Cláusulas pétreas e direitos sociais: orçamento mínimo social

AutorFernando Facury Scaff
Páginas222-235
CLÁUSULAS PÉTREAS E DIREITOS SOCIAIS:
O ORÇAMENTO MÍNIMO SOCIAL
Fernando Facury Scaff
Professor Titular de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo. Professor Titular de
Direito Financeiro e Tributário da Universidade Federal do Pará (aposentado). Livre-docente
e Doutor em Direito pela USP. Advogado sócio do escritório Silveira, Athias, Soriano de Mello,
Guimarães, Pinheiro e Scaff — Advogados.
1. INTRODUÇÃO
A liberdade do legislador oeçamentário e suas restrições constitucionais: as cláusulas pétreas
sociais
A ideia básica por trás da expressão liberdade do legislador orçamentário é a afirmação de que os Poderes
eleitos devem ter à sua disposição todos os recursos públicos para estabelecer as políticas que pretendem
implantar durante seu mandato. Logo, quanto mais verbas livres o legislador tiver, maior será seu grau de
liberdade para o estabelecimento das prioridades para as políticas públicas que vier a determinar.
Um exemplo oriundo do Tribunal Constitucional Alemão pode ilustrar essa ideia(1). Duas Universidades
alemãs estabeleceram restrições ao acesso direto de alunos(2) ao curso de “medicina humana” (medicina e
odontologia), nos anos de 1969 e 1970. A Universidade de Hamburgo determinou que as vagas disponíveis
para os candidatos alemães deveriam ser distribuídas na proporção de 60% segundo o curriculum do
candidato, e 40% segundo o ano de nascimento, sendo possível haver a reserva de vagas para situações
excepcionais, porém não limitou o número de vagas total. Já a Universidade da Bavária — ponto central do
tema — estabeleceu limitação de vagas para algumas áreas do conhecimento, se isso fosse estritamente
necessário à manutenção do funcionamento regular de um curso, tendo em vista a capacidade das
instalações dos “campi” daquela Universidade.
Foi contra estas normas que se pronunciou o Tribunal Constitucional alemão, em controle concentrado,
apresentado pelos Tribunais Administrativos daqueles dois Estados-membros da Alemanha.
O Tribunal Constitucional alemão entendeu que a limitação de vagas estabelecida pela Universidade
da Bavária não era adequada por “seu efeito extremamente incisivo, pois ele faz com que um número maior
ou menor dos candidatos tenha que adiar o início do curso desejado por um tempo mais ou menos longo.
(...) Candidatos socialmente mais carentes não têm as mesmas possibilidades, como os mais abastados, de
passar por períodos mais longos de espera ou de tentar a realização de um curso no exterior. Tal limitação,
(1) BVERFGE 33, 303, de 18.07.1972, extraído da obra “Cinquenta anos de jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal Alemão”
(Montevidéu: Fundação Konrad Adenauer, 2005. p. 656/667).
(2) Como regra, o acesso ao ensino superior é amplo e direto em vários países europeus, em face da inexistência de número de vagas nos
cursos. No Brasil, diferentemente, existe uma seleção prévia ao ingresso no ensino superior, em face do número de vagas ser previamente
determinado, o que pode ocorrer através de uma prova denominada “vestibular” ou através do ENEM — Exame Nacional de Cursos.
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