Ativismo judicial e seus usos na mídia brasileira

AutorDiego Werneck Arguelhes - Fabiana Luci de Oliveira - Lenadro Molhano Ribeiro
CargoDoutorando em Direito pela Universidade de Yale - Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Carlos. Professora da FGV Direito Rio - Doutor em Ciência Política pelo IUPERJ/UCAM. Professor da FGV Direito Rio
Páginas34-64
Ativismo judicial e seus usos na
mídia brasileira
Diego Werneck Arguelhes*
Fabiana Luci de Oliveira**
Leandro Molhano Ribeiro***
1. Introdução
As expressões “ativismo judicial” e “juízes ativistas” aparecem com cada
vez mais frequência em discussões, dentro e fora da academia, sobre o
papel político do Poder Judiciário. Essa expansão, porém, ocorreu sem
qualquer tipo de consenso quanto ao signif‌icado preciso de “ativismo judi-
cial”, não implicando qualquer uniformidade ou sistematicidade no uso da
expressão. De fato, no mundo jurídico, “ativista” e “ativismo” são termos
que variam bastante de signif‌icado ao longo do tempo1. Mesmo para inter-
locutores aparentemente envolvidos no mesmo debate, na mesma época,
essas expressões podem se referir a conteúdos bastante diferentes.
Esta multiplicidade de sentidos tem sido percebida por muitos estudos
acadêmicos como um indicador da pouca utilidade analítica da expressão
– como se a origem midiática da expressão a condenasse a ser pouco ou
quase nada além de um rótulo retórico, empregado para se criticar uma
decisão ou um tribunal com o qual se discorda. Entretanto, é justamen-
te a facilidade de se apropriar dessa expressão no debate público sobre
comportamento do Judiciário que a torna interessante. Em especial, a ma-
* Doutorando em Direito pela Universidade de Yale. Professor da Escola de Direito do Rio de Janeiro da
Fundação Getulio Vargas (FGV Direito Rio).
** Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Carlos. Professora da FGV Direito Rio.
*** Doutor em Ciência Política pelo IUPERJ/UCAM. Professor da FGV Direito Rio. Fundação Getulio Vargas
– Escola de Direito. Praia de Botafogo, n.190, 13º andar. Rio de Janeiro – RJ – CEP 22250-900
1 MARSHALL, 2002.
Direito, Estado e Sociedade n.40 p. 34 a 64 jan/jun 2012
miolo Direito 40.indd 34 22/01/2013 16:10:20
35
Ativismo judicial e seus usos na
mídia brasileira
neira pela qual se usa a expressão “ativismo judicial” na mídia pode reve-
lar como atores diversos concebem a função judicial e seus limites. Mais
ainda, como observa Green2 a forma como a expressão “ativismo judicial”
e suas variações são utilizadas no debate público não-acadêmico sobre ju-
diciário pode contribuir para moldar, em última instância, a percepção que
os juízes têm de qual seu papel e, com isso, inf‌luenciar o próprio compor-
tamento judicial.
Nesse cenário, o objetivo deste trabalho é dar um passo inicial no sen-
tido de suprir a lacuna de estudos, no Brasil, quanto aos sentidos que “ati-
vismo judicial” e expressões correlatas possuem no debate público não-
-acadêmico brasileiro. O trabalho é organizado em duas partes. Primeiro,
através da reconstituição histórica das origens e dos usos da expressão no
contexto dos EUA, discutimos a variedade de sentidos e de valência que
é tipicamente associada à idéia de “ativismo judicial” pela literatura espe-
cializada. Segundo, por meio de uma análise empírica de reportagens de
dois dos principais jornais do país – a Folha de S. Paulo e o Valor Econô-
mico -, procedemos, por indução, a uma reconstrução dos diferentes sen-
tidos e contextos em que a expressão “ativismo judicial” e suas variações
têm sido usadas pela mídia no Brasil. Identif‌icamos alguns padrões recor-
rentes: (i) ativismo como usurpação de poder, com o Judiciário avançan-
do sobre competências dos outros poderes e eventualmente se chocando
com decisões políticas tomadas nestas outras esferas; (ii) ativismo como
ocupação de vácuo de poder, com os juízes resolvendo questões e dilemas
de política pública que não vem sendo enfrentados no âmbito dos outros
Poderes; (iii) ativismo como engajamento judicial com causas políticas ou
sociais, em contraposição à tradicional imagem de neutralidade política
do Poder Judiciário.
A presença desses usos e temas recorrentes é um dado importante para
se compreender de que forma a função judicial é concebida no debate
público brasileiro. Mesmo que esses padrões não estejam livres de am-
biguidades e contradições, nem necessariamente correspondam à agenda
acadêmica sobre ativismo judicial, eles permitem levantar algumas hipóte-
ses interessantes para trabalhos futuros sobre como se constrói e se perce-
be o papel do judiciário no Brasil. Em especial, notamos um signif‌icativo
contraste com o debate público norte-americano. Enquanto nos EUA há
2 GREEN, 2009.
miolo Direito 40.indd 35 22/01/2013 16:10:20

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT