Cédula de credito bancário - endosso sem garantia

AutorHaroldo Malheiros Duclerc Verçosa
Páginas282-287

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Consulta

Consulta-nos o Banco (...) (Banco) a respeito de operações com a Cédula de Crédito Bancário - CCB, em relação à qual pretende montar uma operação para oferecimento a seus clientes, materializada pelo endosso de tais títulos aos interessados, com cláusula "sem garantia".

Nas operações em tela, um cliente do Banco emitirá o mencionado título que poderá ser transferido ao adquirente interessado no mesmo dia da emissão, com a cláusula "sem garantia", conforme dito acima, da qual resultará que o Banco não responderá perante o adquirente da CCB diante de eventual inadimplemento do seu emitente.

Preocupa-se o Banco com eventual tentativa de sua responsabilização patrimonial pelo endossatário frustrado quanto ao não pagamento da CCB pelo emitente, sob alegação de que, correspondendo tal operação a um "produto do Banco", essa instituição deveria responder no caso de inadimplemento do emitente, tendo em vista sua obrigação de zelar pela seletividade, garantia, liquidez e diversificação de risco em todas as CCBs que lhe sejam transferidas originalmente pelo emitente.

Não deve ser esquecido na análise da presente Consulta que o Supremo Tribunal Federal passou a entender pela grande maioria dos seus integrantes que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) aplica-se às instituições financeiras em significativa extensão. Destaque-se, neste passo que saber-se qual o nível de sujeição das instituições financeiras ao CDC dependerá da interpretação do acórdão correspondente, ainda não publicado.

Da resposta à Consulta efetuada

A resposta à Consulta em tela depende do estabelecimento dos fundamentos necessários, conforme abaixo examinados.

1. A história e a natureza jurídica da Cédula de Crédito Bancário

A CCB foi originalmente criada pela MP 1.925, de 14.10.1999 e reformulada pelaLei 10.931, de 2.8.2004, nos seus arts. 26 a 45.

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O referido título está inserido dentro de um processo mais geral, destinado a proporcionar a redução dos juros cobrados pelas instituições financeiras dos seus clientes, do qual também fez parte a nova Lei de Recuperação de Empresas e de Falências, destacando-se o importante papel do Banco Central do Brasil na génese desses dois institutos jurídicos.

Do ponto de vista de sua natureza jurídica, a CCB é um titulo de crédito, emitido por pessoa física ou jurídica, em favor de uma instituição financeira ou de entidade a esta equiparada, representando uma promessa de pagamento em dinheiro, decorrente de operação de crédito, de qualquer modalidade (Lei 10.931/2004, art. 26).

Como promessa de pagamento, a CCB equipara-se à Nota Promissória, regida pelos arts. 75 a 77 do Decreto 57.663, de 24.1.1966 (Lei Uniforme de Genebra). À Nota Promissória e, conseqiientemente, à CCB aplicam-se, por sua vez, os artigos relativos à Letra de Câmbio, conforme disposto no art. 77 do Decreto supra, inclusive e especialmente no respeitante ao endosso (arts. 11 a 20 da Lei Uniforme).

Conforme se verifica, a CCB é um título de crédito duplamente causal porque: (i) somente pode ser emitida a partir de uma operação de crédito de qualquer natureza; e (ii) operação de crédito esta obrigatoriamente realizada com uma instituição financeira ou entidade assemelhada, como tais entendidas aquelas relacionadas no art. 17 da Lei 4.595/1964.

Ao conceder crédito ao seu cliente, a instituição financeira "transforma" o seu crédito em uma CCB, que o representará para todas as finalidades jurídicas, uma vez que o documento em causa se reveste da qualidade cambial de cártula, conforme estabelecido pela Teoria Geral dos Títulos de Crédito. Nos termos do art. 887 do Novo Código Civil, trata-se de "documento necessário ao exercício do direito literal e autónomo nele contido", adotado pelo NCC de forma não perfeitamente adequada o conceito de Vivante em matéria de títulos de crédito.

No mesmo teor do parágrafo anterior, dispõe o art. 27, caput do art. 28 da Lei 10.931/2004, que "A Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial e representa dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo, ou nos extratos da conta corrente (...)".

Conforme se verifica, a CCB assume uma posição peculiar entre os títulos de crédito porque pode caracterizar-se, de acordo com os critérios de...

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