Aspectos Regulatórios e Desafios da Iluminação Pública

AutorJoísa Campanher Dutra e Patrícia Sampaio
Ocupação do AutorCoordenadora do Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura da Fundação Getulio Vargas (CERI/FGV)/Professora da FGV Direito Rio e da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO)
Páginas356-381
356 ASPECTOS REGULATÓRIOS E DESAFIOS DA ILUMINAÇÃO PÚBLICA
14.1 INTRODUÇÃO
A relevância da iluminação pública para a sociedade mostra-se inegável; a
provisão desses serviços produz beneícios na forma de ganhos com a segu-
rança pública, ordenamento do tráfego de veículos e de aproveitamento de
espaços públicos de lazer no período noturno.
Não por outro motivo trata-se de um serviço que, desde há muito, vem
recebendo atenção das autoridades, sendo a história da iluminação pública
no país anterior a do próprio Setor Elétrico. Desde o inal do século XVIII
existem relatos da organização de serviços de iluminação de ruas, inicial-
mente por azeite de peixe1 e, ao longo do século XIX, por equipamentos a
gás.2
A primeira menção à iluminação de ediicações públicas por meio de
eletricidade remonta ao ano de 1879, quando a estação de trem Pedro II,
atual Central do Brasil, no Rio de Janeiro, recebe iluminação elétrica. A ilumi-
nação de vias públicas por meio de eletricidade tem sua primeira experi-
ência em 1881, no Jardim Campo da Aclamação – atual Praça da República
– contendo 16 lâmpadas de arco voltaico.3
1 De acordo com Roberto Macedo, “foi na administração do Vice-Rei Conde de
Rezende D. José Luís de Castro que se mandou colocar os primeiros candeeiros
públicos, à custa do governo, na proporção de dois por logradouros, salvo nas
ruas de maior movimento, onde se erigiram quatro. Funcionavam por meio de
azeite de peixe. De acendê-los e apagá-los, às primeiras horas da noite e do dia,
eram incumbidos os escravos”. Informação disponível em http://www.rjnet.com.
br/rjiluminacaopublica.php. Acessado em: junho de 2014.
2 Após tentativas iniciais frustradas, coube ao Barão de Mauá, em 1854, a primeira
rede de iluminação a gás do país: “No dia 25 de Março de 1854, conduzido através
de 20 quilômetros de encanamentos, o gás ia iluminar os primeiros combus-
tores da cidade do Rio de Janeiro: Praça XV, Ruas 1º de Março, Ouvidor, Rosário,
Hospício, Alfândega, General Câmara e São Pedro”. http://www.rjnet.com.br/
rjiluminacaopublica2.php. Acessado em: junho de 2014.
3
Sobre a instalação da primeira rede de iluminação elétrica no Rio de Janeiro,
merece transcrição o seguinte relato: “A diiculdade maior para a implantação
da iluminação elétrica era a necessidade de instalação simultânea de um equi-
pamento gerador para qualquer sistema a ser implementado. No entanto, o
conceito de estação geradora central, distribuidora de energia elétrica na área
urbana, ainda era inédito no Rio de Janeiro. A primeira tentativa no sentido de se
ter uma central geradora na cidade ocorreu de forma curiosa, em 1887, quando
foi criada a Companhia Força e Luz com o propósito de suprir energia elétrica,
gerada por uma pequena usina termelétrica instalada no Largo de São Francisco,
a iluminação pública da área urbana central. A razão dessa solução, em que não
JOÍSA DUTRA E PATRÍCIA SAMPAIO 357
Atualmente, a iluminação pública constitui um tema que tem apre-
sentado desaios aos formuladores de política e reguladores, seja pelos
elevados volumes de consumo de energia elétrica de que necessita, seja
pela sua essencialidade e, portanto, necessidade de constante manutenção
e melhoria de suas instalações. Segundo a Empresa de Pesquisa Energética
(EPE), em 2012 o subgrupo de unidades consumidoras denominado “ilumi-
nação pública” respondeu por 2,9% do total de energia elétrica consumida
no país.4
Um desaio adicional enfrentado pela regulação da iluminação pública
consiste em sua dupla submissão às legislações federal e municipal.
De um lado, o fornecimento de energia elétrica constitui um serviço de
competência da União (art. 21, XII, ‘b’, CF/1988),5 sendo igualmente compe-
tência privativa deste legislar sobre energia elétrica (art. 22, I, CF/1888).6
Nesse sentido, a Lei nº 9.427 de 1996 acometeu a regulação do Setor a uma
agência reguladora federal, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).
De outro, tem-se o reconhecimento de que a iluminação pública cons-
titui assunto de interesse local, sujeito, portanto, nos termos do art. 30,
I e V, da Constituição Federal,7 à regulação municipal, inclusive por lidar
diretamente com bens públicos municipais, como ruas, avenidas, túneis e
praças públicas.
havia necessidade de qualquer canalização ou iação urbana, era contornar os
direitos de concessão pertencentes à Société Anonyme du Gaz. Até 1888, quando
foi dissolvida, a Companhia Força e Luz chegou a manter desta forma cerca de
100 lâmpadas elétricas de iluminação pública no centro da cidade”. LOBO DE
MENDONÇA, Leila (coord.). Relexos da cidade: a iluminação pública no Rio de
Janeiro. Rio de Janeiro: Centro de Memória da Eletricidade no Brasil, 2004, pp.
38 e 39. Segundo esta obra, a primeira cidade a ter iluminação pública elétrica
não foi o Rio de Janeiro, mas Campos dos Goytacazes, em 1883 (ob. cit., p. 39).
4
EMPRESA DE PESQUISA ENERGÉTICA. Anuário estatístico de energia elétrica –
2013. Brasília: EPE, 2013, p. 87. Ano-base das informações: 2012.
5 Constituição Federal. Art. 21. Compete à União: (...) XII - explorar, diretamente ou
mediante autorização, concessão ou permissão: (...) b) os serviços e instalações
de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água, em articu-
lação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergético.
6 Art . 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (...) IV - águas, energia,
informática, telecomunicações e radiodifusão.
7 Constituição Federal. Art. 30. Compete aos Municípios: I - legislar sobre assuntos
de interesse local; (...) V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de
concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de
transporte coletivo, que tem caráter essencial.

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