Cláudio Souto e Solange Souto: a saga, a substancialidade, o intersiv

AutorArtur Stamford da Silva Silva
CargoProfessor Titular de Sociologia do Direito da Faculdade de Direito do Recife
Páginas39-55
REVISTA ACADÊMICA
Faculdade de Direito do Recife
Edi
çã
o Comemorativa dos 130 anos da Revista Acad
ê
mica
SILVA, Artur Stamford da. CLÁUDIO SOUTO E SOLANGE SOUTO: A SAGA, A SUBS TANCIALIDADE, O INTERSIV.
Revista Acadêmica da Faculdade de Direito do Recife - ISSN: 2448-2307, Edição C omemorativa dos 130 anos da Revista
Acadêmica, p. 39-55. Nov. 2021. ISSN 2448-2307. <Disponível em:
https://periodicos.ufpe.br/revistas/ACADEMICA/article/view/252569>
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CLÁUDIO SOUTO E SOLANGE SOUTO: A SAGA, A
SUBSTANCIALIDADE, O INTERSIV
CLÁUDIO SOUTO AND SOLANGE SOUTO: THE SAGA, THE SUBSTANCIABILITY,
THE INTERSIV
Artur Stamford da Silva
1
RESUMO
Sinônimos de sociologia do direito no Brasil não apenas por suas dedicações ao ensino e à
pesquisa nessa área, mas também por seus nomes se confundirem com o surgimento, a
continuidade e a existência dessa disciplina em cursos de direito no Brasil, Cláudio Souto e
Solange Souto se dedicaram à construção de uma teoria substantiva do direito como justiça,
movendo-se em contrafluxo aos modismos, posto que sua teoria é substantiva, axiomática e não
coercitiva, em tempos de procedimentalismo, consenso e coercitividade. Estas reflexões estão
pautadas por pesquisa bibliográfica baseada em obras dos autores publicadas de 1952 a 2019 e
bibliografia secundária. Dentre os achados, observamos a saga do pensar sociologicamente o
direito vivenciada por Cláudio Souto e Solange Souto. Outro achado foi quanto à base empírica da
teoria substantiva, o sentimento de justiça e da ideia de dever ser como elementos básicos do
controle social que foi fruto da análise dos dados da pesquisa realizada em 1965, em Colônia,
Alemanha, e replicada mais uma vez no Brasil. Por fim, a relação entre direito e força. A teoria
substantiva, parte da indissociabilidade direito e justiça face ao interSIV, do que resulta a
coercitividade não ser elemento essencial ao direito.
Palavras-chave: Sociologia do direito; Cláudio Souto; Solange Souto; Escola do Recife; Composto
siv.
ABSTRACT
Synonymous of sociology of law in Brazil not just because the dedication to teaching and
research in this area, but also because their names are confused with the emergence, continuity and
existence of this discipline in law courses in Brazil, Cláudio Souto and Solange Souto dedicated
themselfs to construction of a substantive theory of law as justice, moving against the flow to the
fads, since her theory is substantive, axiomatic and non-coercive, in times of proceduralism,
consensus and coerciveness. These reflections are guided by bibliographic research based on the
authors' works published from 1952 to 2019 and secondary bibliography. Among the find outs, we
observe the saga of thinking sociologically about law experienced by Cláudio Souto and Solange
Souto. Another find out was regarding the empirical basis of the substantive theory, the feeling of
justice and the idea of ought to be basic elements of social control was the result of the analysis of
data from the survey carried out in 1965, in Cologne, Germany, and replicated once more in the
Brazil. Finally, the relationship between law and force. The Substantive theory starts from the
inseparability of law and justice from the interSIV, which results in coerciveness not being an
essential element of law.
Keywords: Sociology of law; Claudio Souto; Solange Souto; Recife School; Siv compost.
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Professor Titular de Sociologia do Direito da Faculdade de Direito do Recife. CCJ -UFPE. Pesquisador 1D pelo
CNPq.
REVISTA ACADÊMICA
Faculdade de Direito do Recife
Edi
çã
o Comemorativa dos 130 anos da Revista Acad
ê
mica
SILVA, Artur Stamford da. CLÁUDIO SOUTO E SOLANGE SOUTO: A SAGA, A SUBS TANCIALIDADE, O INTERSIV.
