As competências legislativas

AutorMayr Godoy
Ocupação do AutorMestre em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo
Páginas68-79

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No princípio, quando os eleitos pelos homens bons10, da expedição Afonsina, aprovaram as primeiras regras jurídicas criadas pelos europeus, na América, se promulgava, na Casa da Câmara, erguida em São Vicente, em ato jurídico que se impunha a todos, criando a lei, portanto, o direito que iria viger na Colônia que se instalara, aqueles Vereadores de 1532 estavam, na verdade, atribuindo-se uma competência que não lhes fora dada em nenhum foral, nenhuma ordenação ou regimento11, já, que naquela época não havia, em Portugal, onde se fincava o nosso direito, lei constitucional.

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Foi positivada, de forma petulante, a competência com que, por três séculos, as Câmaras Municipais, do Brasil-Colônia, legislaram, sem contestação, criando o direito, que fora respeitado, nos seus limites, como lei pelos administrados.

Essa competência do governo econômico das cidades e vilas, arrogado pelas Câmaras Municipais, foi mantida no Art. 168, da Constituição do Império, que estatuiu, no Art. 102, a competência do governo central: havia, portanto, naquela época, duas competências legislativas em 1824. Dez anos depois com o Ato adicional, foram criadas as Assembleias Provinciais, às quais se atribuiu, no Art. 10, competências legislativas, concedendo competências regionais sem nenhum liame com a antigas capitanias. Isto é apenas histórico, porque as Províncias não tinham autonomia como os Municípios, e, dessa forma, se chegou à República.

Em 15 de novembro de 1889, ao ser decretada a Constituição Provisória e, logo depois, ao ser promulgada a Constituição Republicana de 1891, se acertou conferir aos Estados-membros, então criados sobre as antigas províncias do Império, competências remanescentes, com que exerceram maior autonomia na criação da lei.

Com alguma construção jurisprudencial, a reforma constitucional de 1926 e a Revolução Constitucionalista de 1932, se chegou à Constituinte de 1934, positivando, na Constituição, nela produzida, a tripartição das competências tributárias e, em consonância à divisão dos recursos, as competências para criar a lei; pela erupção do Golpe de 1937, na criação de lei, pouco se exercitou nesse espaço temporal, pois, durante a ditadura, que se arrastou até 1945, todo o Brasil foi governado por decretos-lei.

Em 1947, a Constituição da República Federativa manteve a tripartição de competências tributárias e foram solidificadas as competência legislativas expressas da União e a dos Municípios, mantendo, os Estados, as competências remanescentes, com que

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se chegou até 1967, embora com a edição de atos institucionais, pelo poder militar que se instalou em 1964.

O Regime Militar, dessa época, impôs forte centralização na Constituição do Brasil de 1967 e na Emenda nº 1, de 1969, além da continuidade de edições de atos institucionais e complementares.

A Constituinte de 1987/88 foi influenciada pelos Estados e pelos Municípios; deputados e senadores constituintes sentiram pressão, quebrando-se a tradição das competências expressas e remanescentes, que é o que se verá adiante.

A competência legislativa da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, no Estado Federal, como o Brasil, é repartida na Constituição Federal, como expressão da vontade de todos, segundo o princípio da predominância do interesse.

Excepcionam essa técnica, a competência tributária, na qual os poderes das três esferas estão expressos, cabendo à União, ainda, os poderes remanescentes e a competência na matéria do ensino.

1. A competência da união

Na tradição constitucional republicana brasileira, a União sempre teve competências expressas, implícitas e concorrentes.

Referentemente à competência legislativa, que interessa ao presente enfoque, a União guarda exclusividade em determinadas matérias e não exclusividade em outras, sobre as quais as demais esferas podem legislar, supletivamente. A competência de suplementar o que já foi legislado, e mesmo sobre o branco ainda não normatizado.

A repartição das competências legislativas está diretamente ligada à forma do estado. No caso do Brasil, que é uma república federativa, a repartição, entre os entes federados, das competências legislativas, tem peculiaridades da sua origem e do seu desenvol-

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vimento em nossas constituições, daí, a necessária revisão histórica dos fatos relacionados à construção desse instituto.

A noção clássica da divisão competencial para legislar, nos estados federais, no direito comparado, vem como já se disse, da Constituição Americana de 1787, pela qual os Estados, oriundos das treze antigas colônias inglesas, que se fizeram independentes, entenderam pela forma federativa de estado, e, assim, agregando-se, abdicaram da competência total que detinham, atribuindo, à União, que se formava, competências expressas, reservando para os Estados, então, Federados, não mais independentes, as competências remanescentes. Desse federalismo dualista, da União e dos Estados Federados, surgiu a...

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