A colonialidade do poder como lógica racista do sistema de justiça brasileiro

AutorGrazielly Baggenstoss, Leandro Coelho
CargoUniversidade Federal de Santa Catarina, UFSC, Brasil. E-mail: grazyab@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-9086-8019 - Universidade Federal de Santa Catarina; UFSC, Brasil. E-mail: leandrobio@grad.ufsc.br https://orcid.org/0000-0002-6152-2561
Revista Direito.UnB |Revista Direito.UnB | Maio-Agosto 2021, V. 05, N. 02 | ISSN 2357-8009 | pp. 75-102 Maio-Agosto 2021, V. 05, N. 02 | ISSN 2357-8009 | pp. 75-102
74 7574
A COLONIALIDADE DO PODER COMO LÓGICA RACISTA
DO SISTEMA DE JUSTIÇA BRASILEIRO
THE COLONIALITY OF POWER AS A RACIST LOGIC OF THE
BRAZILIAN JUSTICE SYSTEM
Grazielly Alessandra Baggenstoss
Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, Brasil .
E-mail: grazyab@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-9086-8019
Leandro Coelho
Universidade Federal de Santa Catarina; UFSC, Brasil.
E-mail: leandrobio@grad.ufsc.br
https://orcid.org/0000-0002-6152-2561
RESUMO
O presente estudo tem como objetivo delinear, de forma sistêmica, algumas direções -
senão as principais - do racismo institucional no Sistema de Justiça Brasileiro. Não se tem o
objetivo de exaurir a temática, mas de apresentar um mapa de organizações vinculadas ao
Sistema de Justiça em que se verificam padrões de comportamento racistas. Para tanto, é
necessário enfrentar e compreender, pela intergeracionalidade, (a) a lógica de economia
política dos corpos, que se mantém pautada em uma mentalidade colonial e que explica
(b) a genealogia do Estado Moderno, que embasa ideologicamente o Direito brasileiro;
refletir sobre (c) a formação em Direito; e (d) examinar a lógica da prática jurídica. Com
tal objetivo, este estudo se desenha como pesquisa exploratória e descritiva, estruturada
em revisão bibliográfica narrativa com estudos antidiscriminatórios de enviesamento
epistemológico a partir do Sul. No campo da prática jurídica, como resultados, expõe-se
o reconhecimento do próprio Poder Judiciário como operador de lógicas racistas, razão
pela qual estabeleceu, em 2020, medidas de combate ao racismo institucional. Contudo,
ainda são necessários avanços e enfrentamentos, especialmente nas escolas jurídicas
e judiciais.
Palavras-chave: Sistema de Justiça; Racismo Institucional; Colonialidade; Direito
Antidiscriminatório.
Recebido: 20/01/2021
Aceito: 25/07/2021
Este é um artigo de acesso aberto licenciado sob a Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-SemDerivações Internacional
4.0 que permite o compartilhamento em qualquer formato desde que o trabalho original seja adequadamente reconhecido.
This is an Open Access article licensed under the Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0 International License
that allows sharing in any format as long as the original work is properly acknowledged.
Dossiê Temático | Thematic Dossier | Dossier Temático | Dossier Thématique
Revista Direito.UnB Revista Direito.UnB || Maio-Agosto 2021, V. 05, N. 02 | ISSN 2357-8009 | pp. 75-102 Maio-Agosto 2021, V. 05, N. 02 | ISSN 2357-8009 | pp. 75-102
76
ABSTRACT
The present study aims to outline, in a systemic perspective, some directions of institutional
racism in the Brazilian Justice System. The aim is not to exhaust the theme, but to present
a map of organizations linked to the Justice System in which there are patterns of racist
action. Therefore, it is necessary to face and understand, through intergenerationality,
(a) the logic of political economy of bodies, which remains guided by a colonial mentality
and which explains (b) the genealogy of the Modern State, which ideologically supports
Brazilian law; reflect on (c) training in law; and (d) examine the logic of legal practice. With
this objective, this study is designed as an exploratory and descriptive research, structured
in a narrative bibliographic review with anti-discriminatory studies of epistemological bias
from the South. In the field of legal practice, as results, it is exposed the recognition of the
Judiciary itself as operator of racist logics, which is why, in 2020, it established measures
to combat institutional racism. However, advances and confrontations are still needed,
especially in the legal and judicial schools.
Keywords: Justice system; Institutional Racism; Coloniality; Anti-Discrimination Law.
1. Introdução: Delineamentos sobre o mapa sistêmico de ocorrências
de discriminações
O Direito brasileiro apresenta um conjunto de normas específico para o
enfrentamento de discriminações. Contudo, não é o suficiente: muitas formas de
discriminação são pautadas em características e condições pessoais e coletivas que
provocam distinções equivocadamente hierarquizadas (e hierarquizantes) entre as
pessoas e, ainda, repetem-se, em atualização constante, há um longo período de tempo
- uma complexidade que o Direito brasileiro (ainda) não dá conta. Além disso: a lógica
discriminatória encontra-se, também, como elemento estruturante da sociedade e das
instituições, inclusive do Estado brasileiro. É o que ensinam as diretrizes do Direito
Antidiscriminatório. Moreira leciona que
[...] a exclusão social pode ocorrer mesmo na ausência objetiva da intenção de
discriminar um indivíduo e também em situações nas quais não há a utilização
de formas de diferenciação legalmente vedadas. Uma norma jurídica, política
pública ou decisão institucional podem obedecer ao princípio da generalidade,
não sendo dirigidas a nenhum grupo específico. Porém, a sua aplicação pode
ter um efeito desproporcional sobre uma determinada classe de indivíduos, o
que caracteriza a discriminação indireta. Uma norma dirigida à generalidade das
pessoas, não fazendo, portanto, menção a quaisquer características pode ter
efeitos discriminatórios 1.
1 MOREIRA, Adilson. O que é discriminação? Belo Horizonte: Letramento, 2017, p. 102.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT