As ações reais dominiais

AutorAntonio Sérgio Liporoni/Luiz Paulo Orelli Bernardi/Odair Martins Benite
Páginas129-206

Page 129

Ação real é toda aquela que garante o exercício de um Direito Real das pessoas consoante proteção da legislação.

Direito Real é aquele que estabelece relação das pessoas com as coisas, com algo certo, substancial e palpável. No trabalho já citado de Jorge Tarcha, temos uma boa definição sobre o tema: “Essa coisa, que em latim se denomina res, e que se destaca agora. Por isso esse direito, que leva em conta a relação das pessoas com as coisas, chama-se direito real”.

E essa relação das pessoas pode ser com vários tipos de coisas, desde um objeto, uma vestimenta, um automóvel, um mobiliário e, nesse caso, denomina-se Direito Real Mobiliário.

O caso no qual as ações necessitam de perícia é aquele que envolve uma relação entre pessoas e um imóvel: uma área de terreno com ou sem benfeitorias. Chamamos esta relação de Direito Real Imobiliário.

E, como o direito real que uma pessoa tem para com um imóvel é o próprio domínio, as ações decorrentes, que se socorrem neste direito, são as ações reais dominiais, que constituirão o tema abordado.

Page 130

Para os fins de perícia, são consideradas ações reais dominiais aquelas que exigem a intervenção do expert em: 1. Ações reivindicatórias; 2. Ações demarcatórias; 3. Ações divisórias; 4. Ações de extinção de condomínios; 5. Ações retificatórias de registros; 6. Ações desapropriatórias; 7. Ações discriminatórias.

Essas ações também podem ser cumuladas com outros pedidos do tipo demolitórias, com perdas e danos, com refazimento de benfeitorias etc.

3. 1 Ação Reivindicatória

Reivindicar, reivindicação, do latim res + vim + dicatio = coisa + violência + denúncia. Ato de denunciar a violência a uma coisa.

A ação reivindicatória regia-se pelos arts. 524 e ss. do antigo Código Civil Brasileiro, que dispunha: “Art. 524. A Lei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-los do poder de quem quer que injustamente os possua. Art. 527. O domínio presume-se exclusivo e ilimitado, até prova em contrário”.

Com o Novo Código Civil, esse direito vem regulamentado pelo art. 1.228; que dispõe: “Art. 1.228: O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”.

Mas acrescenta uma série de novidades não contidas no antigo Código nos parágrafos desse artigo: § 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico

Page 131

e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. § 2º São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem. § 3º O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público eminente. § 4º O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nelas houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante. § 5º No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará à justa indenização devida ao proprietário; pago a preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.”

Já no art. 1.231 do atual CC temos o seguinte comando: “A propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em contrário”.

Esse é o caso típico de uma pessoa que, detendo o domínio legal de um imóvel, tendo sobre ele o direito de propriedade, reivindique estes direitos perante o Poder Judiciário contra outra pessoa que o estiver usando, que estiver na posse.

O trabalho pericial, neste caso, terá uma meta principal, que é o estudo dos títulos apresentados pelas partes.

Um, e somente um título, será bom para uma determinada área de terreno. Dois títulos sobre uma mesma área devem levar à suposição de que um deles é viciado, é ilegal. Tecnicamente, é conhecido como sobreposição ou superposição de títulos, que ofende diretamente o princípio da unitariedade de matrícula.

Page 132

Não são raras às vezes em que nos defrontamos com dois títulos do mesmo terreno, com as escrituras passadas pelo mesmo antecessor.

Nesse caso específico muita polêmica já foi gerada com respeito àquele que tem melhor validade. Uns defendem que a data da escritura mais antiga seja a melhor – enquanto outros defendem que é a data do registro.

Nos meios legais costuma-se dizer que “a justiça não socorre os que dormem” e, dentro do mesmo princípio, entendemos que, quando o comprador apresenta a escritura para registro, ele está buscando a proteção judicial ao seu bem e, nesse caso, a data do registro deve determinar o melhor domínio. Em outras palavras, é muito importante observar a cronologia das datas dos registros ao longo do tempo, dos atos e fatos que ocorreram no imóvel, para decidir qual seria o melhor título.

