Bens públicos

AutorBassil Dower, Nelson Godoy
Ocupação do AutorProfessor Universitário e Advogado em São Paulo
Páginas245-254

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16. 1 Considerações introdutórias

Trataremos, agora, dos bens considerados em relação aos seus respectivos proprietários, ou seja, os bens tendo em vista o titular do domínio. Um bem pode pertencer a uma pessoa jurídica de direito público. Analise o conteúdo do art. 98 do CC, in verbis: "São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem"174.

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Contudo, há bens que não pertencem a ninguém, como, por exemplo, os animais selvagens em liberdade, as pérolas que estão no fundo do mar, as coisas abandonadas.

Face ao exposto acima, veremos apenas os bens públicos, pois os demais, por definição, são bens particulares.

16. 2 Classificação dos segundo o seu destino

Os bens públicos, embora referidos pelo Código Civil, constituem matéria pertinente do Direito Constitucional e Administrativo. A própria Constituição Federal estabelece quais os bens da União (art. 20) e quais os dos Estados (art. 26).

Contudo, está no Código Civil a classificação dos bens públicos sob o prisma da sua destinação175. Assim, os bens públicos se distribuem em três categorias:

I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares176, estradas, ruas e praças;

II - os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias;

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III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades" (CC, art. 99).

Vejamos, separadamente, cada um dos casos acima.

16.2. 1 Bens de uso comum do povo

São aqueles que, por sua natureza ou determinação legal, são destinados à utilização coletiva. Eles são entregues ao povo para sua utilização, como as estradas, as ruas etc., sem necessidade de permissão especial. O proprietário desses bens é a pessoa jurídica de Direito Público Interno, que o entrega ao uso de qualquer pessoa, sem lhe transferir a propriedade. A utilização desses bens, portanto, é feita pelo povo em geral, ou como escreve Hely Lopes Meirelles, sua "fruição é coletiva, os usuários são anônimos, indeterminados, e os bens utilizados o são por todos os membros da coletividade - uti universi - razão pela qual ninguém tem direito ao uso exclusivo ou privilégios na utilização do bem: o direito de cada indivíduo limita-se à igualdade com os demais na fruição do bem ou no suportar os ônus dele resultantes".177Sobre o assunto, interessante trazer à baila as palavras de José Carlos de Freitas: "Todos os bens públicos admitem um uso sem discriminação, em igualdade de condições por todos, sem qualificação ou consentimento pessoal, exercido de forma anônima e gratuita (exceto na hipótese de pedágio nas rodovias, que o Poder Público cobra como contraprestação pela sua conservação, sem inibir o uso coletivo)".178

Escreve Carvalho Santos que "não se pode conhecer a entidade povo, que não é pessoa, mas o Estado, unidade abstrata, que é a pessoa que representa o povo, é a quem toca o domínio; a ele é que pertence a propriedade".179

"Sobre esses bens de uso comum, - observa Sílvio de Salvo Venosa - a administração tem a guarda, direção e fiscalização. Tem, portanto, o ente público a faculdade de reivindicá-los de quem quer que deles se aposse ou impeça a utilização pelo povo, sob qualquer aspecto".180Confira-se pelo aresto

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seguinte: "A ocupação de área pública municipal com a construção clandestina de moradia caracteriza esbulho, circunstância suficiente para a procedência da ação de reintegração de posse, sendo irrelevante o fato de a Municipalidade jamais ter ocupado materialmente a gleba, pois além da impossibilidade legal de propriedade e posse privada sobre bem público, o art. 485 (art.1.196 do atual) do CC contenta-se, apenas, com a possibilidade de fato de agir sobre a coisa" (in RT 770/258).

Portanto, é dever do Estado zelar pela preservação dos bens de uso comum do povo. A proteção do patrimônio público cabe exclusivamente aos Poderes constituídos (CF, art. 23, I), através de seus órgãos específicos (ex.: Serviço de Patrimônio da União), com destaque ainda para o Ministério Público, defensor que é dos "interesses sociais e individuais indisponíveis" (CF, art. 127), cabendo-lhe "promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social" - CF, art. 129. "É de todo inconcebível tenha alguém o direito subjetivo a ocupar com exclusividade, para fins de comércio, - decidiu o Tribunal - bem de uso comum do povo" (in RT 653/100). Decidiu, ainda, ser admissível que, "em defesa de bens públicos de uso comum, possa qualquer indivíduo usar das ações possessórias" (in RT 621/190). "Procede ação popular constitucional contra permissão de uso de praça pública, por 10 anos e a título gratuito, por empresa privada" (in RT 548/211).

16.2. 2 Bens de uso especial

Os bens de uso especial são os utilizados pelo próprio Poder Público. São os que se destinam ao serviço público, como os edifícios destinados às escolas públicas, à Justiça, aos Ministérios ou Secretarias de Estados etc. Seu uso pelos particulares é regulamentado, podendo a Administração permitir ou proibir que eles ingressem em suas dependências.

16.2. 3 Bens dominicais

Os bens dominicais ou dominiais são bens disponíveis que integram o patrimônio da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, como as terras devolutas, os terrenos da marinha, as jazidas e depósitos minerais etc. O Tribunal já decidiu que "os terrenos do antigo álveo, por força do disposto no art. 66, I, CC-16 e nos arts. 2.º, "b", e 10 do Código de Águas,

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eram bens públicos de uso comum do povo, enquanto suportaram a corrente desse rio navegável. Com a canalização, e conseqüente desativação do primitivo leito, este continuou, em função do citado art. 27 do Código de Águas, a integrar normalmente o patrimônio público, só que agora na categoria de bem dominical" (in RT 688/98). Coroa bem a decisão que segue para melhor ilustrar o tema em apreço: "O sistema de direito constitucional positivo vigente no Brasil - fiel à tradição republicana iniciada com a Constituição de 1934 - instituiu verdadeira separação jurídica entre a propriedade do solo e a propriedade mineral (que incide sobre as jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais existentes no imóvel) e atribui, à União Federal, a titularidade da propriedade mineral, para o específico efeito de exploração econômica e/ou de aproveitamento industrial. A propriedade mineral submetese ao regime de dominialidade pública. Os bens que a compõem qualificam-se como bens públicos dominiais, achando-se constitucionalmente integrados ao patrimônio da União Federal" (in RT 743/181). A Carta Política promulgada em 1988, proclamou, em seu art. 176, caput, que: "As jazidas, em lavra ou...

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