As nuances constitucionais para a construção do conceito de renda

AutorFernando Ferreira Castellani
Ocupação do AutorDoutor e Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP
Páginas27-64
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CAPÍTULO III
AS NUANCES CONSTITUCIONAIS PARA A
CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE RENDA
Nosso sistema tributário é, antes de tudo, constitucio-
nal. Essa é uma das consequências inexoráveis da República,
como organizada no Brasil. Assim sendo, qualquer conceito
de renda, para fins de tributação, não pode deixar de analisar,
detalhadamente, as acepções dos termos renda e proventos
usados pela Carta Magna.
É inconteste que as palavras usadas pela legislação pos-
suem alto grau de indefinição. A relação entre o signo (vocá-
bulo), a significação (efeito causado na mente do destinatário
ou do intérprete) e o significado (correspondência, no mundo
real ou dos eventos) nem sempre é simples, para não dizer
que nunca o é.
Paulo de Barros Carvalho, citando as lições husserlianas,
assim discorre:
O falar em linguagem remete o pensamento, forçosamente, para
o sentido de outro vocábulo: signo. Como unidade de um siste-
ma que permite a comunicação inter-humana, signo é um ente
que tem status lógico de relação. Nele, um suporte físico se as-
socia a um significado e a uma significação, para aplicarmos a
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O IMPOSTO SOBRE A RENDA E AS DEDUÇÕES DE
NATUREZA CONSTITUCIONAL
terminologia husserliana. O suporte físico, da linguagem idio-
mática, é a palavra falada (ondas sonoras, que são matéria, pro-
vocadas pela movimentação de nossas cordas vocais, no apare-
lho fonético) ou a palavra escrita (depósito de tinta no papel ou
giz na lousa). Esse dado, que integra a relação sígnica, como o
próprio nome indica, tem natureza física, material. Refere-se a
algo do mundo exterior ou interior, da existência concreta ou
imaginária, atual ou passada, que é seu significado; e suscita em
nossa mente uma noção, ideia ou conceito, que chamaremos de
significação.
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Apesar dessa constatação, é evidente que a interpreta-
ção a partir da literalidade dos termos deve ser a primeira a
ser adotada. Ela é, nesse sentido, ao menos, nosso ponto de
partida.
Na sistemática da tributação, devemos, então, analisar
detidamente os usos dos termos renda e proventos no texto
constitucional. Apesar de sabermos que não há um conceito
expresso do significado do termo, ao utilizá-lo, diversas vezes,
em diferentes contextos, poderá indicar algumas possibilida-
des interpretativas.
E é evidente que, ao construirmos algumas premissas a
partir do texto constitucional, teremos, para dizer o mínimo,
um importante elemento cognitivo para a construção dos seus
significados.
3.1. Renda e proventos na Constituição Federal: os usos
do signo e seus significados possíveis
Nosso trabalho de análise das acepções dos termos renda
e proventos, na CF, deve iniciar-se com a identificação de to-
dos os seus usos.
No que se refere ao signo renda, identificamos nos se-
guintes artigos, todos da CF: 7º, XII; 30, II; 43, § 2º, IV, 48, I;
48. CARVALHO, Paulo de Barros. Apostila de filosofia do direito. Lógica Jurídica.
São Paulo: PUC, 1999, p. 12.
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FERNANDO FERREIRA CASTELLANI
150, VI, “a”, “c”, e §§ 2º, 3º e 4º; 151, II; 153, III, 157, I; 158, I;
159, I e § 1º; 201, IV e § 12. Identificamos, ainda, nas ADCT, os
seguintes artigos: 72, I, II, V e § 5º e 79, caput.
Já o signo proventos é identificado nos seguintes artigos:
37, § 10; 40 §§ 1º, 2º, 3º, 7º, I, 18 e 21; 103-B, § 4º, III; 130-A, §
2º, III; 151, II; 153, III; 157, I; 158, I; 159, I e § 1º; 201, § 6º; 249.
Identificamos, ainda, nas ADCT, os seguintes artigos: 17; 20;
53, V; 72, I, II, V e § 5º.
Percebe-se, de maneira clara, que os signos são utiliza-
dos diversas vezes, em diferentes contextos. Passemos à sua
análise.
3.1.1. Renda como rendimentos decorrentes de trabalho
pessoal
A CF, em diversas passagens, utiliza-se do signo renda
no sentido de rendimentos em geral, decorrentes de trabalho
ou de fontes diversas, formadoras dos ganhos gerais de uma
família.
Percebemos isso no tratamento dado, pela CF, ao termo
renda, ao disciplinar os direitos dos trabalhadores, em dife-
rentes passagens.
O art. 7º, XII, assim dispõe:
São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros
que visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XII — salário-família pago em razão do dependente do trabalha-
dor de baixa renda nos termos da lei;
O art. 201, por sua vez, assim dispõe:
A previdência social será organizada sob a forma de regime geral,
de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados crité-
rios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá,
nos termos da lei, a:
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