As horas in itinere e a reforma trabalhista

AutorJoão de Lima Teixeira Filho
Páginas129-137
AS HORAS IN ITINERE E A REFORMA TRABALHISTA129
AS HORAS IN ITINERE E A REFORMA TRABALHISTA
João de Lima Teixeira Filho (*)
(*) Advogado no Rio de Janeiro (www.limateixeira.com). Presidente da Academia Brasileira de Direito do Trabalho (ABDT)
(1) A breve justif‌i cativa do projeto de lei do Executivo consta da Exposição de Motivos EM n. 00036/2016 MTB, de 22.12.2016, do Ministro de Estado
do Trabalho e Emprego.
(2) O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou a proposta oriunda da Comissão de Trabalho por 296 votos a favor e 177 votos contra.
(3) O projeto tramitou no Senado Federal de 26.04.2017 a 11.07.2017, quando aprovado em plenário por 50 votos a favor e 26 votos contra.
I — A REFORMA
uma “Reforma Trabalhista”, como disseminado? Sob o
prisma de organicidade, a resposta é negativa, como evi-
denciam os trabalhos legislativos, a seguir sumariados.
O Projeto de Lei n. 6.787, de 22 de dezembro de 2016,
é o marco inicial de profunda alteração da Consolidação
das Leis do Trabalho(1). O Presidente da República en-
caminhou à Câmara dos Deputados referida proposta
para atualizar pontualmente a CLT. Poucas alterações
legislativas, circunscritas a sete temas: multa admi-
nistrativa em vínculo de emprego informal (art. 47 da
CLT), trabalho em regime de tempo parcial (art. 58-A),
representação dos trabalhadores na empresa (art. 523-
A), a cognominada “prevalência do negociado sobre o
legislado” (art. 611-A), índice de atualização de multas
administrativas (art. 634), contagem dos prazos proces-
suais em dias úteis (art. 775) e ampliação de escopo do
trabalho temporário, regido pela Lei n. 6.019, de 3 de
janeiro de 1974.
Cercado de celeuma, em meio a uma degradação do
ambiente político jamais vista na história e num contex-
to de enorme fragilidade social, com taxa de desemprego
por volta de 13%, atingindo cerca de 14 milhões de tra-
balhadores, referido projeto de lei tramitou célere na Câ-
mara dos Deputados: meteóricos 4 meses! De 23.12.2016
até 26.04.2017(2), quando aprovado, foram oferecidas
nada menos que 840 emendas ao PL n. 6.787/2016 em
variados temas de direito individual, coletivo e de pro-
cesso do trabalho. A proposta legislativa adquiriu vida
própria e avolumou-se desorganizadamente.
Em meio a justif‌i cados clamores por debate aprofun-
dado e a críticas de toda ordem, a Comissão de Trabalho
da Câmara dos Deputados realizou sucessivas audiên-
cias públicas para colher manifestações de representan-
tes de trabalhadores, de empregadores, de magistrados,
advogados, procuradores e de juristas. Muita energia
despendida e poucos resultados práticos. De todo esse
alvoroço resultou um texto com mais de 100 alterações
da CLT, em sofrida técnica legislativa. Tudo aprovado
num vapt-vupt, na Câmara dos Deputados e no Senado
Federal(3). O Senado sequer alterou o projeto aprovado
pela Câmara dos Deputados. Tudo com o deliberado
propósito de evitar o prolongamento do processo legis-
lativo. Houvesse modif‌i cação do projeto pela Casa Re-
visora, o art. 65 da Constituição Federal determinaria
o imprescindível retorno da proposta legislativa à Casa
de origem. Isso demandaria mais tempo e mais conf‌l itos
para perfazimento do trâmite legislativo. O açodamento
gerou críticas até de parlamentares favoráveis à reforma,
o que levou o Presidente da República a assumir o com-
promisso de, após a sanção da lei, editar Medida Provi-
sória para pacif‌i car os temas mais controvertidos. Dois
dias após a aprovação no Senado Federal, o projeto foi
sancionado pelo Presidente da República, transforman-
catio legis de 120 dias. Após muita hesitação, sobrevém a
alterações à lei recém-promulgada, mas não na discipli-
na das horas in itinere, objeto do presente artigo.
Essa apertada síntese denota, só por si, que tão im-
pactante e profunda modif‌i cação legislativa está longe
da mais tosca noção de uma adequada, justa e bem es-
truturada “Reforma Trabalhista”. A despeito de consti-
tuir a maior revisão da CLT, a miríade de novos dispo-
sitivos prescindiu de organicidade e coerência interna
com o f‌i to de produzir um arcabouço jurídico homogê-
neo. Desproteção é a tônica. Grupos de pressão, sobre-
tudo patronais, vislumbraram nesse atalho legislativo a
via rápida para resolver interesses próprios e dissolver
construções jurisprudenciais do Tribunal Superior do
Trabalho sedimentadas pelo tempo. Dispositivos da Re-
forma Trabalhista f‌i xaram preceito em sentido diame-
tralmente oposto à formulação pretoriana cristalizada
em súmulas do TST, como resposta a um alardeado “ati-
vismo judicial”.

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