As Políticas Públicas de Erradicação do Trabalho Infantil na Argentina e no Brasil

AutorJonábio Barbosa dos Santos
Ocupação do AutorDoutor em Ciências Jurídicas e Sociais. Mestre em Direito Econômico
Páginas93-118

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A proteção da criança e do adolescente não representa uma tarefa fácil, em especial no mercado de trabalho, quando os capitalistas fazem uso de todos os mecanismos para obtenção do aumento de sua lucratividade. Entre esses mecanismos está a utilização de mão de obra de crianças e adolescentes que são levadas a substituir sua instrução pelo exercício de atividades laborativas em situação de indecência, principalmente em países com altos índices de desigualdade social e de pobreza106, como é o caso da Argentina e do Brasil. A pobreza é, sem sombra de dúvidas, um dos principais fatores de contribuição para a existência do trabalho infantil, embora não seja o único, representa um dos mais graves.

Este fato exige do Estado a adoção de políticas públicas inclusivas para evitar que crianças e adolescentes sejam privados do normal desenvolvimento físico e mental.

4.1. Programas e projetos utilizados pelo estado argentino para o combate ao trabalho infantil

Como instrumentos de políticas públicas voltadas para a proteção da criança e do adolescente no mercado laboral, o governo argentino aderiu e adotou providências sugeridas pela Organização Internacional do Trabalho, além de contribuições dadas por organizações não governamentais internas daquele país. Isso representa uma tentativa de enfrentar o problema, que não possui uma simples solução devido às questões culturais, familiares e socioeconômicas que impõem as crianças e adolescentes à realização de tarefas laborativas para contribuir, complementar e muitas vezes prover economicamente as suas famílias.

Para o desenvolvimento de políticas públicas voltadas para a erradicação do trabalho infantil, bem como pela não utilização do trabalho de crianças e adolescentes em atividades laborativas que coloquem em risco a sua saúde e a segurança, o governo argentino utiliza, segundo informações do Ministério do Trabalho e Emprego, os seguintes instrumentos

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de coleta de dados: a) Censo Nacional Agropecuário; b) Censo Nacional de Población y Vivienda; c) Módulo de Monitoreo de Metas Sociales; c) Encuesta de Desarrollo Social realizada por el SIEMPRO; d) Encuesta Permanente de Hogares107.

Entretanto, esses dados são sempre defasados e desatualizados, o que prejudica qualquer política pública que tenha como base a estatística para sua implementação, principalmente quando essa política é destinada a mudar uma realidade social que é dinâmica, fato que por si só impõe que os mecanismos de controle, fiscalização, implementação e de aplicação das políticas sejam também dinâmicos e atualizados cotidianamente para ter a chance de conseguir minimamente um resultado positivo108.

A utilização de trabalho de crianças e adolescentes traz para o futuro econômico e social desses indivíduos um prejuízo incalculável, dada a falta de igualdade de oportunidades para essas crianças exercerem os seus direitos. Além disso, demonstra, no caso do Estado argentino e demais Estados da América Latina, que suas políticas públicas voltadas para a erradicação e o combate ao trabalho infantil, apesar de importantes, precisam de revisões constantes, para correções de distorções e equívocos no enfrentamento do problema, já que essas políticas não têm mostrado eficiência109.

Sobre esta questão, a Argentina estabeleceu o Programa Nacional de Ação em Matéria de Trabalho Infantil, contido no anexo IV da Lei Federal n. 25.212. Esta norma foi elaborada tendo como embasamento os resultados obtidos pelo Seminário Nacional Sobre o Trabalho Infantil, que teve a participação de representantes do governo argentino, de organizações de trabalhadores, empregadores e da sociedade civil.

Na organização do Seminário em questão estavam representantes da OIT, do Ministério do Trabalho, Emprego e Seguridad Social da Argentina, e do UNICEF.

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4.1.1. Panorama geral dos programas governamentais especíi cos de enfrentamento do trabalho infantil na Argentina

A Argentina, através do Ministério do Trabalho, Emprego e Seguridade Social, vem desenvolvendo vários programas e projetos em parceria com a OIT, o UNICEF, bem como com órgãos e entidades não governamentais e governamentais, tudo no sentido de desenvolver uma política pública que minimamente erradique e reprima o trabalho infantil.

O governo argentino possui também o Programa de Ação Direta (PAD) voltado para o desenvolvimento de políticas públicas localizadas, levando em consideração os problemas e incidências de trabalho infantil na seara regional e provincial, além de uma perspectiva de atuação em atividades específicas como empresas de reciclagem de lixo e lixões, como também, fabricas de ladrilhos.

