocorreu não só com o art. 93, de que ora se cuida, mas também com
os arts. 78,1 952 e 109,3 sendo todos eles indevida e invariavelmente movidos para o
início dos agrupamentos seguintes àqueles dos quais deveriam constar.
Perceba-se que, embora contenha previsão atinente ao Ministério Público,
o art. 78 deixou de constar do correlato Capítulo II do Título V, sendo trans-
posto para o capítulo sucessivo, que, por sua vez, aborda a proteção judicial
dos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis ou homogêneos.
Igualmente, o art. 95, que inegavelmente compreende disposição geral, passou
a figurar no Capítulo II do Título VI, que discorre sobre os crimes em espécie.
Finalizando a série de enganos, o tipo penal do art. 109 deixou de integrar o
capítulo dos crimes em espécie, passando para o Título VII, que diz respeito às
disposições finais e transitórias.
Todavia, malgrado a falha apontada possa causar estranheza e, à primeira
vista, até mesmo certa dificuldade de compreensão, exigindo maior esforço do
intérprete, decerto não tem o condão de comprometer a aplicabilidade de qualquer
das normas.
Logo, em que pese o desacerto, a norma do art. 93 é plenamente aplicável,
devendo-se buscar, portanto, na Lei 7.347/1985, a solução para lacunas eventual-
mente identificadas no Estatuto do Idoso, notadamente no que concerne à tutela
dos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis ou homogêneos.
1. Art. 78. As manifestações processuais do representante do Ministério Público deverão ser fundamentadas.
2. Art. 95. Os crimes definidos nesta Lei são de ação penal pública incondicionada, não se lhes aplicando
os arts. 181 e 182 do Código Penal.
3. Art. 109. Impedir ou embaraçar ato do representante do Ministério Público ou de qualquer outro agente
fiscalizador:
Pena: reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.
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ART. 94
MARCELO CARVALHO MELO
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Art. 94. Aos crimes previstos nesta Lei, cuja pena máxima privativa de li-
berdade não ultrapasse 4 (quatro) anos, aplica-se o procedimento previsto
na Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, e, subsidiariamente, no que cou-
ber, as disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal.
A Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, em conformidade com o previsto no
art. 98, I, da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/1988),4 dispôs
sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, prescrevendo em seu art. 61,5 com
a redação dada pela Lei 11.313/2006, considerarem-se infrações penais de menor
potencial ofensivo as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena má-
xima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa.
Por isso, o comando do art. 94, ao determinar a aplicação do procedimento
previsto na Lei 9.099/1995 aos crimes estipulados no Estatuto do Idoso cuja pena
máxima privativa de liberdade não ultrapasse 4 (quatro) anos, gerou profunda con-
trovérsia, propiciando o surgimento dos mais variados entendimentos.
Houve, inclusive, quem sustentasse que o advento do aludido dispositivo teria
acarretado a redefinição do conceito de infração de menor potencial ofensivo, com
a ampliação de sua abrangência para contemplar todos os crimes com pena máxima
privativa de liberdade não superior a 4 (quatro) anos.
A questão acabou sendo objeto de exame pelo Supremo Tribunal Federal no
julgamento da ADI 3.096. Na ocasião, a Excelsa Corte decidiu conferir ao art. 94
interpretação conforme à Constituição para determinar a aplicação somente do
procedimento sumaríssimo previsto na Lei 9.099/1995 aos crimes do Estatuto do
Idoso cuja pena máxima privativa de liberdade seja superior a 2 (dois) anos e não
ultrapasse 4 (quatro) anos, ficando impossibilitada, nesses casos, a incidência de
quaisquer das medidas despenalizadoras consagradas naquele diploma legal.
Assentou-se, assim, a concepção de que o idoso seria favorecido com a celeri-
dade processual, mas o autor do crime, por outro lado, não seria beneficiado com
as medidas despenalizadoras previstas na Lei 9.099/1995, ficando inviabilizada a
aplicação da composição civil dos danos, da transação penal e da suspensão condi-
cional do processo.
Buscou-se, desse modo, conferir ao art. 94 interpretação que favorecesse o
idoso, obstando a concessão de tratamento mais benevolente aos autores de crimes
4. Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:
I – juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o
julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial
ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a
transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;
5. Art. 61. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contra-
venções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não
com multa.
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