Avosidade, manifestação de amor
| Autor | Antônio Carlos Mathias Coltro |
| Ocupação do Autor | Mestre em Direito das Relações Sociais (PUC-SP) |
| Páginas | 59-96 |
AVOSIDADE, MANIFESTAÇÃO DE AMOR1
Antônio Carlos Mathias Coltro
Mestre em Direito das Relações Sociais (PUC-SP). Presidente do Instituto Brasileiro de
Direito Constitucional (IBDC). Regente de Direito Civil na PUC-SP, de 1990 a 2005
e de IED na FADISP, por cinco anos, a partir de sua fundação. Autor de trabalhos de
Direito Civil, Processual Civil, Constitucional e Penal Eleitoral. Desembargador do TJSP.
Sumário. 1. Abertura. 2. O conceito. 3. O relevo e circunstâncias inerentes à avosidade. 4.
Todos ganham. 5. Conclusão.
1. ABERTURA
Talvez o leitor estranhe, ao exame dessas notas, o fato de serem citadas outras, além
de trechos de escritos com participção do próprio autor, o que, todavia, é consequência
do fato de atuar na seara jurídica e, percebendo, desde o momento em que resolveu fazer
as observações aqui constantes, que, sendo elas pertinentes ao relacionamento entre avós
e netos envolveria circunstâncias entrosadas com a sociologia, psicologia, antropologia,
gerontologia e também a filosofia, eventualmente concernindo ao direito, a teor do pre-
tendido quanto ao espectro do texto e a circunstância a que se refira, deliberou, assim,
valer-se tanto daqueles que se dedicam ao estudo de tais ciências, como transcrever o
que fosse oportuno e viesse a encontrar no tocante aos aspectos considerados durante
o desenvolvimento do artigo.
A bem indicar o mencionado, quanto à forma como se deva encarar a condição sobre
a qual aqui se trata, de muito já salientara e como sempre com inegável sensibilidade, o
grande humanista que foi Edgard de Moura Bittencourt, afirmando: “A afeição dos avós
pelos netos é a última etapa das paixões puras do homem. É a maior delícia de viver a
velhice. A jurisprudência que assegura essa afeição sanciona – na frase de Gaston La-
garde – os direitos morais dos avós”, os quais, de forma indubitável, estão relacionados
com o sentimento que nutrem pelos netos e também o destes em relação a eles e que se
têm como envolvidos em condição que se pode denominar como avosidade, expressão
nem sempre encontrada em trabalhos jurídicos, mas que em data não distante passou
a ser utilizada.
Acrescente-se, ademais e conforme Alessandra Ribeiro Ventura Oliveira; Lucy
Gomes Vianna; Carmen Jansen de Cárdenas esclarecem, que,
“O papel do idoso tem sofrido modificações, tanto no âmbito social quanto no fa-
miliar. Aumentaram o número de avós e o número de anos que as pessoas vivem como
avós. A avosidade, definida como laço de parentesco, está intimamente ligada às funções
1. Dedico estas observações a Antonio, meu neto querido; aos avós Leontina e Dario Antônio, Yole e Ângelo e a minha
amada mulher, Mara, com quem pude ter a felicidade decorrente da experiência da avosidade.
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materna e paterna, das quais, entretanto, se diferencia, exercendo papel determinante
na formação do sujeito”.2
2. O CONCEITO
Deve-se, assim e primeiramente e ainda que no curso da exposição também a tanto
se aluda, procurar estabelecer o sentido que o vocábulo possui, para uma adequada
compreensão do quanto se objetiva considerar.
Advirta-se, inicialmente e conforme Nicole Markowski da Rosa, que,
“[...] tanto por parte de autores, como por parte das avós entrevistadas, uma grande
subjetividade nos relatos e possíveis conceitos sobre o significado de avosidade. Seus
entendimentos sobre o assunto foram descritos por cada uma a partir de suas próprias
experiências e vivências enquanto avós, de acordo com a relação estabelecida entre a
díade”.3
Consoante consta na Wikipedia – La enciclopedia libre,
“Avosidade é um conceito cunhado pela Dra. em Medicina, Médica Psiquiatra e
Psicanalista argentina Paulina Redler (...) para denominar a relação e função do avô com
respeito ao neto, e os efeitos psicológicos do vínculo.
O termo é associado com seu equivalente ‘paternidade’, para descrever o vínculo
e função do pai com seu filho. No idioma inglês, o conceito pode traduzir-se como
‘grandeparenthood’ referente a ‘the state of being a grandparent’, ou seja, o ‘estado de ser
avô ou estado de ser avó’, em tradução livre da expressão, utilizada desde o século XIX.