Revista Acadêmica da Faculdade de Direito do Recife - ISSN: 2448-2307, Edição C omemorativa dos 130 anos da Revista
Acadêmica, p. 39-55. Nov. 2021. ISSN 2448-2307. <Disponível em:
https://periodicos.ufpe.br/revistas/ACADEMICA/article/view/252569>
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1 INTRODUÇÃO
Pensar o Brasil brasileiro não traz qualquer novidade. As leituras de sua história alertam
para que 1822 não só “não colocou o Brasil no ritmo da história” (IANNI, 2004, p. 15), como
equacionou um país capaz de vivenciar uma monarquia sem reinado, uma república sem partido,
um país caudilhista e sem projeto nacional: um Brasil brasileiro de síndrome portugalesca?
Por mais que saibamos o quanto “história não é bula de remédio” (SCHWARCZ, 2019, p.
11), chama atenção o quanto umas histórias perpetuam ideias, concepções, preconceitos sob o
manto de justificações racionais; enquanto outras contam registros de conquistas e vitórias e, às
vezes, até de superação de preconceitos e desigualdades.
No caso do país do futuro - país com oitava colocação dentre os piores índices de
desigualdade social, comparado a 124 países constantes no Relatório de Desenvolvimento Humano
do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) - temos quem comemore com
afã nossa capacidade de conviver com IDH de 0,574% e concentração de renda em menos de 5%
da população
2
.
O Brasil não é para amadores, justo por ser um país muito amador.
Não norteamos, fica dito, nossas reflexões por qualquer idealismo, antes, partimos de que
“terra aonde eu não vou, o feijão dá na raiz”, ao mote de Adalgisa Falcão. Assim ela se expressava
ao se referir ao sonho perfeccionista dos ideais que apontam terras desconhecidas como
exemplares. Tão perfeitas, que o feijão não germina, o coleóptilo sequer precisa se formar, os
cotilédonos se abrem e lá está o grão de feijão pronto a ser consumido. Não é preciso irrigar, o
caule nem nasce para sustentar os brotos e as vargens. Os grãos do feijão simplesmente estão lá,
surgidos. Estão lá, simples assim. A serem colhidos na e pela raiz.
Não foi assim, com essa magia que a sociologia do direito teve lugar nos cursos de direito
no Brasil. Os embriões Cláudio Souto e Solange Souto vivenciaram uma verdadeira saga pelo
pensar sociologicamente o direito (SOUTO, 1987b; SOUTO, 2016, p. 22-38). Essa história
registra, já no artigo publicado em 1952 até o artigo publicado em 2019, passando pelos livros e
pela bibliografia secundária, o conservadorismo dogmaticopata perpetuado nos intramuros da
Faculdade de Direito do Recife. Incrível como em 2021 ainda há quem fale em separação entre
dogmática jurídica e os “saberes de outras áreas formativas”
3
, principalmente quando alguém ainda
defende uma formação jurídica sem as disciplinas propedêuticas ou, já que são saberes obrigatórios
a serem oferecidos, que assim sejam ao final do curso. Incrível como é preferível discentes sem
reflexividade e treinados a reproduzir textos legislativos e, quando muito, algumas decisões
judiciárias. Mas a saga vivenciada por Cláudio e Solange vivenciaram para a sociologia do direito
vir a ser disciplina nesta e desta Faculdade ainda resiste. Como escreve Cláudio Souto:
O desenvolvimento da sociologia do direito se caracteriza por dois períodos básicos. O
período inicial se marca pela hostilidade tanto de sociólogos como de juristas à sociologia
do direito. O segundo período, que alcança nossos dias, tem sido um período de abandono
da disciplina por sociólogos e por juristas embora tal abandono se torne cada vez mais
relativo (SOUTO, 1977, p. 1).
Assim, contudo, sobre esse ponto, não desenvolvemos reflexões de história, mas acusamos
Cláudio Souto e Solange Souto de importunarem os doutos dogmaticopatas que ainda circulam
nos salões conservadores, nos quais se enunciam a hipótese de ser possível prática jurídica sem
vida social, de ser possível separar teoria e prática, de ser possível separar direito de sociedade. A
estes, a vida evidencia o quando nunca existe o direito dado, que está lá, simples assim. Como
todos sabem. Os grãos do direito nunca simplesmente surgem, assim, do nada. Nunca estão lá,
2
Dados obtidos no site do IBGE. https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/educacao/9050 -pesquisa-de-
orcamentos-familiares.html?=&t=o-que-e
3
Essa é a terminologia emprega na Resolução Nº 2, de 19 de abril de2021, do Ministério da Educação, q ue rege as
Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direito. No elenco de área s formativas estão:
“Antropologia, Ciência Política, Economia, Ética, Filosofia, História, Psicologia e Sociologia”.

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