O caso Charlottesville, a liberdade de expressão e o discurso de ódio

AutorElenita Araújo e Silva Neta - Adrualdo de Lima Catão
CargoPossui graduação em Direito pela Universidade Federal de Alagoas (2001) Mestrado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (2005) e Doutorado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (2009) - DoutPós-graduanda em Direito Penal e Direito Processual Penal pelo Centro Universitário Tiradentes (UNIT)
Páginas171-203
O CASO CHARLOTTESVILLE, A LIBERDADE DE
EXPRESSÃO E O DISCURSO DE ÓDIO
THE CHARLOTTESSVILLE CASE, FREEDOM OF EXPRESSION AND
HATE SPEECH
Recebido: 13/02/2021
Aceito: 14/04/2021
Adrualdo de Lima Catão
Possui graduação em Direito pela Universidade Federal de Alagoas (2001)
Mestrado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (2005)
e Doutorado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (2009).
Professor adjunto da Universidade Federal de Alagoas, Professor do Centro Universitário CESMAC,
Professor titular do Centro Universitário Tiradentes e
Secretário Executivo do Gabinete Civil do Governo do Estado de Alagoas.
Email: adrualdocatao@gmail.com;
https://orcid.org/0000-0003-3419-124X
Elenita Araújo e Silva Neta
DoutPós-graduanda em Direito Penal e Direito Processual Penal
pelo Centro Universitário Tiradentes (UNIT).
Graduada em Direito pelo Centro Universitário Tiradentes (UNIT).
Advogada. Membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/AL
Email: elenita.advocatus@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-6664-9078
RESUMO
O Caso Charlottesville acabou por suscitar como problemática a relação entre os limites da
liberdade de expressão e os reflexos do racismo institucional na atuação de grupos de extrema-
direita (Unity and Security for America e Ku Klux Klan) e de defesa de minorias (Black Lives
Matter); debatendo a questão sobre a manutenção de estátuas de representantes históricos que
defendiam a segregação racial. Assim, o presente artigo tratará de uma análise sobre o direito de
liberdade de expressão e a origem do racismo institucional através da observância de diplomas
legais (Alemanha, Estados Unidos e Brasil) com o objetivo de identificar os limites da liberdade
de expressão e os reflexos do racismo institucional no Caso Charlottesville. Após o cumprimento
do referido objetivo, identificamos que a apologia à segregações raciais corresponde a um limite
da liberdade de expressão e que serve de fundamento para o “discurso de ódio”; sobre o racismo
institucional, também foi possível identificar os seguintes reflexos: a defesa de monumentos
simbólicos que retratam valores relacionados à escravidão (como a estátua de Robert Lee), o
uso da violência pelos manifestantes em prol da supremacia racial e a utilização de elementos
racistas durante as manifestações, como tochas, armas pesadas, gestos e bandeiras nazistas.
Palavras-Chave: Caso Charlottesville. Liberdade de expressão. Racismo institucional. Discurso
de ódio. Segregação Racial.
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Revista Direito.UnB |Janeiro – Abril, 2021, V. 05, N.2 | ISSN 2357-8009| p. 171-203
ABSTRACT
The Carlottesville Case ended up raising as problematic the relationship between the
limites of freedom of expression and the reflexes of institutional racism in the perfomance
of extreme right groups (Unity and Security for America and Ku Klux Klan) and the
defense of minorities (Black Lives Matter); debating the issue of maintaining statues of
historical representatives who defended racial segregation. Thus, this article will deal
with na analysis of the right to freedom of expression and the origin of institucional racism
through the observance of legal diplomas (Germany, United States and Brazil) with the
aim of identifying the limits of freedom of expression and the reflexes of institutional
racism in the Charlottesville Case. After the fulfillment of that objective, we identified that
the apology for racial segregations corresponds to limit of freedom of expression and that
it serves as a basis for the “hate speech”; on institutional racism, it was also possible to
identify the following reflexes: the defense of symbolic monuments that portray values
related to slavery (such as the Tobert Lee statue), the use of violence by demonstrators
in favor of racial supremacy and use of racist elements during the demonstrations, such
as torches, heavy weapons, Nazi gestures and flags.
