O combate ao assédio moral através da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações de emprego

AutorAdriana Wyzykowski/Renato Da Costa Lino De Goes Barros/Rodolfo Pamplona Filho
Ocupação do AutorProfessora substituta da Universidade Federal da Bahia ? (UFBA)/Professor de Direito do Trabalho do Centro Universitário Jorge Amado e da Faculdade Dois de Julho/Juiz Titular da 1ª Vara do Trabalho de Salvador/BA
Páginas197-211

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6.1. A prevenção: o melhor caminho

O assédio moral, como foi visto ao longo desta pesquisa, traz malefícios das mais variadas naturezas para todos os sujeitos que estão envolvidos. A vítima, o agressor e a empresa ficam sujeitos às consequências já elencadas, gerando inquietações e prejuízos para todos. A grande celeuma, em razão de tais dados, revela-se diante do seguinte questionamento: como combater o assédio moral?

Primeiramente, deve-se pensar em uma atuação preventiva457 para a realização do combate ao assédio moral. Educação e conhecimento são as palavras chaves para que tal conduta seja evitada.

Note-se que, quando o empregado consegue reconhecer condutas abusivas e sabe como agir diante destas, evita-se a consolidação do assédio moral, afinal tal comportamento não irá se perpetuar na relação de emprego. Tal afirmativa é válida para as mais diversas formas de assédio moral, de modo a não se limitar ao âmbito empresarial. Nas escolas, na família ou em grupos religiosos saber identificar e lidar com o assédio moral é saber evitar conflitos.

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Pode-se pensar, para promover essa educação, em políticas públicas e privadas direcionadas ao combate ao assédio moral. Atualmente é possível visualizar algumas campanhas educativas sobre o assédio moral, como a elaboração de cartilhas e palestras sobre o tema. Os jornais e revistas também vêm atuando no tocante à informação das pessoas sobre tal malefício.

Contudo, tais condutas ainda não são suficientes para coibir o mal que o assédio moral gera. A sociedade clama por mais informação, educação e conhecimento sobre o assunto, uma vez que este é o caminho mais seguro para se defender das condutas violadoras dos seus direitos fundamentais, como ocorre no assédio moral.

Afora isso, no âmbito empresarial, deve ser implementado um sistema de prevenção às práticas de assédio moral. Tal conduta, além de preservar a saúde física e psíquica do trabalhador, ainda evita as consequências futuras da prática de assédio moral.

6.1.1. A postura organizacional

Segundo Hirigoyen458, fiel ao estudo da psicanálise do assediador, quando são buscadas “as origens de alguma conduta de assédio dentro de determinado contexto profissional, encontramos um conjunto de disfunções e desvios de pessoas, mas a organização tem sempre sua parcela de culpa”.

Como bem pondera Passos459, “o assédio desenvolve-se com maior frequência em espaços onde não há ética, onde falta respeito pelo outro e onde as pessoas são permissivas, especialmente os chefes, falando-se das organizações produtivas”.

Nesse mesmo sentido, também pondera Marie-France Hirigoyen460:

Em estruturas sólidas e sadias, o assédio moral não tem lugar. Se uma empresa respeita verdadeiramente as pessoas, isto tem uma aura positiva sobre o comportamento dos indivíduos que a compõem. Porém, apesar de os gestores falarem cada vez mais de ética, existe no mundo do trabalho cada vez menos respeito pelas pessoas.

Percebe-se, por estes posicionamentos, a importância do ambiente organizacional.

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Propõe, Passos461 que, para inibir o fenômeno, ou até mesmo romper aquele já instalado, sejam implementadas “mudanças na estrutura social e consequentemente organizacional, em que haja respeito pela diferença e o ser humano seja o centro e finalidade de tudo”.

Ou seja, as atitudes das organizações deveriam se direcionar, com o intuito de podar qualquer iniciativa assediadora, repreendendo ostensivamente ações excludentes. Não bastaria, para tanto, apenas a criação de regras de conduta internas e códigos de ética, pois todos esses são facilmente desrespeitados, caso não seja trabalhada a ideia da importância central do indivíduo.

A posição de Passos462, coincidente com a adotada por esse estudo, é mais uma vez esclarecedora sobre esse ponto. Diz a professora que o “importante é instituir na empresa uma gestão ética — transparente, respeitosa, inclusiva —, assim como líderes íntegros e uma política de ação que estimule a reflexão e a prática de atitudes éticas”.

6.1.2. O papel do dirigente

O papel do dirigente deve ser sempre destacado, pois este tem a função de guiar a organização, motivando os funcionários, para que estes trabalhem com o intuito de incremento da produtividade.

Seu comando não pode se furtar em analisar os aspectos humanos intraorganizacionais, afinal, mais importante que o fruto oriundo da atividade produtiva, deve ser a integridade psíquica de seus colaboradores.

Para tanto, os dirigentes devem manifestar a vontade de colocar em prática um programa de prevenção em todos os escalões da empresa, porque, tão logo o assédio seja detectado, é deles a responsabilidade por ter deixado acontecer ou não ter sabido evitar463.

Sobre esse aspecto, pondera Guedes464que:

A saúde e o ambiente do trabalho depende decisivamente do modo pelo qual o poder diretivo é exercido. Tanto o exercício abusivo do poder quanto a omissão e inoperância dos dirigentes podem não apenas favorecer como potencializar o desenvolvimento de relações perversas no interior da empresa.

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E complementa:

O certo é que o psicoterror dentro de uma empresa só é possível quando os dirigentes fingem não o vê-lo ou o incentivam. Se o ambiente é permissivo desse tipo de procedimento, a perversão gera a emulação entre indivíduos que não são propriamente perversos, mas perdem os referenciais e se deixam persuadir. Aos poucos perdem a capacidade de se indignar e não se chocam ao ver alguém ser tratado de forma caluniosa, injuriosa ou humilhante.

Ou seja, as atitudes dos dirigentes devem ser revistas, assim como seus métodos de gestão, extirpando os que se basearem em violência psíquica.

Nesse sentido, buscando evidenciar a prática de condutas hostis por alguns, os dirigentes não deverão temer ao serem submetidos a uma avaliação por todas as pessoas que trabalham com ele465.

6.1.3. Modelos de prevenção

A pouca relevância que é, ainda hoje, imputada a esse fenômeno por parte da empresa, favorece a propagação dessa prática, destruindo as relações e interferindo no bem-estar do ser. Pode-se dizer que as empresas são pouco acostumadas a valorizar as questões humanas.

Passos466 complementa essa visão, ao aplicar à prática organizacional, a “obrigação das empresas em oferecer aos empregados ambiente de trabalho saudável, onde eles possam desempenhar suas funções com segurança, criatividade e alegria”. E ainda aprofunda ao dizer que “essa é também uma atitude cidadã que visa contribuir para o exercício da liberdade e do respeito das diferenças”.

A prevenção é, pois, a melhor solução frente à ameaça do fenômeno467. Para

Hirigoyen468, frente ao prazer mórbido de alguns em desrespeitar leis ou utilizá-las em proveito próprio, seria preciso “agir com antecedência, obrigando as empresas e os poderes públicos a pôr em prática políticas eficazes de prevenção”.

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Nessa linha, a discussão sobre o assunto, ao evidenciar as consequências das condutas hostis, pode ser um forte instrumento de conscientização, logo inibidor do fenômeno.

Busca-se, com isso, evitar os efeitos devastadores da saúde física e psíquica, já que a interferência a priori (ou seja, preventivamente) viabiliza a atuação no momento da percepção do problema, e não apenas quando já consolidada a agressão.

A prevenção do assédio moral, portanto, deve integrar a política geral de prevenção dos riscos profissionais, pois a saúde no trabalho, principalmente, a psíquica, é um direito fundamental dos empregados.

Hirigoyen (2002, p. 325)469 traz um modelo de como poderia ser articulada uma intervenção em uma empresa, ou seja, um verdadeiro plano de prevenção. Todo esse planejamento seria dividido em quatro etapas, que sinteticamente corresponderiam:

• Primeira etapa — Período de informação. Seriam esclarecidas as situações de assédio moral, bem como os direitos das pessoas na empresa por meio de debates e folhetos explicativos.

• Segunda etapa — Formação de especialistas internos que funcionariam como verdadeiras células de escuta dos empregados, fora da hierarquia e obrigadas ao sigilo.

• Terceira etapa — Treinamento de funcionários dos Departamentos de Recursos Humanos quanto às providências a adotar para prevenir o assédio moral, detectá-lo ou administrar os casos já existentes. Afinal, é preciso melhorar o nível de escuta da empresa diante de situações atípicas a ela.

• Quarta etapa — Redação de uma agenda social. É uma ocasião para a empresa fazer lembrar seus valores mais essenciais, bem como esclarecer quais são as sanções previstas para os transgressores. Para que as coisas fiquem bem claras, uma definição do que é assédio moral deve ser apresentada. Devem, ainda, ser estipulados os procedimentos, quando constatada a ocorrência desse instituto. Tais providências seriam tomadas em dois tempos: primeiramente, seriam providências informais e sigilosas perante os profissionais de medicina social ou as pessoas de confiança; em um segundo momento, caso o problema não tenha sido solucionado, partir-se-ia para providências mais formais envolvendo a hierarquia.

A boa comunicação é uma estratégia eficaz para evitar o assédio. Como já tratado em tópico antecedente, não se deve temer os conflitos decorrentes da explicitação da problemática, pois estes são úteis para flexibilizar uma relação negativamente consolidada.

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Em passagem de sua obra, Hirigoyen470 trata da importância desse ato:

Como os indivíduos perversos nunca refletem sobre seus atos, é importante que as vítimas e testemunhas de suas atitudes denunciem seu poder nocivo. As vítimas devem testemunhar, e os profissionais devem explicar, a fim de que a sociedade, e não unicamente as empresas, possa mudar.

E ainda...

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