Autonomização do campo judicial e redefinição das elites judiciais locais

AutorBárbara Lou da Costa Veloso Dias
CargoDoutora em ciência política pelo IUPERJ-RJ. Professora-adjunta da Universidade Federal do Pará. E-mail: bvdias@gmail.com.
Páginas32-53
Autonomização do campo judicial e
redenição das elites judiciais locais*
Autonomisation of the judicial eld and redenition
of local judicial elites
Bárbara Lou da Costa Veloso Dias**
Universidade Federal do Pará, Belém – PA, Brasil.
1. Introdução
Os estudos sobre a expansão da atuação do poder judiciário se consolidam
a partir da década de 90 com a publicação da obra de Tate e Vallinder – The
Global Expansion of Judicial Power1. Tate e Vallinder atestam que o Poder
Judiciário, vem se expandindo, tanto no que diz respeito a maior poder
de decisão e ingerência política, bem como pela adoção de procedimentos
tipicamente jurídicos em outras esferas estatais e societais.
Segundo os autores supracitados, tal expansão já decorre dos modelos
constitucionais que se tornaram hegemônicos no segundo pós-guerra. Tal
processo que foi denominado de Judicialização da Política, na obra acima
citada, se desenvolveu pela via da expansão da competência dos tribunais
ou de juízes em detrimento dos políticos e/ou dos governos. Ou seja, hou-
ve transferência de competências de tomada de decisão da legislatura (ou
do gabinete para os tribunais), como também, a propagação dos métodos
e linguagens judiciais para fora dos tribunais.
* Parte do presente artigo foi apresentado pela autora no 11º Encontro da Associação Brasileira de Ciência
Política – ABCP, realizado em 2018, em Curitiba.
** Doutora em ciência política pelo IUPERJ-RJ. Professora-adjunta da Universidade Federal do Pará. E-mail:
bvdias@gmail.com.
1 TATE; VALLINDER, 1997.
Direito, Estado e Sociedade n.57 p. 32 a 53 jun/set 2020
33
Direito, Estado e Sociedade n. 57 jun/set 2020
A esse diagnóstico soma-se o da interpretação do pós-guerra como
a época da constitucionalização de direitos fundamentais (expansão da
linguagem jurídica para a política das “escolhas sensíveis”). Vinculado à
propagação de um consenso político de que algumas questões conside-
radas importantes não deveriam ficar mais sob o julgo dos órgãos que
representam o ideal majoritário, mas sob o julgo das cortes constitucionais,
consideradas mais aptas para julgar “minorias políticas” e proteger even-
tuais (eleitoralmente) “perdedores” políticos. Há, nesse contexto, também
um novo tipo de articulação internacional que afeta a soberania dos parla-
mentos e uma acentuada diminuição da agenda legislativa com o aumento
do insulamento burocrático do executivo e acentuada delegação legislativa
por parte do poder legislativo. E por último, segundo Garapon, há uma
perda de sociabilidade democrática, anomia social com acentuado indivi-
dualismo e egoísmo, vinculados à perda do poder dos sindicatos e asso-
ciações que geram a crença no juiz como guardião das promessas sociais2.
Sobre esse conjunto de temas há profícua produção científica no Brasil.
Podemos situar a intensidade de debates em duas grandes correntes de pen-
sadores que constituíram um conjunto extenso de produção científica sobre
o tema da Judicialização da Política no Brasil. A primeira corrente represen-
tada por Werneck Vianna, sociólogo carioca, que produziu três obras semi-
nais sobre o assunto – “A judicialização da política e das relações sociais no
Brasil”3; “A Democracia e os três poderes no Brasil”4 e “Dezessete anos de
Judicialização da Política”5. De modo bastante resumido, pode-se afirmar
que a perspectiva representada por essa corrente compreende o fenômeno
da Judicialização da Política como resultante da hipertrofia do executivo
brasileiro. Tal hipertrofia geraria fragilidade e passividade do exercício da
vontade popular e de sua capacidade de representação. Assim, a proce-
dimentalização do Direito promovida pelos juízes, tribunais e promotores
possibilitariam um novo tipo de representação da sociedade civil. O aparato
judicial assumiria a defesa da representação democrática funcional (com
atuação intensa da sociedade civil e dos sindicatos pela via das Ações Direta
de Inconstitucionalidade, Ações Civis Públicas e Ações Populares).
2 GARAPON, 2001.
3 VIANNA, 1999.
4 VIANNA, 2002.
5 VIANNA et al, 2007.
Autonomização do campo judicial e redenição das elites judiciais locais

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