Casos superinteressantes sobre o júri

AutorFrancisco Dirceu Barros
Ocupação do AutorProcurador Geral de Justiça
Páginas259-335
Francisco Dirceu Barros
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4.1 O advogado que não acreditou em seu cliente
Acarreta nulidade o fato de existir contradição entre a palavra do réu e a defesa
realizada pelo advogado no plenário do júri?
Resposta: não. Em um caso em que se vericou contradição entre a palavra do réu
e a defesa técnica desenvolvida, decidiu o STF:
Se o defensor se convence, ante os elementos colhidos nos autos, de que a alegação de nega-
tiva de autoria não trará proveito ao acusado e adota outras teses defensivas, com eciência e,
no caso, até com êxito, não se pode dizer que o réu tenha cado indefeso. RE não conhecido.325
Em outro caso, o advogado não acreditou na negativa de autoria do seu cliente e o
processo não foi nulo. Veja a síntese do caso, conforme a decisão do STJ.
O advogado não é obrigado a negar a autoria de crime cometido por pessoa a quem
ele representa se a própria representada confessou o delito no curso do inquérito policial
e do processo penal e se a conssão estiver amparada em outras provas. Esse entendi-
mento embasou a decisão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de negar
pedido de habeas corpus proposto em favor de um padrasto acusado de estupro contra a
enteada de seis anos.
No caso julgado, o responsável pelo ajuizamento do habeas corpus alegou que
a defesa do réu na primeira e na segunda instância da Justiça de Goiás foi insuciente.
Sustentou que o defensor do acusado não inquiriu nenhuma das testemunhas durante a
audiência ocorrida no curso do processo e que sua defesa nal foi “parcimoniosa, carente
de motivação” e sequer desenvolveu argumentos favoráveis a ele, limitando-se a pedir que
sua pena fosse imposta em grau mínimo.
Na ação proposta contra o acusado, vericou-se que os depoimentos prestados por
ele à polícia e à Justiça, nos quais confessava a prática do crime, continham diversos
325 RE-Cr nº 105.802-1/PR, J. 08/09/1987, v. u., Rel. Min. Sydney Sanches – RTJ, nº 124/635.
Capítulo 4
Casos superinteressantes sobre o júri
Manual do Júri
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pontos em comum com as declarações feitas por sua ex-mulher e mãe da vítima, pela
própria vítima e por outras testemunhas.
“A admissão da autoria, por parte do representante técnico do acusado, quando nem
ele próprio nega a prática dos crimes e cuja conssão é amparada em todos os demais
elementos de prova, é uma alternativa possível, mas nada razoável, porque desacredita
e desmoraliza a própria defesa, que não é obrigada a negar a autoria nessas condições”,
escreveu o relator do caso, ministro Paulo Medina.
4.2 O inimputável por doença mental
O inimputável, nos termos do art. 26 caput, do Código Penal, pode ser pronunciado?
Damásio leciona que “aplica-se o art. 411 (atual 415 do Código de Processo Penal)
deste código, absolvendo-se sumariamente o acusado (RT nº 720/422)”.
Ainda cita, o renomado autor, outros julgados:
a) Exame psiquiátrico: se juiz e Ministério Público manifestaram profunda impressão
de que o réu estava mentalmente enfermo no tempo e, logo depois dos crimes,
não pode subsistir pronúncia sem que se tivesse feito o exame psiquiátrico (STF,
RTJ nº 52/390).
b) Inimputabilidade por doença mental (CP, art. 26, caput): a questão não pode ser
remetida para o júri (RT nº 718/373 e nº 720/422).
c) Absolvição por inimputabilidade decorrente de doença mental ou desenvolvimen-
to mental incompleto ou retardado (CP, art. 26, caput): efeito. Impõe-se medida
de segurança (CP, art. 97).
Minha posição: com a reforma, a inimputabilidade é caso de absolvição sumária,
mas algo deve ser melhor esclarecido; a possibilidade do inimputável ser pronunciado é
o caso da inimputabilidade não ser a única tese da defesa, pois o parágrafo único do art.
415 é bem claro:
--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Não se aplica o disposto no inciso IV do caput deste artigo ao caso de inimputabilidade prevista
quando esta for a única tese defensiva:
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4.3 “A insanidade no plenário do júri”
Problematização: Tício, que é advogado, perante o plenário do júri, alegou que
seu cliente era débil mental e que, ao tempo do crime, não tinha condições de entender o
caráter ilícito do fato. Aponte a solução jurídica, considerando que:
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a) a alegação de insanidade mental não foi anteriormente apresentada em nenhum
momento processual.
Resposta: Existe divergência.
1ª posição: entendo que os jurados e o presidente do Egrégio Tribunal Popular do
Júri não têm condições de aferir se, ao tempo da ação ou omissão, o agente, em razão de
sua enfermidade ou de seu desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era incapaz
de entender o caráter criminoso do fato ou de determinar-se de acordo com esse enten-
dimento. Caso a alegação seja realizada em plenário, suspende-se o julgamento para a
realização da perícia. Compartilham deste entendimento: Damásio e Mirabete.
Nessa posição seguem, no contexto prático, duas hipóteses:
Primeira hipótese: Alegado no plenário do júri que o réu não tem atualmente ou
não tinha condições, ao tempo do crime, de entender o caráter ilícito do fato, e, se o juiz
presidente do júri constatar que há dúvida sobre a integridade mental do acusado, deter-
minará a suspensão do julgamento, destarte, a realização da perícia.
Nesse caso, a conclusão da perícia pode acarretar três hipóteses práticas distintas:326
1- Se a perícia concluir no sentido de que, embora plenamente capaz ao tempo do fato, sobre-
veio doença mental ou perturbação da saúde mental em momento posterior, situação essa ainda
persistente: nesse caso, o processo cará paralisado até o restabelecimento do acusado, nos
termos do art. 152 do CPP. Recuperado o réu, o feito torna a tramitar, realizando-se o julgamento
pelo tribunal do júri, normalmente .
2- Se a perícia concluir no sentido de que, ao tempo do fato, o agente encontrava-se em estado de
incapacidade total (inimputabilidade) para compreender o caráter ilícito de sua conduta ou de se auto-
determinar de acordo com esse entendimento: perfazendo-se essa hipótese, o processo prosseguirá,
na presença de curador (art.151doCPP), realizando-se, inclusive, o julgamento pelo Tribunal do Júri.
3- Se a perícia concluir no sentido de que, ao tempo do fato, o agente possuía apenas parcial
capacidade (semi-imputabilidade) para compreender o caráter ilícito de sua conduta ou de se
autodeterminar de acordo com esse entendimento: Nessa hipótese, sob pena de nulidade, a
semi-imputabilidade deverá ser quesitada aos jurados, podendo eles decidir, inclusive, contra
as conclusões da perícia (v.g., no sentido de que o réu era completamente capaz ao tempo da
infração penal). Reitere-se que a semi-imputabilidade, prevista no art. 26, parágrafo único, do
CPP, é causa de redução de pena, sendo que o art.483, IV, do CPP preceitua que, concluindo os
jurados por não absolver o réu, deverá ser quesitado o Conselho de Sentença quanto à existên-
cia de causa de diminuição de pena.
Segunda hipótese: Alegado no plenário do júri que o réu não tem atualmente ou
não tinha condições, ao tempo do crime, de entender o caráter ilícito do fato, e, se o juiz
presidente do júri constatar que não há nada nos autos que indique dúvida sobre a integri-
dade mental do acusado, indefere o pedido, determina o prosseguimento do julgamento e
manda constar na ata.
326 Fonte da pesquisa: AVENA, Norberto Cláudio Pâncaro. Processo Penal. São Paulo: Método, 2014.

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