Para significar o mesmo na língua francesa foi introduzido desde a década de 1990, o
conceito ‘grandparentalité’ ou ‘grandparentalité’”, como consta no local onde extraída
a informação.4
É importante transcrever o referido por Hugo E. Biagini, da Academia de Ciências-
-Conicet,5 dirigido a que,
“O termo abuelidad vem de um neologismo criado em 1977 pela médica argentina
Paulina Redler para dar conta da organização que incluía, na estruturação psíquica in-
dividual e familiar, a figura do avô; que também era chamado de grantitude. Para que o
termo em questão fosse a organização semântica da língua espanhola, o Dr. Redler pediu
à Academia Argentina de Letras para realizar um estudo filológico dos dois termos que
ela, depois de vários anos trabalhando em subjetividade no que diz respeito aos assuntos
substantivos, pareceu-lhe o lugar mais preciso do parentesco indicado por abuelaty ou
abuelastic affairs. Com a resposta da Academia Argentina de Letras, em 1981, a autora
2. Avosidade: visões de avós e de seus netos no período da infância. Revista brasileira de geriatria gerontologia. v. 13.
n. 3. Rio de Janeiro, set./dez. 2010. Disponível em: [https://doi.org/10.1590/S1809-98232010000300012]. Acesso
em: 07.07.2020.
3. Avós guardiões: fronteiras e limites entre avosidade e parentalidade. Disponível em: [https://www.lume.ufrgs.br/
bitstream/handle/10183/183272/001077918.pdf?sequence=1].
4. Enciclopédia/Dicionário de Psicologia e Neurociências: Abuelity.
5. Projeto: dicionário de pensamento alternativo II – Abuelity – Cecies – Pensamiento latino americano y alternativo.
Consulta na internet em: 07.07.2020.
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decidiu usar, exclusivamente, o termo abuelidade em suas pesquisas subsequentes e
exposições orais e escritas. O conceito de vovó foi mais tarde confirmado nas publicações
em espanhol que gradualmente começaram a se referir ao assunto do ponto de vista his-
tórico social. Por outro lado, além do trabalho de Paulina Redler, que viu os netos como
uma expressão de imortalidade e como evidência indolor de morte inescapável, há um
atraso atraente no uso deste termo e nas conceituações associadas a ele, tanto na produ-
ção psicanalítica, quanto gerontológica, familiar ou sociológica em espanhol. Somente
a partir de 1996 o termo abuelity apareceu na bibliografia desses campos disciplinares,
mas fora do domínio nacional e, neste último, somente após 1998.
Em suma, a noção de “abuelidade” e principalmente a exatidão do vínculo e a im-
portância social das relações entre avós e netos, é um fenômeno relativamente recente,
ligado ao desenvolvimento da gerontologia e dos direitos dos idosos, bem como ao
fenômeno de prolongamento da vida humana. O papel da avó está ligado à transmissão
do conhecimento geracional do passado e das origens, mantendo uma relação com netos
menos tensas por suas relações de autoridade com seus pais, os avós estão em excelente
posição para cuidar de seus netos na ausência dos pais. Assim, desempenham uma função
essencial no processo de transmissão intergeracional; processo intimamente ligado ao
da construção de identidade. Embora as conceituações de abuelidade na teoria e prática
psicanalítica de cada sujeito de qualquer idade e particularmente, no domínio da cha-
mada “terceira idade”, tenham sido introduzidas na Argentina pelo autor supracitado,
a palavra ganhou notoriedade pública a partir da transcendência e compromisso social
das Avós da Praça de Maio”.
Como refere a Enciclopedia/Diccionario de Psicología y Neurociencias, “A noção
de ‘avosidade’ e eminentemente, a precisão do vínculo e a relevância social das relações
entre avós e netos, é um fenômeno parcialmente recente, ligado ao desenvolvimento da
gerontologia e os direitos dos anciãos, como o fenômeno de alargamento da vida humana
e da noção de ‘terceira idade’”,6 constando, adiante:
“Gloria Ferrero destacou que o papel da avó está ligado à ‘função da transmissão
do conhecimento geracional, do passado, das origens’, na insalubridade, também que,
ao sustentar uma relação com os netos menos tensas pelas relações de autoridade que
mantêm com seus pais, os avós são mais capazes de ‘ouvir, entender e manter seus ne-
tos às vezes que seus pais não podem fazê-lo... ‘Dessa forma, desempenham um papel
essencial no processo de ‘transmissão intergeracional’, processo intimamente ligado ao
da construção da identidade”.7
Cumpre ter em conta, a teor do constante na Rev. Bras. Geriatria e Gerontologia
(2001, 8 (1); 9-20 Avosidade), que,
“As relações dos netos com seus avós constituem uma linha de investigação na qual
se torna necessário abordar perspectiva bidirecional e interativa, pois cada questão que
se discute depende da interação de ambas perspectivas. A importância da mutualidade
da relação entre avós e netos foi reconhecida sobretudo durante a década de 80 e, desde
6. Enciclopédia/Dicionário de Psicologia e Neurociências: Abulony wiki: informações, livros pdf e vídeos. Abuelity,
consulta na internet em 07.07.2020.
7. Loc. Cit. Nota 6.
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