As normas gerais do ICMS-comunicação

AutorAndré Mendes Moreira
Páginas151-199
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4. AS NORMAS GERAIS DO
ICMS-COMUNICAÇÃO
4.1.
O papel da lei complementar em matéria tributária
A lei complementar é a segunda mais importante fonte
formal do Direito Tributário, sendo precedida apenas pela
Constituição da República.273 Sua especificidade ontológico-
formal (regulação de matéria especialmente prevista na Lei
Maior e aprovação mediante quorum qualificado do Congresso
Nacional) a coloca em plano superior ao da lei ordinária274
(contudo, se a matéria regulada pela lei complementar for
reservada à lei ordinária, aquela terá o mesmo status desta
última).275
273. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva,
1985, p. 36.
274. MARTINS, Ives Gandra da Silva. Sistema Tributário na Constituição de 1988.
São Paulo: Saraiva, 1990, p. 85.
275. O STF já decidiu, na ADC nº 1/DF, que a lei complementar reguladora de maté-
ria afetada à lei ordinária é materialmente ordinária, por não tratar de tema reser-
vado à legislação complementar pela Constituição (STF, Pleno, ADC nº 1/DF, rela-
tor Ministro MOREIRA ALVES, DJ 16.06.1995, p. 18.213).
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A TRIBUTAÇÃO DOS SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO
Os arts. 146 e 146-A da CR/88 cuidaram de delinear as
hipóteses nas quais a lei complementar deverá ser utilizada
em matéria tributária:
(a) para dispor sobre conflitos de competência impositiva entre os
entes federados;
(b) para regular as limitações constitucionais ao poder de tributar
(imunidades);
(c) para estabelecer normas gerais276 em matéria de legislação
tributária, em especial sobre:
(c.1) definição de tributos e suas espécies (e, relativamente aos
impostos previstos na Constituição, definição dos respec-
tivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes);
(c.2) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência
tributários;
(c.3) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo pratica-
do pelas sociedades cooperativas;
(c.4) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as
microempresas e para as empresas de pequeno porte;277
276. Leciona ÁVILA que “a necessidade e a validade das normas gerais em matéria
de legislação tributária foram reconhecidas pelo Poder Judiciário. Há muito, o Su-
premo Tribunal Federal já reconheceu a validade do Código Tributário Nacional
como documento portador de normas gerais de direito tributário. O Tribunal acei-
tou as funções de evitar conflitos de competência e de estabelecer normas gerais de
direito tributário. O Superior Tribunal de Justiça (...) também reconheceu validade
às normas gerais de Direito Tributário estabelecidas pelo Código Tributário Nacio-
nal. Essas decisões consubstanciam em um fundamento suficiente para o reconhe-
cimento das normas gerais em matéria tributária”. (ÁVILA, Humberto. Sistema
Constitucional Tributário. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 137).
277. Esta função da legislação complementar em matéria tributária foi acrescida ao
art. 146 da CR/88 pela EC nº 42/03. A LC poderá, ainda, instituir um regime único
de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Fe-
deral e dos Municípios para as microempresas e empresas de pequeno porte, obser-
vados os seguintes requisitos: (a) deverá ser opcional para o contribuinte; (b) pode-
rão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas por Estado; (c) o
recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos
pertencentes aos respectivos entes federados será imediata, vedada qualquer
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ANDRÉ MENDES MOREIRA
(d) para estabelecer critérios especiais de tributação, com o obje-
tivo de prevenir desequilíbrios da concorrência (sem prejuízo
da competência de a União, por lei, criar normas com o mesmo
objetivo).278
Quando o Congresso Nacional atua na edição de leis
complementares tributárias está agindo na qualidade de le-
gislador nacional, representante da nação brasileira (e não da
União Federal). De fato, a ideia que inspirou a criação da lei
complementar (introduzida no processo legislativo brasileiro
pela EC nº 18/65) foi justamente a de obter um ato que repre-
sentasse não os interesses da União enquanto agente arreca-
dador, mas sim os anseios de toda a nação.279
A lei complementar tem por função precípua conferir
unidade ao sistema tributário brasileiro.280 De fato, a organi-
zação da República sob a forma de Federação criou uma re-
alidade na qual existem quatro ordens jurídicas parciais:281 a
retenção ou condicionamento; (d) a arrecadação, a fiscalização e a cobrança pode-
rão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de
contribuintes (parágrafo único do art. 146 da CR/88, incluído pela EC nº 42/03).
278. Trata-se do disposto no art. 146-A, que foi incluído na CR/88 pela EC nº 42/03.
279. NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário, 9ª ed. São Paulo: Sarai-
va, 1989, p. 61.
280. CELSO BASTOS leciona que “lei complementar é, assim, toda aquela que con-
templa uma matéria a ela entregue de forma exclusiva e que, em consequência,
repele normações heterogêneas, aprovada mediante um quorum próprio de maioria
absoluta”. (BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Financeiro e de Direito Tribu-
tário. São Paulo: Saraiva, 1991, pp. 164-5).
281. No Estado Federal, existe uma descentralização estática e dinâmica do poder
central, criando ordens jurídicas parciais com validade e autonomia dentro desse
mesmo Estado. Averba KELSEN:
“A descentralização é tanto estática quanto dinâmica, se a ordem jurídica válida
apenas para uma comunidade for criada por órgãos eleitos simplesmente pelos
membros dessa comunidade parcial. Um exemplo é o Estado federal em que os es-
tatutos válidos para o território de apenas um Estado-membro devem ter sido apro-
vados pela legislatura local eleita pelos cidadãos desse Estado-membro.” (KEL-
SEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado, 3ª ed. Tradução de LUÍS CARLOS
BORGES. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 442).
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