Capítulo IV - Responsabilidade Civil Objetiva do Empregador Decorrente de Acidente do Trabalho e do Risco da Atividade

AutorJosé Carlos Manhabusco - Gianncarlo Camargo Manhabusco
Ocupação do AutorAdvogado. Membro Acadêmico Efetivo da Academia de Direito Processual de Mato Grosso do Sul ? Conselho Editorial - Advogado. Mestrando em Direito Processual Civil ? UNIPAR
Páginas62-115

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4.1. Teorias sobre a responsabilidade civil do empregador

Antes de identificar as teorias sobre a responsabilidade civil do empregador, é fundamental esclarecer que existe uma responsabilidade denominada responsabilidade acidentária que é devida pelo ente previdenciário ao empregado vítima de acidente de trabalho. Esta nasce do seguro-acidente, custeado pelo empregador, por meio da contribuição mensal, o qual transfere ao Estado o dever de indenizar o trabalhador vítima do infortúnio.

De Plácido e Silva61 conceitua o termo infortunística da seguinte maneira:

De infortúnio é a expressão empregada na linguagem técnica da Medicina Legal para indicar o conjunto de regras e princípios que se adotam para o estudo dos riscos e acidentes ocorrentes no trabalho, bem como das doenças profissionais, isto é, das doenças consequentes ou derivadas do exercício de certas atividades.

Por seu turno, Rui Stoco62 assevera que:

Com a ocorrência do acidente não se indaga se ele se deu por dolo ou culpa do empregador; se o acidentado concorreu para o evento ou se a culpa foi exclusivamente sua. O empregador contribui para o fundo, que, por sua vez, custeia o pagamento do seguro, justamente para que esse atendimento ao trabalhador não fique na dependência de se encontrar um responsável ou condicionado a qualquer pressuposto.

Esta indenização encontra respaldo no art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal63 e tem natureza objetiva, ou seja, independe de culpa, sendo independente da indenização

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do direito comum, conforme entendimento firmado da Súmula n. 229 do Supremo Tribunal Federal que estabelece o seguinte: "A indenização acidentária não exclui a do Direito comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador".

Consta na dicção do art. 121 da Lei n. 8.213/90 que (além dos arts. 22 e 42):

O pagamento, pela Previdência Social, das prestações por acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem.

Consagra a dicção do art. 172 contida no Decreto n. 611/92, Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, a seguir transcrito:

O pagamento pela Previdência Social das prestações por acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem.

Com efeito, a indenização previdenciária advém do seguro social, tratando-se de valores gerenciados pelo governo e custeados pelos contribuintes, com princípios peculiares decorrentes do seu caráter eminentemente social abrangente.

Já a indenização por dano decorrente do acidente de trabalho movida contra o empregador é resultante da responsabilidade civil.

Portanto, tais indenizações podem ser cumuladas, tratando-se, uma, de indenização acidentária e, outra, de indenização de direito comum.

O percebimento do benefício previdenciário não retira do demandante o direito de ser indenizado civilmente pela empregadora, em razão do que preceituam os incisos XXII e XXVIII do art. 7º da CF/88. São direitos que possuem naturezas jurídicas diversas.

O seguro de acidente de trabalho garante ao acidentado ou enfermo um benefício de cunho alimentar.

A reparação civil, de outro norte, contempla uma indenização para reparar o dano decorrente de ato ilícito perpetrado pelo empregador.

É, portanto, plenamente cabível a cumulação da pensão custeada pelo INSS com a pensão decorrente da responsabilidade civil suportada pela ré em função da doença do trabalho.

Ressalte-se que um dos autores pesquisados para o presente trabalho, mais precisamente José Cairo Júnior, admite uma divisão da responsabilidade civil do empregador em responsabilidade contratual e responsabilidade extracontratual. Ele sustenta seu entendimento alegando que a ocorrência do acidente de trabalho deve ensejar o inadimplemento contratual e não a responsabilidade civil por ato ilícito.

Ocorre que, na verdade, quando se analisam os efeitos práticos, conclui-se que a responsabilidade contratual nada mais é que a responsabilidade objetiva do empregador, uma vez que, para o autor pesquisado, a culpa do empregador é presumida neste tipo responsabilidade, não precisando ser provada pelo empregado. Da mesma forma percebe-se que a responsabilidade extracontratual é semelhante à responsabilidade subjetiva, porquanto a culpa do empregador deve ser provada pelo empregado acidentado.