Keywords: Charlottesville Case. Freedom of expression. Institutional racism. Hate
speech. Racial segragation.
1. Introdução
O Caso Charlottesville trouxe à tona a discussão sobre os limites da liberdade
de expressão e os reflexos do racismo institucional quando manifestações eclodiram, no
ano de 2017, em torno da possível retirada da estátua do confederado Robert Edward Lee,
representante sulista e que apoiava a manutenção do regime de escravidão de negros.
Diante disso, a liberdade de expressão não possui um sentido unívoco, mas
pode ser compreendida como a capacidade que o indivíduo detém para expressar seus
pensamentos e ideias, recebendo proteção especial do Estado.
Contudo, é importante destacar que há discussão sobre o caráter não
absoluto do referido direito, de tal forma que proteger toda e qualquer liberdade de
expressão acaba por abrir margem para os denominados “discursos de ódio” e que
encontra relação direta com o racismo institucional.
Assim, enquanto que na Alemanha protege-se a liberdade de expressão
com a possibilidade de limitações, através de lei, de seu exercício; nos Estados Unidos,
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a própria Constituição Americana não menciona a possibilidade de limitações do
referido direito, tendo havido uma interpretação mais ampla da proteção da liberdade
de expressão, principalmente quando comparamos com a legislação alemã. Porém, no
Brasil, o referido direito não possui uma previsão expressa, mas se encaixa no gênero
“liberdade” e deve ser interpretado de acordo com cada caso em concreto, podendo
sofrer maiores (ou menores) limitações.
Com isso, o racismo institucional encontra relação com a liberdade de
expressão quando as manifestações de pensamento e de expressão possibilitam a
ocorrência do fenômeno “discurso de ódio”, gerando discriminação entre raças e gêneros,
envolvendo inclusive, grupos mais vulneráveis, como mulheres, negros e homossexuais.
Logo, através da análise dos diplomas legais (Alemanha, Estados Unidos
e Brasil), pode-se perceber que a presença do racismo institucional é notável e que,
atualmente, os países buscam abandonar essa realidade em busca de diplomas
que protejam ainda mais os direitos fundamentais das pessoas, como no caso da Lei
Fundamental da Alemanha, da Constituição Americana e da Constituição Federal do
Brasil de 1988.
Nesta seara, o presente artigo possui como principal objetivo a identificação
dos limites da liberdade de expressão e os reflexos do racismo institucional de acordo
com o Caso Charlottesville.
Importante mencionar que para se alcançar o citado objetivo, será feito
um estudo dos principais diplomas legais da Alemanha (Código Penal de 1936, Lei
Fundamental da Alemanha e o Código Penal Federal Alemão), dos Estados Unidos (Leis
de Crow, Constituição Americana, Lei dos Direitos de Voto) e do Brasil (Constituição
do Império do Brasil de 1924, Código Penal de 1830, Constituição Federal de 1988 e Lei
nº. 7.71/89); como forma de perceber a evolução do direito de liberdade de expressão
e do racismo institucional nos principais diplomas legais que versam sobre a temática,
principalmente em relação ao Brasil.
Além disso, serão utilizados os principais doutrinadores que tratam sobre
a temática, como Robert Alexy, Winfried Brugger, Jackson Lears, Stokely Carmichael
e Charles Hamilton, bem como serão utilizadas jurisprudências do Supremo Tribunal
Federal e da Corte Interamericana de Direito Humanos.
Portanto, o presente trabalho possui um caráter qualitativo e com uma
proposta de estudo analítico da problemática, através do uso de pesquisa documental,
como doutrina, artigo científicos, leis e jurisprudências; tudo com o intuito de alcançar os
resultados e conclusões sobre a referida problemática explicitada.
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