Breve Estudo Comparativo da Licença Maternidade entre Brasil e Itália

AutorRita de Cássia Andrioli Bazila Peron - Guilherme Fagan Peron
Páginas133-146

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Rita de Cássia Andrioli Bazila Peron *

Guilherme Fagan Peron **

Introdução

O presente artigo trata da licença maternidade no Brasil e das licenças maternidade, paternidade e parental na Itália de maneira analítica, como uma forma de comparação entre os dois países e uma breve análise dos institutos presentes em cada ordenamento.

Diante disso, é analisada a importância desses institutos para a maternidade e para a família como um todo, como uma forma de conciliação entre o trabalho e a vida familiar do trabalhador.

A licença maternidade no Brasil

Inicialmente é exposto um breve histórico da licença maternidade no Brasil, para uma melhor compreensão do tema.

Assim como nos demais países, a licença mater-nidade no Brasil surgiu através da conquista dos direitos das mulheres, sendo que os fatos históricos e as Convenções da OIT influenciaram a positivação desses direitos.

As duas primeiras Constituições do Brasil, de 1824 e de 1891, foram omissas quanto à licença materni dade.1 Já o Decreto n. 21.417-A, de 1932, regulou o trabalho da mulher nos estabelecimentos industriais e comerciais e contemplou também o descanso obrigatório de quatro semanas antes e quatro semanas após o parto, em estabelecimento público ou particular, com previsão de aumento de até duas semanas antes e duas após por meio de atestado médico. Foi assegurado, ainda, o recebimento de meta-de do salário pelo período de afastamento, pago pelas caixas criadas pelo Instituto de Seguridade Social e na sua falta pelo empregador. Além disso, foi garantido à trabalhadora o retorno à mesma função, a proibição de dispensa baseada na gravidez, e dois intervalos diários, de meia hora cada para amamentação, nos estabelecimentos com mais de 30 empregadas acima de 16 anos.2

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O Decreto citado foi derrogado quando, em 1935, o Brasil ratificou a Convenção n. 3 da OIT, através do Decreto n. 423, tendo em vista os conflitos entre os dois diplomas quanto à duração da licença mater-nidade e a imposição ao empregador do pagamento correspondente.3 A Convenção n. 3 da OIT previa o pagamento da licença maternidade pelo Poder Público ou Instituições Previdenciárias, e o afastamento do trabalho pelo período de seis semanas antes e seis semanas após o parto, além da previsão de garantia de emprego no período.

A Constituição brasileira de 1934 foi a primeira que tratou da licença maternidade, em seu art. 121, § 1º, “h”, garantindo assistência médica à gestante, além do descanso antes e depois do parto, sem prejuízo do emprego e do salário.4 Essa Constituição foi inspirada na Constituição da República de Weimar, apresentando um viés social democrático, consagrando muitos direitos que eram resultado de conquistas de diferentes categorias profissionais. Pela primeira vez na história do Brasil, uma Constituição dispôs um capítulo referente à ordem social e econômica.5

Já a Constituição de 1937 manteve a mesma dire-triz da anterior, entretanto sem mencionar a palavra “emprego”, garantindo apenas um período de descanso antes e após o parto e assistência médica à gestante, sem prejuízo do salário.6

Em 1943, através do Decreto-Lei n. 5.452, foi promulgada a Consolidação das Leis do Trabalho. Entretanto, em seu art. 393, e respectivo parágrafo, era prevista a obrigação do empregador em realizar o pagamento dos salários integrais durante o período de licença maternidade de seis semanas antes e seis semanas após o parto. Porém, essa disposição era contrária à Convenção n. 3 da OIT, que previa o pagamento pelo Poder Público ou pelas Instituições Previdenciárias.

Tal dispositivo gerava um grande problema tanto à empregada quanto ao empregador, pois acarretava em um comportamento discriminatório, que culminava no desemprego da mulher casada ou que engravidasse, além do prejuízo do empregador, que deveria arcar com o encargo relativo ao salário maternidade, que na realidade deveria ser custeado pela sociedade e não por ele individualmente.7

A Constituição de 1946 reintroduziu o direito ao emprego para a gestante e continuou a garantir o salário e descanso após o parto. Já a Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional de 1969 não trouxeram qualquer alteração de conteúdo.8

No plano internacional, a Convenção n. 3 da OIT foi revista, em 1952, através da Convenção n. 103, que foi ratificada pelo Brasil, exceto no que tange às empregadas domésticas e rurais. Os pontos de destaque dessa revisão são o prazo de afastamento de doze semanas no mínimo, sendo um período anterior e outro posterior ao parto, além da proibição expressa do empregador de arcar com os custos da licença maternidade. A Convenção n. 103, da OIT, foi aprovada pelo Decreto Legislativo n. 20, de 1965 e foi promulgada pelo Decreto n. 58.820, de 1966.

Todavia, mesmo com a aprovação do Decreto de 1966 mencionado, somente após anos é que tal Convenção foi efetivamente aplicada quanto à previsão de custeio da licença maternidade pela Previdência Social, tendo em vista que não possuía regulamentação específica para esse fim, o que ocorreu somente em 1974/1975 com a Lei n. 6.136 e o Decreto n. 75.207.

Portanto, a responsabilidade pelo pagamento do salário maternidade correspondente a doze semanas ficou a cargo da Previdência Social, enquanto estiver em vigor o contrato, sendo arrolada como prestação previdenciária, somente através do disposto no Decreto n. 75.207, de 10 de janeiro de 1975, que regulamentou a Lei n. 6.136, de novembro de 1974. Foi corrigida, assim, a distorção presente desde a Convenção n. 3 da OIT, onde já se determinava que tal encargo fosse do Estado.9

Mauricio Godinho Delgado afirma que existem duas fases na legislação brasileira quanto à normativa da licença maternidade, uma antes do cumprimento da Convenção n. 103 da OIT, quando o pagamento da licença era a cargo do empregador, e outra após, quando o pagamento da licença passou a ser arcado pela previdência social.10

Finalmente, a Constituição de 1988 veio para consolidar os direitos e garantias fundamentais, in-

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cluindo o direito à licença maternidade, que passa a ser de cento e vinte dias de duração.

Diante desse novo período de licença, surgiram divergências jurisprudenciais quanto ao custeio da extensão do benefício, pois se fosse pago pela previdência, deveria haver a sua previsão de custeio, tendo em vista que não há a possibilidade de ressarcimento pela seguridade social sem a fonte correspondente. Sendo assim, uma das correntes jurisprudenciais negou a auto executoriedade do art. 7º, XVIII da CRFB, afirmando que somente a partir do advento da Lei n. 8.213, de 1991, é que se regulamentou o texto constitucional, considerando-se devida a licença maternidade de 120 dias somente a partir dessa data. 11

Dessa forma, a efetivação da licença materni dade de 120 dias prevista na Constituição foi realmente aplicada somente em 1991, alguns anos depois de sua previsão constitucional, por se tratar de norma, na prática, de eficácia limitada à regulamentação.

Em se tratando da Consolidação das Leis do Trabalho, esta prevê a proteção à maternidade no Título III (Das Normas Especiais de tutela do Trabalho), Capítulo III (Da Proteção do Trabalho da Mulher), Seção V (Da Proteção à Maternidade), compreendendo os arts. 391 a 400, que sofreram diversas modificações ao longo dos anos.

Com relação ao direito à licença maternidade, al-guns pontos importantes devem ser analisados, são eles: o afastamento do trabalho; o pagamento do salário maternidade durante o período; a estabilidade prevista no art. 10, II, b, da ADCT; e a evolução de direitos dos adotantes.

O art. 382 da CLT trata do período de afastamento da licença maternidade, que pode iniciar entre o vigésimo oitavo dia antes do parto e a ocorrência deste. O período da licença previsto é de 120 dias, em conformidade com o disposto na Constituição.

Já o art. 392-A, que foi acrescentado com a Lei n. 10.421, de 2002, trata da licença à adotante, que na época previa um período de afastamento diferenciado dependendo da idade da criança adotada ou em guarda para fins de adoção. Caso a criança tivesse até 1 (um) ano de idade, o período de licença era de 120 (cento e vinte) dias; no caso de adoção ou guarda judicial de criança a partir de 1 (um) ano até 4 (quatro) anos de idade, o período de licença era de 60 (sessenta) dias, em se tratando de criança a partir de 4 (quatro) anos até 8 (oito) anos de idade, o período de licença era de 30 (trinta) dias.

Essa diferença do período de afastamento foi revogada com a Lei n. 12.010, de 2009, que estabeleceu o período de 120 dias de licença maternidade à mãe adotante, independentemente da idade da criança adotada.

Atualmente, com a mudança legislativa de 2013, por meio da Lei n. 12.873, o adotante homem também passou a ter direito à licença maternidade, nos casos de adoção em família com a ausência da mãe ou no caso de falecimento da mãe, observando-se o § 5º, do art. 392 (que concede a licença somente a um dos adotantes).

Ademais, existe também uma normativa que institui o Programa Empresa Cidadã, através da Lei n. 11.770, de 2008, que prevê a prorrogação da licença maternidade em 60 dias para além do período constitucional de 120 dias, mediante a concessão de incentivo fiscal. Nesse caso, o custeio não é arcado pelo INSS, mas sim pelo empregador, que pode, posteriormente, obter compensação na apuração de seu Imposto de Renda. Assim, conforme já tratado em trabalho anterior:

[...] da mesma forma que o pagamento do salário-maternidade da empregada gestante, efetuado pelo empregador, é reembolsado pela Previdência, o pagamento realizado pelo empregador no caso do Programa Empresa Cidadã é compensado por dedução fiscal. Portanto, durante o período de prorrogação, a empregada terá direito à remuneração integral nos mesmos moldes do salário-maternidade pago pela...

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