Todo título deve conter a descrição do anterior em obediência ao princípio da continuidade. O vendedor deve declarar com embasamento em que título a área lhe veio ao domínio e isto faz com que haja uma corrente ou continuidade nas transmissões, que é conhecida como cadeia de titularidade dominial ou filiação.

O perito deve ir diligenciando de Cartório em Cartório para formar a filiação desses títulos de transmissão e ir formando um elo na cadeia sucessória das transmissões imobiliárias na linha do tempo.

Melhor será o título que nesse estudo não apresenta defeitos, vícios e falhas nas transmissões, mesmo porque esses defeitos não passam uma esponja no passado, tornando líquido e certo o domínio.

Vale lembrar que estamos diante de um direito real e, nesses casos, toda escritura deve ser outorgada tanto pelo cônjuge-varão

Page 133

como pela sua mulher, a não ser que este possua procuração em Cartório para representá-la.

Aliás, deve ser vista com atenção uma transação efetuada por procuração. Uma escritura outorgada através de um preposto do real proprietário por procuração pública deve enunciar em qual Cartório com livro e folhas essa procuração foi passada.

Muitas vezes, com uma diligência a esse Cartório, pode-se saber que a procuração havia sido cancelada, o que torna as transmissões posteriores sujeitas a cancelamento. Esses casos ocorrem com relativa frequência no Brasil, e portanto, torna-se necessário redobrar a atenção por medida de cautela.

Como já vimos antes, existem outros tipos de escrituras, como por exemplo, uma escritura de cessão de direitos possessórios, escrituras de cessão de direitos hereditários, escritura de doação, escrituras de dação em pagamento etc.

Uma escritura de cessão de direitos hereditários só irá gerar o domínio da fração ideal do vendedor caso a partilha do inventário tenha sido homologada pelo Juízo e apresentada em Cartório para registro. Nesse caso, pode-se comprar a fração a que cada herdeiro tenha direito, até formar o todo e então formalizar-se o domínio exclusivo sobre a totalidade da área. Faltando apenas um dos herdeiros, o domínio recairá sobre fração ideal. E fração ideal é “pro indiviso”, isto é, é sempre uma porcentagem do todo: uma área não localizada ou determinada no campo.

É cada vez mais crescente a dúvida existente na busca de um direito para o ingresso de uma ação judicial com respeito ao discernimento de cada característica própria que tem o domínio e a posse.

Com isso, temos visto a busca da proteção possessória com base no título de domínio. Ingressa-se com uma ação de reintegração

Page 134

de posse apenas porque o autor tem o direito de propriedade, por falta de conhecimento básico do direito basilar Brasileiro.

Muitas vezes vemos que este caminho é tomado devido ao processo possessório favorecer um mandato liminar de reintegração, enquanto que um processo dominial, não possuindo tal vantagem, obriga a percorrer as vias ordinárias desde o início.

Da mesma forma que, num processo possessório, é conveniente ao perito proceder a análise dos títulos dominiais, não com a mesma investigação como numa reivindicatória, como já dissemos, mas daqueles entranhados aos autos, mister se faz também que o perito judicial, no caso da reivindicatória, faça uma análise da posse.

Vemos que, no litígio entre um autor com título dominial contra um requerido com o título precário, ou sem nenhum, a sua defesa, em regra geral, far-se-á na aquisição de sua posse, com tempo suficiente para gerar o usucapião.

Isto porque a vasta jurisprudência já existente permite que tal se faça, de forma que o perito judicial deve fornecer subsídios ao Juiz nesse aspecto também (o Juiz não deverá nomear outro perito apenas para apresentar um estudo a esse respeito. Seria um ônus a mais).

De forma que o perito deve sempre deve analisar essas duas questões. O domínio sendo do autor, mas o requerido mantendo a posse física da área, essa posse tem que ser analisada. Se precária ou de má-fé, então o trabalho pericial estará encerrado.

Se a posse é mansa, pacífica e longeva e o perito tem fundamentado que a posse é de boa-fé, então o requerido terá direito à indenização pelas benfeitorias introduzidas, até mesmo após sentença, com direito de ingressar com embargos de retenção por benfeitorias introduzidas, se a questão permitir.

Page 135

No caso da posse de boa-fé, deve o perito complementar seu laudo com a descrição das benfeitorias existentes e guardar elementos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT