Os chamados da população para a polícia: a gestão policial do território em contextos de aproximação entre polícia e população, o caso do Ronda do Quarteirão

AutorWendell de Freitas Barbosa
Páginas225-251
Direito, Estado e Sociedade n.51 p. 225 a 251 jul/dez 2017
Os chamados da população para a polícia:
a gestão policial do território em contextos
de aproximação entre polícia e população,
o caso do Ronda do Quarteirão
The calls for service made to the police: the police
management of territory in contexts of approximation
between police and population, the case of
“Ronda do Quarteirão”
Wendell de Freitas Barbosa*
Universidade Federal do Cariri, Juazeiro do Norte-CE, Brasil
1. Introdução
Este artigo reúne importantes ref‌lexões frutos de pesquisa realizada entre
os anos de 2010 e 2012 com policiais militares e moradores da cidade de
Juazeiro do Norte, Ceará1. O trabalho de campo foi realizado acompanhando
os policiais na viatura durante a realização do patrulhamento e o atendi-
mento aos chamados da população. Também foram mantidas relações com
moradores dos bairros que possuíam residência na área de operações da
polícia militar da cidade onde o estudo se concentrou.
A investigação sobre as forças policiais como objeto de estudo da socio-
logia tem em suas raízes a abordagem de Max Weber sobre a consolidação
do Estado moderno. Para ele, tal processo foi possível mediante a raciona-
lização dos meios de legitimidade da dominação, baseado em princípios
* Doutor em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará. Professor Adjunto da Universidade Federal
do Cariri, vinculado ao Centro de Ciências Sociais Aplicadas e ao Curso de Administração Pública. E-mail:
wendell.Barbosa@ufca.edu.br.
1 Região situada ao centro-sul cearense entrecortando estados circunvizinhos. No Ceará, a microrregião
inclui as cidades de Juazeiro do Norte, Crato, Barbalha, Jardim, Missão Velha, Nova Olinda, Porteiras, San-
tana do Cariri, Caririaçu e Farias Brito. A região metropolitana se concentra nos municípios de Juazeiro do
Norte, Crato e Barbalha, cidades com maiores populações, equipamentos urbanos e atividade econômica.
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legais impessoais. Essa conf‌iguração se manteria estável por meio autoriza-
ção social do monopólio legítimo da força física pelo Estado. Embora a sua
discussão se restrinja à atuação do uso desse instrumental para a proteção
das fronteiras e do território dos Estados Nacionais Modernos2, a regula-
ção interna do território também está relacionada a reivindicação desse
monopólio legítimo. O objeto de atenção desse artigo recorta justamente
os contextos da atuação das forças policiais, especif‌icamente a atuação da
Polícia Militar do Ceará (PMCE) e sua relação com a população, durante as
atividades de patrulhamento e o atendimento a ocorrências.
O olhar sobre a conf‌iguração das forças policiais e da segurança pública
pelas ciências sociais tem provocado profícuos debates entre a academia
e o poder público. Essa tradição, que, no Brasil, tem como um de seus
pilares os estudos realizados na década de 1980 por Paulo Sérgio Pinheiro
sobre a crise nas polícias militares3, tem inspirado uma incursão analítica
sobre as práticas policiais. Os estudos brasileiros sobre as práticas policiais
têm polarizado tradicionalmente os dilemas na ruptura do legado auto-
ritário, relacionado ao período da ditadura militar (1964-1985), com a
implantação do regime democrático no Brasil. Os estudos apontam para
a dif‌iculdade que a ruptura com práticas atribuídas à polícia tradicional
(truculência, desrespeito aos direitos humanos, repressão aos movimentos
sociais etc.) gera para o surgimento de uma “nova” polícia (respeitando aos
direitos humanos, fortalecendo o diálogo e a aproximação com a sociedade)
de interesse e af‌inidade democrática.
No caso do estado do Ceará em particular, destacam-se os estudos de
Brasil4, Barreira5, Pinheiro6 e Freitas, Melo e Almeida7 que, discutindo essa
temática, ref‌letiram sobre os avanços e recuos na democratização das prá-
ticas policiais no Ceará8. Esses pesquisadores têm discutido as dif‌iculdades
de mudança no interior do campo da política de segurança pública, frente
2 WEBER, 2002.
3 PINHEIRO, 1982.
4 BRASIL, 2003.
5 BARREIRA, 2004.
6 PINHEIRO, 2008.
7 FREITAS; MELO; ALMEIDA, 2010.
8 No cenário nacional mais amplo, sobretudo em abordagens sobre a crise das instituições policiais no con-
texto da região sudeste brasileira, podem ser citados outros autores que pensaram sobre questões semelhantes,
ver, por exemplo: CERQUEIRA, 2001; MUNIZ, 2001; ZAVERUCHA, 2001; e BENGOCHEA, 2004.
Wendell de Freitas Barbosa

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