Esse programa possui a participação no campo da atuação e efetivação de seus objetivos de organizações não governamentais, como é o caso da Defesa Niños Inter-nacional, que atuou no caso das fábricas de ladrilhos informais situadas em Chacabuco. Esse programa busca proteger as crianças, adolescentes e suas famílias na seara social, financeira e econômica110.

Outro objetivo do programa é o fortalecimento das políticas nacionais de combate ao trabalho infantil, no plano local, muito embora, no plano nacional, seja formatado pela OIT/IPEC, juntamente como o Ministério do Trabalho, que busca enfrentar, tratar e eliminar as causas do trabalho infantil. Segundo consta do Projeto, esse objetivo é possível a partir do fortalecimento institucional do Ministério do Trabalho, mediante a elaboração de um diagnóstico da investigação do problema, além da utilização de subsídios (bolsas) para sustentar as famílias, sobretudo para conscientizar a sociedade argentina da necessidade de erradicação do trabalho de crianças e adolescentes em prejuízo de seus estudos.

Ainda como medidas preventivas para o combate ao trabalho infantil em uma de suas formas mais indignas, que é a exploração sexual, o governo argentino, em 2002, implementou o Plano de Ação a favor dos Direitos da Infância Objeto de Exploração Sexual, idealizado pelo UNICEF e implementado em parceria com o Conselho do Menor e da Família; o Conselho Nacional da Mulher, com a participação da Secretaria de Política Criminal do Ministério da Justiça e do Ministério Público Fiscal. O objetivo desse plano é assegurar às crianças e adolescentes uma vida digna e livre, sem qualquer sujeição à exploração ou violência. Além disso, objetiva o fortalecimento da capacidade do Estado Argentino e das organizações sociais dos direitos de meninos e meninas em situação de exploração retirando-as e prevenindo a entrada de novas crianças nesta atividade, mediante a criação e ampliação das redes de proteção111.

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Outra politica pública definida adotada pelo Estado argentino, mas apenas por um período de 2 anos (2003 a 2005), foi o Programa Luz de Infância para la Prevención y Erradicación de la Explotación Sexual Comercial Infantil. Este programa ficou sob a responsabilidade da Secretaria de Trabalho da Nação, com financiamento do IPEC/OIT e sediado na província de Misiones e em Puerto Iguazu.

O principal resultado deste programa foi a realização de um estudo diagnóstico e a sensibilização da população, bem como a formação de um comitê local, composto por representantes de várias regiões da província.

De todos os objetivos alcançados, o mais importante foi o de chamar a atenção para o problema da exploração sexual infantil e a integração com comitês das cidades fronteiriças112.

Já o Programa de Prevención y Eliminación de la explotación sexual comercial de niños, niñas y adolescentes en la Triple Frontera, iniciado em 2003 pelo IPEC/OIT, congrega instituições públicas e privadas para o combate, na região de fronteira entre Argentina, Brasil e Paraguay, à prostituição infantil em ruas, hotéis, casas de eventos e bordéis.

Este programa ainda hoje existe, mas os resultados, como nos demais casos, são muito tímidos pela falta de estrutura dos aparelhos de prevenção e de fiscalização.

Em relação às crianças subtraídas de suas famílias e traficadas, há na Argentina o Programa Nacional de Prevención de la Sustracción y Tráfico de Niños y de los Delitos contra su Identidad. Este programa é responsável pela catalogação e registro em âmbito nacional de informações sobre crianças subtraídas e traficadas ou suspeitas de estarem sendo utilizadas pelo e para o tráfico113.

Pode também ser relatado entre os programas que possuem a preocupação com o tema trabalho infantil o Programa para la Prevención y Erradicación del Trabajo infantil Urbano en la República Argentina: Tiempo de Infancia, iniciado no ano de 2003, terminou em 2008, promovendo ações descentralizadas, mediante a participação de todas as entidades e instituições públicas e privadas, em especial as de nível local que estão diante do problema, tendo, portanto, maior facilidade em sua identificação.

Este programa possui também a intenção de difundir o problema e de buscar a modificação das práticas culturais no tocante à ideia inserida no seio da sociedade de que é normal crianças exercerem atividades laborais, além, é claro, do objetivo mais nobre que é a permanência das crianças e adolescentes no sistema educativo formal.

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Mais uma vez ressaltamos que os objetivos do programa estão dentro do que se espera de uma política pública, entretanto, a grande dificuldade está na implementação dessas políticas para que possam trazer resultados concretos, saindo do mero campo do discurso e da norma114, pois, na maioria maciça das vezes, os Comitês Locais têm em sua formação a observância da Multisetorialidade, mas na sua atuação isso não acontece.

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