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Além das teorias, contratual e extracontratual, o presente trabalho abordará também as teorias sobre as responsabilidades subjetiva e objetiva do empregador, que tem como elemento diferenciador a culpa, dando ênfase à responsabilidade objetiva do empregador decorrente de acidente do trabalho.

4.1.1. Diferenciação entre a responsabilidade contratual e extracontratual do empregador

Na responsabilidade contratual o dever de indenizar nasce de um contrato firmado entre as partes, sendo que este pode ser expresso ou tácito. Já na responsabilidade extracontratual não há qualquer contrato celebrado entre as partes, nascendo o dever de indenizar com o descumprimento de algum dever legal. Assim sendo, uma das diferenças a ser apontada entre as espécies de responsabilidades é o contrato.

Francisco dos Santos Amaral Neto64, citando Manoel Domingos Andrade, assim diferencia a responsabilidade civil contratual e extracontratual ou aquiliana:

A primeira, quando resulta de ilícito contratual (não cumprimento ou cumprimento defeituoso de obrigação); a segunda, quando de ilícito extracontratual (violação de deveres gerais de abstenção pertinentes aos direitos absolutos). Poder-se-ia dizer que a responsabilidade contratual decorrente de infração de um "dever especial", enquanto a extracontratual, de um "dever geral". A primeira resulta, geralmente, de ato negativo (omissão); e a segunda, de ato positivo (ação).

O mesmo autor enfatiza, na sua visão, os elementos comuns, como o ato ilícito, a culpa, o dano e o nexo causal.

Todavia, também consigna algumas diferenças, nomeadamente:

i) a responsabilidade contratual decorre da relação obrigacional preexistente, enquanto na aquiliana a relação obrigacional surge pela primeira vez ao verificar-se o dano; naquele a prestação indenizatória é simples mudança do objeto na relação obrigacional, enquanto nesta o dever de ressarcir é obrigatório;

ii) a responsabilidade contratual pressupõe capacidade para contratar, enquanto a aquiliana pode decorrer de ato de incapacidade;

iii) na responsabilidade contratual, a solidariedade depende de prévio acordo, enquanto na aquiliana a previsão de solidariedade é legal;

iv) na responsabilidade contratual é possível a inclusão de cláusula convencional, para reduzir ou excluir a indenização, desde que não se contrarie a ordem pública;

v) somente no campo da responsabilidade aquiliana são ressarcíveis os danos morais.

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Outra diferença pontual entre a responsabilidade extracontratual e a contratual reside no ônus da prova, pois nesta, diferentemente daquela, na relação jurídica entre empregado e empregador, o empregado somente precisa demonstrar a ocorrência do dano e seu prejuízo, ficando a cargo do empregador a prova da ocorrência de uma das excludentes estabelecidas na lei, para que não seja responsabilizado.

Francisco dos Santos Amaral Neto65, trazendo à colação magistério de Adriano de Cupis aponta:

O instituto da responsabilidade civil se estabelece em torno da relação jurídica decorrente do ato ilícito, contratual ou extracontratual. Seu objetivo é puramente reparatório, não alcançando, por isso, os benefícios eventual-mente obtidos pelo autor do dano.

Raimundo Simão de Melo66, decantando Antônio Elias de Queiroga, assevera que:

Na responsabilidade contratual a indenização substitui, em quase todos os casos, a prestação inadimplida, abrangendo os danos emergentes (o prejuízo efetivamente sofrido) e os lucros cessantes (aquilo que razoavelmente a vítima deixou de ganhar). Na responsabilidade extracontratual ou aquiliana, a indenização, geralmente, consiste no pagamento de despesas efetuadas com a vítima (tratamento médico e/ou despesas hospitalares) e numa pensão equivalente à redução, perda total da capacidade laborativa ou morte da vítima.

A responsabilidade extracontratual é aquela que deriva da prática de um ato ilícito praticado pelo empregador. Tal ato ilícito, normalmente, nasce da violação de certos deveres oriundos de normas gerais de proteção ao trabalhador e ao meio ambiente do trabalho.

Enquanto na responsabilidade contratual existe uma presunção de culpa do empregador, pelo fato de se esperar o cumprimento de uma prestação positiva da sua parte, qual seja o adimplemento contratual. Na responsabilidade extracontratual devem restar comprovados os elementos...

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